segunda-feira, 27 de maio de 2019

Post.it: Tudo passa...

“A natureza humana é condicionada pelo medo do sofrimento”. Porque o sofrimento nos limita, altera, muda-nos, pode matar-nos ou fazer-nos renascer. 
O sofrimento impede-nos de ver com clareza, de pensar com lucidez, de sentir para além dele. 
Torna-se nós, ou talvez, sejamos nós que nos tornamos ele e, por vezes, apenas e só ele. Adormecemos, quando conseguimos, com ele, acordamos com ele. Cada dia e cada hora torna-se o peso condicionante dele em nós. Esmaga a nossa vontade, rouba-nos a capacidade de irmos além dele. Ficamos cheios de questões: porquê nós, quando acaba, como nos libertamos dele, porque nos magoa, onde está a nossa culpa, o que fizemos de errado; tantas perguntas, mas nenhuma resposta. 
O sofrimento grita em nós ou somos nós que gritamos para o calar, para o sufocar e sim, para o matar no nosso corpo, na nossa mente. 
Se ao menos houvesse uma resposta, se alguém nos desse a certeza de que o sofrimento não veio para ficar, que acabava, suportá-lo-ia hoje, amanhã, alguns dias mais, para depois voltarmos a sermos nós, tal como éramos, libertos do medo, livres do sofrimentos, capazes de nos levantar, de caminhar e de voltar a sorrir. 
Eis uma certeza que nos consola: O sol há-de voltar a brilhar. Porque, sim, tudo, mas mesmo tudo, passa… 



sexta-feira, 24 de maio de 2019

Post.it: A ciência filosófica de voar

 “Penso que só há um caminho para a ciência ou para a filosofia: encontrar um problema, ver a sua beleza e apaixonar-se por ele; casar e viver feliz com ele até que a morte vos separe ou que obtenham uma solução. Mas, mesmo que obtenham uma solução, poderão então descobrir, para vosso deleite, a existência de toda uma família de problemas-filhos, encantadores ainda que talvez difíceis, para cujo bem-estar poderão trabalhar, com um sentido, até ao fim dos vossos dias”.
Karl Popper falava da ciência e da filosofia, mas estas mesmas palavras podiam aplicar-se à constituição de uma família, ao seu natural alargamento e crescimento.
As mesmas palavras podiam aplicar-se à vida individual e colectiva, nas suas rotinas e constrangimentos. Os sol e a chuva, o frio e o calor, as idas e vindas de casa para o trabalho e do trabalho para casa. 
E são palavras aplicáveis a diversas e dispares situações porque a une um sentido, o amor, por aquilo que nos une, por aquilo que nos define, nas nossas duvidas, lutas e certezas, nos nossos afectos, uniões e dispersões, no que nos limita e prolonga ao infinito, a liberdade que temos de ser e de voar quando a exactidão e o rigor se tornam as nossas asas para voar, nem que seja na possibilidade única de sonhar e acreditar que pode tornar-se realidade científica, filosófica o que nos surge em fantasia.


segunda-feira, 20 de maio de 2019

Post.it: Os degraus

Se todos os degraus da vida fossem assim, belos, coloridos, fáceis de subir e a meta nunca estivesse demasiado longe.
Todos o desejamos, todos nos questionamos o porquê de tantas dificuldades, tantos cansaços, tantos desafios, batalhas, por vezes guerras que travamos por dentro e por fora de nós.
Olhamos e para os outros tudo parece fácil, invejamos-lhe a sorte. Talvez não o seja. Por vezes são apenas aquele género de pessoa que tenta ultrapassar as suas dificuldades com um sorriso, que tenta vencer o cansaço com ânimo. Que não cede ao desanimo, que o troca por pensamentos de encorajamento. Atingem as metas, vencem os seus combates não como quem vive eternas batalhas mas como quem aceita alegres desafios.
Talvez aí resida o seu mérito, transformar cada dificuldade em atraentes reptos, encarar cada degrau não como um obstáculo mas como uma ajuda para subir e chegar pouco a pouco ao topo.
Pesa-nos mais levar às costas as dificuldades carregadas de desânimo, de sentenciação, de pesarosas culpas do que carregar cada tarefa com o ânimo de quem vai alegremente cumprir uma missão.
Todos os caminhos são tal como os encaramos, como os sentimos, a forma como damos os passos, se vamos cheios de pensamentos leves e esperançosos ou se pelo contrário já nos sentimos cansados só de medir o que temos de caminhar.
Que a nossa inveja dos outros para quem tudo parece fácil seja direccionada não para o que faz mas como o faz. Que essa inveja nos seja incentivadora para a tornar um exemplo a seguir.
Substituindo o semblante carregado e desmotivado por encorajadores sorrisos. 
A realidade existe muito para além do que a nossa simples visão a pode conceber.


sexta-feira, 17 de maio de 2019

As pedras da calçada

Gemem as pedras da calçada,
Na solitária e fria madrugada.
Tantos passos, mas todos passam,
Tantas vozes, todas se calam.

