sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Post.it: Hábitos

Não tenho uma vida, tenho o hábito de viver. Não tenho um emprego, tenho o hábito de ir trabalhar, de me levantar cedo, tomar duche, engolir o pequeno almoço e sentar-me na paragem à espera do autocarro, que tem o hábito de se atrasar.
Por hábito, digo bom dia aos colegas, sorrio ou terá sido um espasmo muscular?
Pico o ponto, sento-me na cadeira giratória em frente à secretária e começo a “falar” com o computador, mais do que um hábito, começa a ser uma fiel amizade, ele está sempre presente nos meus dias, meses, anos, ali, constante das 9 às 18 horas, de segunda a sexta. Se falta a luz é uma catástrofe, como se tivesse morrido um parente próximo, um amigo do peito. Fico sem norte, sem sul, sem rumo, sem hábito, perco-me de mim. Número de cidadão, de NiF, de NiB, etc., etc., não sei, está tudo no computador! Eu estou no computador! A minha identidade, os meus segredos, sonhos, vitórias, fracassos. Porque, a dada altura tornou-se um hábito, um quase vicio, partilhar a vida com o meu PC.
À noite, regresso a casa, mas antes disso, por hábito, sigo os mesmos caminhos, conto os mesmos passos até à esquina, antes de atravessar na passadeira, sento-me no mesmo banco de jardim, dou pão aos mesmos pombos, bebo um café, ouço as mesmas conversas. Por hábito, apanho o mesmo autocarro, com as mesmas pessoas, já nos cumprimentamos.
"A Joana hoje não vem?"
"Atrasou-se, tinha uma reunião" 
"E a Teresa, não a tenho visto, estará doente?"
"Não, está grávida, mas como é de risco devido à idade, tem de ficar de repouso nos primeiros meses". 
"Hoje o autocarro vai mais cheio, começaram as aulas, lá vêm os miúdos carregados com as mochilas furando pelo corredor!” 
”Pois é, já me tinha habituado ao sossego neste autocarro, agora é uma algazarra de gritos e conversas, só espero que não haja muito trânsito para chegar a casa depressa e relaxar um pouco, antes dos filhos chegarem com o pai”. 
Porque a dada altura já não se tem um casamento, tem-se um hábito.
Adaptamo-nos, moldamo-nos, encaixamo-nos, acomodamo-nos, aceitamo-nos a nós e aos outros, por amor, amizade, ou quem sabe, por hábito.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Post.it: Este Outono

O outono bateu-me à porta, vinha suave, tímido, como um namorado arrependido. Não foi uma chegada mas um regresso, afinal, quantos outonos já conheci? Muitos, começo a somá-los, devagar, porque a dada altura da vida, já não se tem pressa, chega-se lá é a nossa cada vez maior convicção e por lá entenda-se a um destino que por vezes existe paralelo aos nossos desejos. 
No entanto, outono, o nosso outono, acrescenta em nós uma gratidão que nos era desconhecida nos áureos tempos de natural rebeldia. É normal, faz parte, de se começar a “crescer”, porque é isso que sente, um crescimento prazeroso. 
 Uma amiga que tenho sempre bem-humorada, começou a ganhar alguns quilinhos mais, fez dietas, todas as que ouviu na rádio, na televisão, na internet, fechou a boca, bebeu litros de água, por fim, reflectiu e desistiu, “não estou gorda, estou é cheia de sabedoria!”. 
Quem me dera ter a sua sabedoria humana, a sua capacidade de caminhar sobre as folhas de outono sem as amachucar, com a leveza da sua cordialidade. 
O outono bateu-me à porta, abri-a devagar com receio que as promessas de fidelidade, de carinho, de companheirismo não fossem cumpridas e que as folhas voassem no primeiro sopro de vento e ele entrou, sentou-se na minha sala com um sorriso renovado, pediu-me esperança e eu voltei a acredita, pediu-me confiança e eu confiei.  
Como negar-lhe que entre, que fique e que faça da minha vida a sua terna morada? Somos cada época, cada estação, florindo, rejubilando de sol, somos folhas que caiem para que se possam renovar, somos frio, vento e por vezes chuva, para que tudo comece, recomece, renasça e volte a ser com promessas mesmo que não cumpridas o melhor de nós.

