sexta-feira, 15 de julho de 2016


Nem flor nem fruto

Se o coração fosse uma flor
Iria planta-la num jardim.
Onde quem sabe, o amor,
Ao passar olhasse para mim.

Mas nem flor, nem fruto,
Nem aroma perfumado.
Apenas um querer de luto,
E um sentir abandonado.

A Primavera o faz renascer,
O verão e paixão aquecer.
Ai outono que ao esmorecer,
Fá-lo no inverno perecer.

Mas o sol, o vento, o mar,
O verde, o azul, o infinito.
São asas que fingem voar,
E de novo, no voo acredito.

terça-feira, 12 de julho de 2016

Ser do litoral

Ser daqui, do litoral,
Marca-nos o corpo e a alma.
É trazer nos lábios o sal,
Deste mar que nos acalma.

E no ventre vento e espuma,
De ondas que nos vão deslizar.
Por suaves céus desta bruma,
Que o sol leva ao madrugar.

A saudade ao nos delinear,
São abraços para o horizonte.
São águas deste navegar,
Que nos leva para tão longe.

Um longe aqui sempre perto,
No contorno desta velha costa.
Cais de espera, olhar inquieto, 
Por vezes sorri, outras desgosta.


sexta-feira, 8 de julho de 2016

Post.it: Trapos

Como somos, como nos vêem, a consonância, a discrepância. Apenas o olhar. Um olhar que nos adora, que nos odeia. Porque lhes somos semelhantes, porque lhes somos antagónicos.
Apenas o olhar, mas que nos aproximas, que nos afasta.
São panos, são cores. Usados mais acima, mais abaixo. Em desalinho que para quem usa parece alinhado.
Há quem diga que o que usamos nos define, nos revela o carácter, “diz-me o que vestes, dir-te-ei quem és”. Ou talvez não. Talvez te enganes, visto de preto mas não tenho a alma negra. Visto de vermelho e na verdade apesar do meu ar de festa, sinto-me triste. Por vezes, na maior parte das vezes (confesso) quero apenas ser aceite. Não é isso que significa andar na moda? Se gosto, bom no início, não. Mas depois de tantas vezes me cruzar com o mesmo modelito, o olhar acaba por ficar “conquistado”. Mas passado um tempo, canso-me, e começo a ver o mesmo por todo o lado e esse “mais do mesmo”, em vez de me seduzir, cansa-me.
Está na hora de mudar, de seguir outra moda. Quem sabe as calças subam, quem sabe as bainhas das saias desçam. Quem sabe se cubram as pernas e se tape o rabo, já cansa andar a ver cuecas, mesmo que seja de marca (compradas na loja do chinês).
Mas tudo isto são apenas “trapos”. Alguns com aspecto de velhos de tão rasgados, de tão corroídos, “nem para panos de chão os queria”, já dizia a minha avó. Mas que custam uma “pipa de massa”. Porque têm uma marca na etiqueta, porque são da loja mais “in” do momento. Mas a verdade dão um ar completamente “out”.
Mas o que importa para uns é estar  “cool”. Para outros o que importa é sentirmo-nos “cool”, mesmo que nos digam o contrário, que nos olhem com desdém, estamos bem connosco e é connosco que temos que viver, adormecer, acordar, crescer e aprender. Sem cair em narcisismos, em ou exacerbadas vaidades.
Bom seria que nos vissem para além das aparências, que chegassem mais perto, que não cedessem à tendência de criar inibidores rótulos. Que nos tocassem, humanos e não bonecos produzidos por uma sociedade de consumo imediato. E depois, que nós, fossemos nós, sem seguir modas só porque “sim”. Afinal, não precisamos de chocar, de conquistar, de chamar  a atenção, de sermos aceites. Precisamos unicamente de nos sentirmos bem na nossa pele, nos nossos trapos. Porque as modas mudam, nós permanecemos.