E as pedras em fila desordenada,
Tentam ser manto, tentam ser estrada.
Alvas na sua repisada brancura,
Surgem encobertas na noite escura.

Há quem diga que choram magoadas,
As mágoas de tantas e longas jornadas.
Dores suas, dores de tanta gente,
Que por ali passando permanece ausente.

Mas as pedras também sabem rir,
De qualquer incauto que ao cair,
Lhe dá uma marota razão, 
De em troça guardar a recordação.


segunda-feira, 13 de maio de 2019

Post.it: Infância perdida

Há uma espécie de orfandade em quem cresceu sem ter conhecido uma infância feliz, em quem, nessa idade, não fez o quis,  não voou nos seus sonhos, não mergulhou de alma nua nas águas de um mar veraneante e sem o saber afogou-se sem afogar as suas mágoas.
Há uma espécie de desamparo nesse crescer com a  falta de um abraço no começo do dia, a falta de um beijo ao adormecer, uma história contada para encantar, uma mão que te leva em segurança e confiança pelo caminho.
Há uma espécie de abandono,  um silêncio que se esqueceu de nos murmurar no peito as palavras que precisamos de ouvir para aprender a sorrir, invisível aos olhares desatentos, há uma lágrima que cai dentro do coração e ninguém lhe ampara a queda.
Há uma espécie de solidão neste viver arrastado como quem carrega a herança de nada ter dessa infância que não aprendeu a brincar.
Há uma espécie de ausência, dos outros e de si própria, criança que nunca o foi porque lhe disseram que tinha de se comportar como uma menina crescida. E ela cresceu, não em tamanho, não em idade, mas em maneira de ser e estar.
Há uma espécie de vazio, um eterno e estranho frio, como se fosse um pequeno passarinho que caiu cedo demais do aconchego do ninho e teve que voar sem ninguém lhe dizer como e teve de seguir o caminho, sem ninguém lhe dizer qual.
Há uma espécie de nada, arrancado ao tudo, que nos deixa incompletos, enquanto procuramos pela vida fora a criança que tentámos ser mas que nunca fomos.


sexta-feira, 10 de maio de 2019

Post.it: A reforma

Ontem foi a festa, a despedida final do último dia de trabalho. Acabou-se a rotina matinal, o acordar ao som estridente do despertador, esse despertar que me arranca violentamente do mundo dos sonhos. Depois, o abrir da janela ainda em pijama, lá fora chove, as pessoas caminham apressadas como se isso lhes evitasse a molha. Dentro de alguns minutos serei como elas, uma silhueta mais em fuga por entre os pingos da chuva. O pequeno-almoço engolido apressadamente e depois ir para as filas dos transportes públicos, dos carros fumegantes, de pessoas ao monte. Entrar no autocarro apinhado de gente com um destino similar ao meu, a viagem para o trabalho. Por fim chegar, cumprimentar as mesmas pessoas todos os dias, sentar-me e ficar ali, atenta nas acções, desatenta nos pensamentos que voam, saem para lá da janela e vão ser livres.
Ontem foi a festa de despedida, hoje também eu sou livre para criar novas rotinas, acordar devagar, viver o meu sonho do princípio ao fim sem abruptas interrupções.
Claro que tenho muito planos: inscrever-me num ginásio, fazer caminhadas encontrar-me com os amigos, fazer voluntariado, ir às comprar, viajar, viver aventuras, arranjar o jardim, visitar os filhos, brincar com os netos, fazer pequenos cursos, jogar golfe, ir ao cinema, frequentar festas, dançar, namorar, aprender a pintar, escrever um livro de memórias, sorrir, sorrir muito.
Mas ontem foi a festa, hoje quero apenas sentir a vida a passar devagar pelo meu corpo, pelas paredes da casa. Há um novo e agradável silêncio, nem o relógio se ouve, o rádio que relatava as notícias matinais está mudo, a televisão que actualizava as informações meteorológicas está apagada. Nem a torneira pinga sobre o lava-loiça de inox. Só os meus chinelos murmuram baixinho os segredos de cada passo sobre o soalho. Depois um estar de ossos, uma dor que desperta devagar, habitual companhia, coisas da velhice, penso conformada e sem queixume.
Ontem foi a festa, merecida, confesso. Foram anos, muitos anos de vida dedicada, cumprindo tarefas, horários e até para além deles. Os chefes chegavam e partiam, as colegas vinham e iam, eu, permanecia, fiel àquelas paredes, com os olhos voando para lá das janelas. 
Mas isso foi até ontem, hoje, depois da festa, há um novo amanhã para quem como eu inicia o seu período de reformada.


