sexta-feira, 29 de março de 2019

Post.it: Primeiro...

Primeiro havia o mundo, o sol, as estrelas, os mares,  as  árvores,  os  pássaros que já cantavam  as  suas  milenares melodias. 
Nós, éramos apenas nada. Havia um passado, histórias, guerras, derrotas e vitórias.
Mas a vida vai crescendo, se antes era nada, depois é-se um, dois, três, milhares, milhões. O mundo já girava sem nós, as pessoas, as terras e animais existiam sem sequer imaginar que um dia chegaríamos.
O mundo é imenso sem nós, tão imenso que nós, nos sentimos nada perante ele.
Entretanto, chegamos, tornamo-nos parte, nem que seja no ser-se um entre muitos. Queremos fazer parte do todo, mas descobrimos que somos apenas uma parte, que somos ímpar nesse universo de pares.
É preciso crescer, por dentro, sem que isso se veja por fora. Do colo, saltamos para o chão, damos os primeiros passos, tímidos, cambaleantes, sem destino. Depois corremos para longe do nada para ficarmos mais perto de tudo. Se as coisas correrem bem, podemos agora dedicar-nos à descoberta do nosso mundo interno, a cimentar as emoções, a plantar razões, a conquistar corações, a lutar pelas nossas visões.
Está na hora de se deixar de ser ímpar e encontrar o que nos torne par.
Nos encontros e desencontros, tornamo-nos dois, nem sempre é fácil, é preciso ser-se livre para respeitar a liberdade do outro. É preciso saber quem somos para reconhecer o outro.
Ser-se dois não implica perdermo-nos de nós próprios ou fundirmo-nos com o outro. O que nos liga uns aos outros é a comunhão de afectos, de projectos e de sonhos.
Depois, uns e outros, acrescentam-se a outros mais e do nada que éramos, tornamo-nos muitos.
Um dia perto do fim do nosso mundo, se pensarmos que voltámos a ser nada, lembramo-nos antes que afinal somos muitos, tanto quantos aqueles a quem tivermos deixado a herança de um pouco de nós.
Porque para se ser, primeiro somos nada, mas isso, é o que define os contornos do caminho.


segunda-feira, 25 de março de 2019

Post.it: Dar tempo ao tempo

É preciso, dar tempo ao tempo. Viver devagar, saborear o ar. Aprender a respirar em cada sopro de brisa.
É preciso sofrer, arranhar os joelhos nas quedas, nas escorregadelas pelos declives da vida. É preciso aprender a dançar com os ramos das árvores. Aprender com elas a firmeza, a perenidade, a constância. Entender a sua luta para subir, para conquistar um pequeno raio de sol que a torne mais fecunda gerando outros ramos cobertos de verdes folhas. Ramos que se estendem apelantes para o céu homenageando-lhe a  estonteante beleza.
“O que depressa vem, mais rápido vai”, dizem os pessimistas, os que têm receio de escancarar as portas do sentir, limitam-se a espreitar por ela entreabrindo a medo. Que há a temer, o futuro? Para quê teme-lo se temos que caminhar para ele? Devemos escolher outro percurso com receio de que o que se avizinha nos faça sofrer? Como saberemos se não o vivermos? 
E se for a felicidade apressada a chegar sem prévio aviso?  E se for apenas mais um engano, uma brincadeira do destino. Já não temos nada a recear já aprendemos a cair sem nos magoarmos. Sabemos que toda a dor passa, que toda a ferida se cura, que o esquecimento é o mais eficaz tratamento que nos pode dar o tempo. Mas sabemos principalmente que tudo é caminho, que não se volta atrás, que tudo está à nossa espera. É agora ou nunca…


sexta-feira, 22 de março de 2019

Reflexo

Queria durar mais que o tempo.
Queria ser mais leve que o vento.
Tocar no simples rosto,
Apagar-lhe o desgosto.
E deixar-me partir.
E deixar-me seguir.

Nas asas do destino.
Como um ser pequenino.
Um pequeno grão.
Perdido na multidão.
Para sentir a liberdade.
De ser a verdade.
Que ninguém vai escutar.
Ninguém vai notar.