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Post.it: Por este rio

Imagino o tempo como se fosse um rio, um rio que passa lá fora e eu numa das margens, observo-o e deixo-o passar. Sinto que passa por mim, por vezes passa em mim, e nesse passar vai deixando fios de neve no meu cabelo enquanto o rosto outrora liso e luminoso ganha socalcos de foz e sombras de luar.
Há quem veja esse rio repleto de lágrimas, de histórias sofridas. Há quem apenas o veja com declives, pejado de pedras rolantes, frio, apressado, que correndo para a meta quase revela uma cascada para onde caiem os sonhos, as esperanças, os desejos, a confiança.
Pobre rio, penso ao olhá-lo, que incompreendido és…
Navega na sua placidez até que uma vida mais tempestuosa o agita, turva-lhe as águas e afoga nele os seus medos. Procuramos culpados para as nossas culpas, perdidos por entre os labirintos humanos, baixamos os braços, deixando que o rio feito de tempo navegue e nos conduza ao longo da corrente. Por vezes sufocado pelas margens dos nossos condicionalismos morais, sociais, educacionais mas  também isso é apenas uma desculpa, uma tábua a que nos agarramos evitando a morte certa de tudo aquilo que somos.
Há quem tenha forças para ir mais além, verdadeiros heróis que tentamos sem conseguir, imitar. Aqueles que não temem a morte, essa morte que permite o renascimento. Sair da sua área de conforto, sair do rio, mergulhar em pleno no mar, afogando-se no peso da sua história construída como o cimento de toda uma vida de padrões, de grilhões herdados do ontem e carregados ao longo dos ‘hojes’ transportados por outros tantos ‘amanhãs’.
É cada vez mais necessário libertar-se, vir à tona da água e respirar o ar fresco de quem encontra outro caminho que abraça como seu. 
Imagino o tempo nessas águas onde sou barco por vezes à deriva, por vezes remando com todas as forças da fé, outras sonhando que tenho o motor e vou mais rápido mas sem pressa. Afinal beleza do tempo está no nosso modo de o olhar, se o olhar a partir do rio só vemos o sufoco das margens mas, se for partir das margens, conseguimos ver o tempo/rio tal como é no deslizar suave das águas. Cada cabelo branco, cada ruga é consequência  do seu embalo.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Chovia de alegria

Quando nasci, chovia,
Não sei se de tristeza ou alegria.
O céu em tom de profecia,
Olhava-me do alto e não sorria.

Quando nasci era manhã,
Minha mãe em estranho afã.
Com tanto ainda por fazer
Antes de me fazer nascer.

E eu buscando a luz,
Que ainda hoje me seduz,
Como se uma vida de escuridão
Me toldasse já o coração.

Mas a magoada profecia,
Que me acompanhava noite e dia,
Anos depois se desvaneceu,
Quando o meu sobrinho nasceu.

No dia do seu nascimento, chovia,
Não de tristeza, mas de alegria.
Eram lágrimas minhas e do céu,
Que cada um em amor lhe ofereceu.


domingo, 17 de setembro de 2017

Post.it: O segredo dos segredos


O segredo do perdão é olhar sem julgamento
O segredo da fé é não esperar por provas
O segredo do carisma é olhar com amor
O segredo da saúde é sentir e manter a alegria
O segredo da força é fazer vencer a vontade
O segredo do amor é amar com inteligência
O segredo do destino feliz é ir pelo caminho positivo
O segredo da paz é encontrar em si o equilíbrio
O segredo da harmonia é observar a natureza
O segredo da beleza é ver com o coração
O segredo dos sonhos é tentar concretizá-los
O segredo do caminho não é a meta mas a viagem
O segredo de um bom dia é cuidar dele de manhã à noite
O segredo de obter respeito é saber respeitar-se
O segredo da escuridão é que ela permite ver as estrelas
O segredo da chuva é que faz renascer as flores
O segredo da vida perfeita é apreciar tudo o que ela nos dá
O segredo dos segredos é estar atento para os descobrir


