quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Post.it: A derradeira viagem

Já viajei pelo mundo inteiro, subi montanhas, desci rios. Tive aventuras de neve e nos mais áridos desertos, onde até me quiseram comprar, ofereceram ao meu companheiro de viagem 6 camelos (uma fortuna naquelas paragens), felizmente ele não aceitou.
Cruzei céus e oceanos. Palmilhei milhares de quilómetros de asfalto e terra batida.
Mas um dia parei, parei para pensar, parei para sentir. O que significavam as minhas viagens? Aventura, adrenalina, banhos de cultura, fome de alcatrão, satisfação de curiosidade? Tudo isso e muito mais. Significavam sobretudo uma fuga. Não por cobardia de não querer enfrentar a realidade, mas por esta não me satisfazer a plenitude dos sentidos, desejos e ambições. Nessa paragem voluntária, o cérebro viajou mais do que tinha viajado o corpo.
Nessa viagem, a derradeira de uma vida, percebi, que tinha conhecido tantas pessoas nas mais longínquas distâncias, mas na verdade e para minha tristeza, mal conhecia os que estavam em meu redor. Não por falta de tempo, mas por falta de capacidade em viajar pelas profundezas desses seres. Dessa humanidade complexa, rica de mistérios, de sensibilidades, de dádiva, de dedicação e sobretudo de amor. Reconheço que é mais fácil viajar pelo mundo, confesso-me quase inábil na aptidão desse entendimento, exige muito mais de mim do que todas as viagens que experimentei. Exige tempo, interesse, sair de mim e ir ter com o outro. Deixar de ver a vida segundo os meus desejos e interesses, reconhecer e aceitar os dos outros.
É tempo de encetar essa jornada, aquela que já devia ter feito há muito tempo, se tivesse olhado bem nos seus olhos e visse neles a ausência daquele abraço que ficou tantas vezes por lhes dar…

8 comentários:

  1. Anónimo3.2.11

    Quantas pessoa há que preferem viver a superficialidade da vida sem se envolverem demasiado com os outros, sem permitirem grande proximidade? Quantas pessoas exigem para si essa dedicação e sensibilidade, mas não retribuem? Muitas, demasiadas, encontro-as diariamente. São pessoas que têm grandes necessidades afectivas, chamam-lhes vulgarmente egocêntricas, prefiro dizer que são pessoas que têm medo de se aproximar, dar de si para um dia acabarem sozinhas. Depois habitam-se a ser assim, nessa cómoda posição de receber muito e dar o mínimo indispensável. Fazem muitas “viagens” sem saberem que no fundo nunca saíram do mesmo sitio, aquele onde estão os valores humanos que as realizam.Bjs, Sandra B.

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  2. Anónimo3.2.11

    Entendi estas “viagens” como fugas e um certo acomodar. Chegar e partir quando as relações começam a ser mais exigentes.

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  3. Anónimo3.2.11

    Conheço muitos destes viajantes. Estão em corpo mas de espírito sempre ausente. Bjs Rui

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  4. Anónimo3.2.11

    Gostei das tuas “viagens” reconheci nas tuas frases algumas pessoas que já se cruzaram comigo, algumas consegui detê-las e mostrar-lhes que é bom dar mais do que receber, outras não conseguiram compreender isso e partiram.Bjs Amália

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  5. Anónimo3.2.11

    Apreciei muito o teu estilo, visualizei como são esses “viajantes” egocêntricos, incapazes de se dar aos outros, quando para eles é melhor e menos complicado receber.Bjs A.

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  6. Anónimo3.2.11

    Gostei da tua mensagem, sobretudo porque me deu a esperança que em algum momento vão regressar e dar-nos o abraço à muito ausente. Só espero que ainda compreendam isso a tempo.Bjs Leonor

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  7. Anónimo3.2.11

    Já fiz muitas dessas viagens. Pensei muitas vezes pensava que tinha que aproveitar a vida.Também um dia parei, a saúde me obrigou a isso. Vi-me sozinho, os amigos casaram, foram para lugares distantes. Restou-me a família. Hoje valorizo mais as pessoas e menos o alcatrão. Bjs

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  8. Anónimo3.2.11

    Já me acusaram de imaturo muitas vezes porque não parava. Pensei que eram comentários invejosos. Hoje entristece-me sentir que tive 2 filhos que outro "pai" criou porque eu tinha que fazer muitas viagens de trabalho mas que eram também de prazer. Agora que são adultos somos quase estranhos.É triste. A todos que têm este tipo de vida não esperem muito por parar e olhar para a família antes que a percam.

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