segunda-feira, 6 de maio de 2019

Post.it: Faz parte de nós

Não é fácil falar com ela, ou melhor, é muito fácil. Porque conversa, e as palavras são torrente dum rio de inesgotáveis águas. Mas é difícil ouvi-la falar de si, da sua alegria, da sua tristeza. É difícil prender aquele olhar que saltita incapaz de se fixar muito tempo no mesmo lugar. Quase diria que deseja fugir para longe do embaraço de se confessar humana. Quando era pequenina, chamava-lhe libelinha, de tão pequenina, de tão irrequieta, de tão feliz. Hoje apenas a admiro no que fala e sobretudo no que cala.
Mesmo assim atrevo-me a perguntar-lhe…
- Se me perguntas, respondo-te. Não, já não vou lá. Nunca mais regressei a esse lugar que um dia idealizei, ninho. Num tempo em que me sentia voar. Porque voava realmente, no meu querer, no meu sonhar. Mas um dia descobri que para voar é preciso sentir que temos uma direcção. Que algures no horizonte há um lugar que espera por nós. Para quê retornar, ao que não tem retorno? Para quê abrir essa porta, se adivinho que por detrás dela nada encontro. Por vezes ainda hesito, toco ao de leve na “maçaneta da porta”, acaricio-a, como quem acaricia um sonho que não se concretizou. E por um momento espreita-se-me um suspiro dentro do peito. Mas depois, sigo o meu caminho. Gostava de saber pintar, idealizaria uma pintura de Monet e  nesse quadro colocaria todas as cores e contornos do meu sonho. Depois colocava-o na parede e ficaria a voar nas asas das emoções que ele me transmitia. Se soubesse tocar, comporia um nocturno que lembraria Chopin, em notas que soariam semelhantes a gotas de chuva a cair sobre a janela. Essa janela que se manteve sempre fechada ao meu tímido voar.
- Se me perguntas respondo-te, não voltei a esse lugar, porque por vezes, é preciso aterrar e acreditar que um dia quando as asas encontrarem uma razão para voar, uma porta  que se abrirá ao meu querer. Uma janela que estará sempre receptiva ao sol e ao luar,  haverá um ninho que me vai querer aninhar. 
Mas ela voltará a esse lugar, tenho a certeza. Voltará quando já não lhe doer no peito essa lembrança. Faz parte de nós, o recordar, o sonhar, o querer voar. Faz parte de nós a ambição de ir mais além. Lutando contra a finitude que a nossa condição nos impõe. Faz parte de nós conquistar a felicidade, esteja ela onde estiver…


sexta-feira, 3 de maio de 2019

Post.it: A vida

Aproxima-se uma data que nos é importante, o Dia da Mãe. Data que nos lembra, com maior consideração, amor e respeito, o ser que nos gerou, mas também nos lembra a vida que somos.
Já muito se escreveu sobre o tema, pessoas que sabem muito melhor do que eu escrever sobre essa experiência, pessoas que a sabem viver, sentir, explicar, partilhar e dar.
Eu, confesso, ainda estou a aprender, com eles e com todos vós, esta vida, que passados alguns anos, poucos, muitos, me ainda é, renovadamente jovem.
A vida consiste não em ter boas cartas para jogar, mas sim em jogar bem com as cartas que tiver.
A vida é como uma viagem por mar: Há dias de calmaria e dias de tormenta. O importante é ser um bom capitão do nosso navio.
A vida é fascinante: só temos de a olhar através dos óculos corretos.
A Vida não foi feita para que possa entende-la, mas sim para vivê-la.
A vida só pode ser compreendida olhando para trás, mas tem que ser vivida olhando para a frente.
Temos duas forças que nos ajudam a viver: O esquecimento e a esperança.
Cada dia é uma pequena vida que vivemos. 
Não podemos tornar a vida grande, mas podemos tentar vive-la em grande.