terça-feira, 12 de setembro de 2017

Post.it: Saudades do futuro

Haverá quem se ria deste título, pessoas racionais, pessoas com tanto medo do futuro que apenas conseguem criar saudades do passado, pessoas que não conseguem abrir as asas da esperança e voar pelos ideais que gostariam de conquistar.
Mas há quem, como eu, tenha saudades do futuro, essa sensação existe em nós, cresce-nos no peito como algo que calamos ou que gritamos quantas vezes num longo suspiro.
Esse momento em que quase tocamos no futuro e quase de imediato ele se torna passado, esse dia que tentamos apanhar na fronteira que chegamos quase a não dormir com receio que o breve fechar de olhos lhe permita fugir de nós. Quando a noite num suave parto faz nascer a manhã  que rapidamente se torna luz, ténue entardecer e escuridão. 
De repente o amanhã tornou-se hoje e quase simultaneamente, ontem.
Nesses ontem, ficaram perdidos os nossos sonhos não realizados, as nossas esperanças não alcançadas, as nossas lutas derrotadas, o nosso querer adiado, a nossa vontade anulada. Resta-nos a saudade desse futuro, agora, passado, continuamente protelado.
Saudade, é apenas isso que nos resta. Saudade é apenas isso que nos faz seguir em frente, deixando para trás o que passou, acreditando ainda no que há-de vir e se não vier será apenas mais uma doce e terna saudade. Já nos habituamos a ver passar os dias, a olhar para os meses, a abraçar os anos com a ternura de quem já não se revolta por não ter chegado à meta desejada, por ter aprendido ao seu ritmo a apreciar o caminho. 
Aprendemos a ser felizes por continuarmos a desenhar no horizonte fantasias de algodão e esperanças de areia, porque o verdadeiro prazer, não está no concretizar mas no que de nós pomos no projecto de sonhar e criar um futuro, mesmo que feito de saudades.

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Post.it: Partilhar?

Há coisas que não partilhamos, nem com os melhores amigos, nem com os companheiros, familiares, nem connosco. Segredos nossos, tão nossos que os escondemos da luz do sol, da escuridão da lua. Não sei se  é por medo, por vergonha, por qualquer sentimento que nos impede de os soltar e deixar voar. 
Segredos que por vezes nascem na tenra idade e a dada altura deixamos de os sentir como segredos e passam a ser em nós como um membro, um braço ou uma perna, algo que por vezes nos dói, afinal,  os nossos membros em certas alturas também nos doem. Somos feitos de carne e osso e muito mais, somos feitos de sensações e outras, muitas questões.
É difícil partilhar, abrir o coração, deixar alguém entrar, ver-nos, sentir-nos, desnudar-nos a alma, visitar em nós cada recanto e recanto. 
Depois, nada fica como era, a nossa “casa”, tocada, mexida, quiçá até desarrumada por essa visita muda algo em nós. Quem sabe melhora-nos, quem sabe piora-nos. Com um pouco de sorte, pós de magia, centelhas de milagre, faz-se-nos caminho e acompanha-nos ao longo dele. Torna-se um pouco de nós, tornamos-nos um pouco ele.
Mas, ainda assim, há coisas que não partilhamos, lembro-me em miúda ter ouvido uma frase que se tornou lição “somos escravos do que dizemos, somos reis do que escondemos”, e cada um de nós no seu “trono real”, acabamos por gostar dos nossos segredos, aquilo que nos dá uma espécie de garantia de que nunca seremos “roubados” ao mais íntimo de nós.
O que começa como uma dúvida, uma angústia que nos atormenta, constrange, que nos causa amargura de repente torna-se um “tesouro”, a riqueza do que somos, nos individualiza, caracteriza, torna-nos únicos, especiais, torna-nos unicamente nós.

