sexta-feira, 28 de junho de 2019

S. Pedro

São Pedro porteiro do além,
Hoje  és o Santo desta festarola,
Para não pensar que há sempre alguém,
Querendo meter o alheio na sua sacola.

Chamam-lhes nomes todos pomposos,
Para não perceberem as roubalheiras,
Que todos vão aos nossos bolsos,
Com falsa simpatia e boas maneiras.

Nem os Santos nos conseguem ajudar,
Aderiram à greve e pedem aumento,
De tempo para conseguirem descansar,
E festejar o seu especial momento.



segunda-feira, 24 de junho de 2019

S. João

Vem até Lisboa S. João,
Junta-te à festa da cidade,
Une cada enamorado coração,
Sem que haja distância ou idade.

Dos martelinhos não te podes esquecer,
Que há quem só com a marteladinha,
Consegue talvez em juízo crescer,
E fazer a geringonça entrar na linha.

Quem sabe até o nosso presidente,
Vem à nossa festa e entra na dança,
Se não paga imposto ser contente, 
Vou fingir que hoje sou uma criança.


sexta-feira, 21 de junho de 2019

Post.it: A vizinha Eugénia

Vou falar-vos da Eugénia, uma vizinha da minha rua, uma rua pequena, quase todas as pessoas se conhecem e sabem as histórias de vida umas das outras, não por coscuvilhice mas por partilha, por solidariedade e em muitos casos, por amizade.
Conhecia a Eugénia, mulher sólida, robusta, de gargalhada espontânea. Era a alegria em pessoa, casada de fresco, um projecto de vida bem delineado, uma filha recém-nascida. Eugénia era o rosto da felicidade.
Mas sem aviso prévio tudo se desmoronou, uma doença invadiu-a silenciosamente. Amputaram-lhe uma perna,  perdeu a gargalhada, perdeu a solidez, perdeu a vontade. O marido que lhe tinha jurado amá-la na saúde e na doença partira levando consigo a filha que ainda mal aprendera a reconhecer o rosto da mãe.
O tribunal decidira que ela não tinha condições para criar um criança, já que não tinha  emprego. Nunca trabalhara, dedicara-se ao lar, ao marido e ao papel de mãe. Eugénia repetia  cabisbaixa num fio de voz, “amputaram-me a vida”.
Reencontrei-a, passados muitos anos, foi um encontro feliz, daqueles que nos faz sentir a alma rejubilante, Eugénia voltou a ser uma mulher sólida e de gargalhada presente, sorri, chora e ri emocionada, “vou ser avó” conta com voz musical. Encontrou o abraço da filha, agora já mulher.
E mais, refere com um misto de orgulho e de ternura, encontrou o amor, no carinho de alguém que promete e cumpre amá-la na saúde e na doença. Que lhe enaltece cada vitória, cada obstáculo ultrapassado. 
Eugénia uma mulher como tantas outras, que lhes “amputam a felicidade” mas que têm a coragem de construir outras, muitas felicidades.


segunda-feira, 17 de junho de 2019

A nossa dor

Já que a dor vem e insiste,
Em ser em nós presente,
Que ela não me deixe triste,
Que ela não me torne diferente.

Já bem basta que a dor nos doa,
Que não nos domine a vontade,
De saber que tanto nos magoa,
E que nos rouba a liberdade.

Faz parte do humano sofrer,
Como faz parte o nascer,
A todos calha o envelhecer,
Para além do nosso querer.

A vida pode ser uma sorte,
De dados bem lançados,
Que nos venha antes da morte,
Sermos pela felicidade abençoados.

“Senhor, já que a dor é nossa,
E a fraqueza que dela tem,
Dá-nos pelo menos a força, 
De não a mostrar a ninguém.” (F. Pessoa)