Olho o céu.
Invejo-lhe o véu.
De azul tão intenso.
De mar tão imenso.
Queria ser nuvem.
Queria ser viagem.
Conhecer o firmamento.
Abarcá-lo num só momento.

Quando cabe num só olhar.
O reflexo do que é amar.
Um arco-íris invertido,
Um sorriso divertido.
Todo o horizonte num enlaço,
Na fronteira de um abraço.
E tudo o mais somos nós,
Quando do silêncio se faz voz.


segunda-feira, 18 de março de 2019

Post.it: Faz greve

Se se fazem tantas greves,
porque não fazer verdadeiramente GREVE!

Faz greve às palavras negativas - Encontra algo de bom que dizer
Faz greve à maldade - E oferece piedade
Faz greve à ingratidão - E se grato por cada dia
Faz greve à raiva - E partilha momentos serenos
Faz greve ao pessimismo - E encontra o lado positivo da vida
Faz greve às preocupações - E relaxa o teu coração
Faz greve à desconfiança - Confia que vai melhorar
Faz greve à tristeza - Enche-te de alegria
Faz greve ao egoísmo - E reparte a bondade
Faz greve aos ressentimentos - Releva as pequenas coisas
Faz greve ao desânimo - Ganha coragem e ergue-te
Faz greve ao julgar os outros - Todos têm algo de bom
Faz greve às palavras que ferem - Troca-as por palavras de incentivo
Faz greve aos lamentos - Arranja razões para festejar
Faz greve à mentira - Dedica algum carinho à verdade.


sexta-feira, 15 de março de 2019

Post.it: Coração

Há noites em que o sono tarda e o sonho se recusa a inspirar-me a espera. Tudo parece estranho, vazio, escuro, silencioso, só a voz dos pensamentos qual roda dentada que ruidosamente se sobrepõe ao descanso que o corpo pede. De repente, quando a tensão diminui e permite uma consciencialização de maior pormenor, eis um ruído, não chega a ser barulho, não incomoda, antes parece que embala. Sustenho a respiração, ponho o ouvido mais atento, é uma batida suave e ritmada, como se realizasse um trabalho incansável, como se tivesse uma missão sem meta, e ele, bate, bate, bate, reconheço-lhe o som, que alegria de reencontro, de agradável companhia, sim, é o coração!
Imagino-o árduo trabalhador durante aquelas horas escuras, enquanto o corpo inerte descansa. Ele arregaça as mangas, mantém-se sério e concentrado na sua jornada, é assim de manhã até à noite, sem queixas, sem greves.
Neste momento sorriu, imagina se o coração fizesse greve, o que seria, eu nem teria tempo para lhe ouvir as reivindicações, ia desta para melhor, num ápice.
Porque, sim, ele tem a minha vida nas suas mãos; senti medo, senti um enorme respeito, amei-o pelo seu cuidado, por ser incansável, imparável até ao dia em que as forças lhe faltarem.
Reconheço que lhe devo dar muito trabalho, aí os doces, as batatas fritas, as autoestradas de vias que ele tem de limpar, filtrar, despoluir. E depois os sustos que quase o fazem cair no chão, ou as paixões  que o  fazem  partir-se em mil pedaços. 
Desculpa coração, nem sempre te dei atenção, não te escutei, obrigada por estares aí para mim. Batendo a cada tristeza, rejubilando em cada alegria, não sou uma companheira fácil, bem sei, mas ainda assim, acredito que não querias estar do lado esquerdo do peito de mais ninguém, pois não, coração?


terça-feira, 12 de março de 2019

Vazio

Da morte,
Só lamento a sorte,
Deixar de ouvir o vento,
Torna-lo apenas lamento.

A suave ondulação do mar,
Essa hesitação, o ir e o ficar.
Perdida confundida a natureza,
Desse sentir, essa vaga tristeza.

Pelas manhãs sem ver o amanhecer,
Pelas noites sem o sol me adormecer.
E as flores, tão intensos odores,
E as flores multiplicidade de cores.