terça-feira, 5 de julho de 2016

Post.it: Apenas esse pouco

Não é o muito que nos preenche e sacia, mas o saborear de cada sensação, de cada momento.
Será que isto vos diz algo? Gostava que sim, que já tivessem sentido este sentimento, esta tranquilidade que os torna quando em nós vividos, verdade.
Fazer anos, somar aniversários, festas lembradas ou esquecidas, não é isto que nos torna melhores, mais sábios. Quando muito torna-nos menos “surdos” ao que nos rodeia, ao que é realmente importante.
E o importante, descobrimos um dia, é a tranquilidade com que vivemos cada dia, sem questionar o seguinte. Cada degrau daquela velha escada que já subimos e descemos tantas e tantas vezes, hoje cansa-nos mais, é verdade, mas vejamos pelo lado positivo, obriga-nos a subir de forma pausada, apreciando a paisagem e a descer admirando o horizonte.
Vamos perdendo… mas também ganhando… sobretudo vamos adaptando-nos, ao fim de algum tempo já sem queixumes e até, quem sabe, achando graça, à “desgraça” que é deixar de ser como eramos há 20 anos, mesmo quando nessa altura já tínhamos mais de 20 anos de existência.
A memória, essa leal mas também traiçoeira amiga, que um dia nos contará outras histórias, sobretudo as mais belas. Não sei se mais belas porque o tempo lhes conferiu encanto ou se foram realmente inesquecíveis. Muitas, poucas, que importância isso pode ter, quando se tem o suficiente e esse suficiente nos basta para sermos felizes
Vai-se-nos enevoando a visão, ela que nos encheu o olhar de tantas aventuras e tantos deslumbres, fechando os olhos, passamos a ver cada vez mais com o coração.
Também as forças vão diminuindo, já não erguem os filhos, quase que nem os netos, mas que ainda amparam e sobretudo acarinham com mais doçura.
E todos os anos, em que buscamos nas amizades uma harmoniosa companhia, descobrimos a melhor, paciente, silenciosa,  que esteve sempre connosco, a nossa.
Afinal não precisamos de conquistar o mundo, apenas necessitamos do nosso mundo.


sexta-feira, 1 de julho de 2016

Post.it: Escrever nas linhas da vida

Às vezes escrevemos o que a memória nos permite, o que a fantasia nos possibilita, o que a vontade de alcançar nos faculta. Mas são sempre histórias, as nossas, as dos outros e as daqueles que passam por nós e deixam uma qualquer inspiração.
 Nem tudo é verdade, nem tudo é mentira, depende de quem lê, a tornar a sua verdade ou a sua mentira ou apenas fantasia. “Lemos porque buscamos na leitura a história que não vivemos”. Lemos porque precisamos de sonhar ou por vezes de acordar.
Lemos para voar e cada página é uma asa aberta ao horizonte de infinitos. Lemos porque necessitamos de aterrar, de encontrar portos de abrigo para vencer as nossas tempestades.
Os livros nada mais são do que pedacinhos de nós. “A minha estante está cheia de gente”. E essa gente que tenho por amigos, fieis, companheiros, sempre presentes, quando, de repente, o silêncio enchesse de vozes, de palavras, de pensamentos.
Deitada no sofá, corro por cada página atrás de cada frase, que mais parece um comboio em permanente viagem. Cada momento empolgante, rouba-me o ar, o olhar fica em suspenso, preciso parar, preciso de retomar a história, percorrer o fio desses intrincados meandros.
Sofro, como sofro pelo sofrer de cada personagem. Apetecia-me rasgar aquela página, rescreve-la, dar-lhe um destino melhor.
Porque se na vida real não temos essa possibilidade na literatura “o céu é o limite”. Mas isso é roubar as palavras ao autor, furtar-lhe os pensamentos, distorcer-lhe os sentimentos, usurpar-lhe a intenção, invadir-lhe o coração e tornar nosso o que não nos pertence, mesmo que o tenhamos comprado, que esteja na nossa estante.
Nessa estante onde esteve toda uma vida quando por um qualquer acaso resolvemos folheá-lo e agora, agora estamos armados em críticos da sua inspiração. 
Que vaidade a nossa! Querermos rescrever uma obra editada, quando nem sequer conseguimos passar da escrita ingénua que desenhamos nas primeiras linhas da nossa vida…