sexta-feira, 14 de junho de 2019

Post.it: Feliz aniversário

Aniversários já não são como o dos 2 anos em que é mais dos outros do que nosso, o dos 5 em que começamos a viver a festa e a rasgar com avidez o papel que escondem os presentes, o dos 10 cheios de vontade de brincar, correr, saltar, voar em sonhos e estatelar-se no chão sem medos. Os 18 cheios de esperança, de quimeras, rasgar o vinculo com a infância, vestir a pele de adulto, ainda com uma vontade, quase irresistível de correr e saltar, como quem quer e não quer crescer. Os 20 de olhos brilhantes, sorrisos fascinantes, há lá aniversário como esse, é uma festa que nos acontece no peito. Ai os 30 que nos começam a pesar na consciência, vê lá se ganhas juízo, és adulta, és cidadã de plenos direitos e afogada de deveres, uns que te impõem, outros que te impões. És mulher, és mãe, tornas-te exemplo para os mais pequenos. A seguir um novo passo e chegamos aos 40, alegria, tristeza, um cocktail de dúvidas e angústias, daqui para a frente tudo será diferente, ou talvez não, mas sim, é verdade, deixamos de contar os anos, e os aniversários são penas capitais. Aproximam-se, sim, aproximam-se, cheios de pressa que não temos, são os malogrados 50, não sabemos se festejamos, se rimos se choramos. Tudo nos descai, o corpo, a pele, os cabelos escuros, o olhar sonhador olha agora unicamente para a realidade de cada dia. Em nós cresce uma batalha interna, levamos uma década nesse combate, até que cedemos sem saber-mos se ganhamos ou perdemos, desistimos, assumimos, ok, chegamos aos 60 anos e agora? Bom, agora, continuamos, ainda há muita estrada pela frente, o caminho que ficou para trás foi-nos escola e nela aprendemos a ultrapassar as dificuldades, tornarmo-nos mais fortes e se chegámos aqui foi porque vencemos a nossa guerra pela sobrevivência. Daqui para a frente, somos heróis pelo passado e pelo futuro porque se a cada queda nos levantámos, sabemos curar as feridas, sabemos cuidar de nós e partilhar o nosso conhecimento com os outros. Somos um legado, somos grandes, maiores a cada dia que passa em conhecimento, em coragem. 
Recebemos de presente a calma de quem pode apreciar o caminho, saborear, encher o olhar e levar essa luz ao coração. Somos mulheres maduras, cheias de ternura, sem guerras, voltamos a voar mas com os pés bem assentes na terra. Somos tudo aquilo que vivemos e tudo o que temos ainda por viver, paz, harmonia, felicidade, porque não?


terça-feira, 11 de junho de 2019

Manjerico de Stº António

Manjerico não dá flor,
E rapidamente esmorece,
Mas é símbolo do amor,
Quando o luar o adormece.

Tem um perfume encantado,
Tem uma frágil singeleza,
Deixa o coração enamorado,
Com a sua tão simples beleza.

Quem no Sto. António o oferecer,
Num gesto de eterno carinho,
Promete que não o vai esquecer, 
Guardando-o num belo lugarzinho.


sexta-feira, 7 de junho de 2019

Post.it: Humanidade

Humanidade, apetece concluir como no genérico de apresentação da série Star trek , “a última fronteira”…
Aliás, muitas fronteiras, as naturais: linguística, cultural, religiosas, etc. e as que cria, entre si e o outro. A solidão de que foge, quantas vezes,  correndo para ela.
Tudo o que nos une, tudo o que nos separa. Tudo o que nos identifica, caracteriza, distingue, no bom, no mau e no pior.
Somos o que somos, coragem e medos. Com as nossas guerras e alguns momentos de paz. Somos um misto de tristeza e alegria ou busca incessante. Estamos prisioneiros da nossa liberdade.
Tudo porque queremos ir mais longe, rasgar o infinito, ser o eco do nosso grito, o horizonte para lá de onde o nosso olhar alcança. Queremos ser homens, mulheres mas sempre com a esperança de ser criança. A capacidade de recomeçar mesmo depois de errar.
 A vontade de lutar mesmo que em batalhas perdidas. Temos o mérito de rir das nossas desgraças, de curar as feridas e seguir em frente. Unos na nossa dispersão mas sempre ao ritmo emocional do coração.
Parecemos rochas, mas quantas vezes nos desfazemos em areia e escondemos os oceanos que nos inundam o olhar.
Tudo porque:
Cada qual é como Deus o fez – e às vezes, ainda pior. (Cervantes)
Na verdade, o homem é de natureza pouco definida, extremamente desigual e variada (Montaigne).
Tudo em nome de um sonho, de um desejo, do último paradigma do universo humano, ser feliz…

segunda-feira, 3 de junho de 2019

Moinho de vento

Moinho de vento,
Sem vento parado.
Mói-me o sentimento,
Este sentir avassalado.

Ondas do mar,
Na sua eterna dança.
Que levam a sonhar,
E voltar a ser criança.

Noites de luar,
Que vão pela madrugada.
Prolonga-se-me o olhar,
Para lá do fim da estrada.

Ramos de árvores a crescer,
Parecem não ter dimensão.
Como se se quisessem estender,
Para tocar o céu do coração.

Nuvens no horizonte,
Que do chão contemplo.
Eu que como água da fonte,
Já me dissipo no tempo.