A ferida, o grito, a dor,
O arrancar à terra da flor.
A mão que está tão vazia,
A noite cada vez mais fria.

Depois da turbilhão, só então,
A paz, o parar do coração,
Uma palavra, um adeus,
Cala-se a terra, cantam os céus.



sexta-feira, 8 de março de 2019

Post.it: Dia da Mulher

Hoje dia Internacional 
da mulher, quero oferecer palavras como se fossem flores. Pétalas macias para colmatar as dores. Este dia foi criado para homenagear as mulheres lutadoras, defensoras aguerridas, conquistadoras dos direitos que nunca lhe tinham sido reconhecidos. Este devia ser um dia alegre, de comemoração, no entanto, penso, que uma grande parte das mulheres, hoje, não consegue sorrir, não consegue esquecer a mágoa de tanta dor infligida. De tantas vidas sonegadas por quem lhes prometeu amor eterno. Como puderam erguer a mão, magoar a carne e o coração, como puderam disparar uma arma contra a vida humana, como puderam roubar o sorriso e troca-lo por lágrimas? Quando foi que as palavras de carinho se transformaram em ódio e vingança? De repente, não pensam, não sentem, agem e assim, ficam pais sem filhas, filhos sem mãe, fica a humanidade mais pobre e a vida, toda ela, mais vazia.



Mulher
Coração suave e terno,
Que do seu jeito mansinho,
Torna mais quente o inverno.

Dizem que até o ser Divino,
Ao vê-la com tanta candura,
Perto dela se tornou menino,
E aprendeu o que era ternura.

Então pediu ao homem que a cuidasse,
Como se ela fosse uma singela flor,
E que nesse cuidar sempre a amasse,
Com verdadeiro, generoso e leal amor.

Mas a promessa não foi cumprida,
E tudo o que era amor acabou.
Aumentou a mágoa, cresceu a ferida
E mais uma vida que expirou.


Não era para ser assim,
Chorou o céu e chorou a terra,
Era uma linda flor do jardim,
Vivia para um amor sem guerra.


segunda-feira, 4 de março de 2019

Post.it: Carnaval

Hoje, só hoje, podia ser diferente. Encontrar o rumo, escolher o caminho, dar aos passos mais que um simples compasso. 
Hoje, nem que seja só hoje, podia ser melhor. Encontrar o sentido, deixar de me sentir perdida, esquecida, adormecida na minha ténue vida. 
Hoje, sim, talvez hoje, seja o dia de mudar, de me encontrar sem ter de partir para por fim chegar. 
Então, despi-me da tristeza. Despedi-me da incerteza. 
Enfeitei os cabelos com raios de sol. 
Pus no olhar o brilho das estrelas. 
Desenhei um sorriso com todas as cores do arco-íris. 
Inspirei o ar marítimo e deixei voar o coração sem ter vontade de o pousar. 
Rasguei os pensamentos negativos e lancei cada pedacinho sobre a mais alta montanha. 
Renasci, vivi, corri por todas as planícies, ultrapassei todas as fronteiras, cortei a linha do horizonte. 
Hoje, nem que seja só hoje, fui realidade, fui fantasia,  fui verdade disfarçada de  mentira, fingi e senti com alegria. 
Era eu, mesmo hoje, quando me vesti de Felicidade! 
Se cair, se me sujar, se me rasgar, que importa, não faz mal, hoje, só hoje é Carnaval.



sexta-feira, 1 de março de 2019

Ninguém

Ele era a madrugada,
Fresca e orvalhada.
O caminho desencontrado,
Do destino mal traçado.
Era a folha caída,
Dessa árvore ferida,
Que finge a firmeza,
Para iludir a incerteza.
Tinha os passos perdidos,
Em sonhos esquecidos.
Era a sombra de alguém,
A quem chamaram Ninguém.
E Ninguém era quase nada,
Que dormia na estrada.
Que comia na mesa da rua.
Que tinha a alma quase nua.
A sua morada que nos indicava,
Dizia-a e nunca se enganava,
Moro na Rua do luar,
Na Casa do sonhar,
No único lugar que preciso,
Perto, bem pertinho do paraíso…