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Post.it: Síndrome de Garfield

“Sê mais forte do que a tua maior desculpa”.
Li esta frase e ela fez-me sentido, ser mais forte para vencer as desculpas, os medos, o comodismo. Deixar de adiar, a decisão, o final, a chegada, a partida, a vitória como receio da derrota e depois, um dia, dizer simplesmente que não aconteceu porque não era para acontecer, frases feitas que nos tentam consolar. Há pessoa extraordinárias com uma força, com uma coragem que admiro, que tento, (juro) que tento mas acho que sofro do síndrome de Garfield, (sabem aquele gatinho fofo, cheio de uma preguiça colossal) mas que consegue atingir os seus objectivos e sem se cansar. Talvez seja melhor ser inteligente/esperto do que ter um corpo de Hércules abdicando das coisas “gulosas” da vida. Porque será que o que é bom, “é imoral ou engorda”, mas sabe bem dizem as “desculpas”. Esses “anjinhos diabólicos” que nos enchem os sentidos com com argumentos “impossíveis” de rebater. Mas somos fortes, dia sim, dia não, resistimos à preguiça e damos tudo por tudo no ginásio, ficamos de rastos e temos que repor as energias com algo substancial, merecemos, vencemos a indolência, espantámos o nosso “Garfield” do sofá e fizemo-lo correr e suar por todos os poros, alguém sugere “que tal um gelado?”, todas a olhamos com um olhar fulminante; ela hesita, pensa, “será que devia começar a fugir, pedir mil desculpas, oferecer-lhes o mais humilde sorriso em arrependimento pela sugestão?
O silêncio parece demorar uma eternidade, por fim, todas concordam, “um gelado, boa ideia, as férias já terminaram, não faz mal se o resto do ano não couber no bikini”. “Amanhã regressamos ao ginásio e gastamos todas as calorias que vamos saborear”. 
“Ainda não foi desta que fui mais forte que as (vossas) desculpas”. Entretanto, chego a casa, felizmente tenho um cão e não um gato, vou à rua com ele, fazemos uma longa caminhada e gastamos o gelado e a preguiça, ele olha para mim com um sorriso arfante como quem pergunta, “Quando chegarmos a casa vamos jogar à bola, não vamos?”. Claro! Sorriu, acho que ainda tenho um iogurte grego de stracciatella para a sobremesa…

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Post.it: O regresso

O regresso, tem sempre uma sensação diferente para cada um. Depende de onde se regressa, depende de para onde se regressa. O que termina, o que recomeça, por vezes, raras vezes, o regresso trás consigo mudanças, novidades, expectativas. Fica-se sem saber o que sentir, alegria, receio, vontade de saber, de conhecer, de ir mais além. Por vezes há uma tristeza que não se prende com o regresso mas com a proximidade de uma outra mudança; a Reforma esse “papão” para uns, essa concretização de sonhos, para outros, nuns e noutros, uma certeza, o tempo foge, corre, e não se deixa apanhar. Longe disso estão uns, muitos, um “longe” que se aproxima devagar/depressa.
Mas agora, este regresso é das férias ou da pausa voluntária/forçada e independente das razões, independentemente de ter sido por motivos agradáveis ou não, voltar à rotina dos dias, ao ligar e desligar do despertador deixa em nós uma espécie de mágoa, uma saudade que se aloja em nós, por mais que a queiramos espantar, alegando que “para o ano há mais”. Sim, sim, claro que sim, mas agora, hoje, quando o despertador me faz saltar da cama e ainda o dia não amanheceu, apetece-me resmungar contra todas as frases feitas, porque nenhuma me consola.
Dentro em breve o verão terá partido em seu lugar fica o outono com o seu manto de nostalgia preparando o caminho para o inverno, bem sei que será uma estação breve, mas de repente, não contendo a melancolia que me começa a invadir como se o inverno viesse quase eterno, intenso, imenso. Com um frio que nos magoa, que nos congela a vontade, que nos derrota o querer, “acho que influência da série Guerra do tronos na qual me confesso (viciada)”. 
Será que vamos vencer os nossos “medos” numa realidade que tem os seus dias de horror com atentados, catástrofes naturais, com a eminência de guerras, de políticas ditatoriais. Nas férias não pensamos nisso, não queremos pensar, mergulhamos nas ondas e esquecemos, suspendemos até há hora do regresso.
Até hoje, agora, mas depois há quem nos receba bem, quem nos faça sentir bem-vindos, quem nos diga que está tudo bem e até que pode melhorar. Acreditamos, precisamos de acreditar, precisamos de esperança para levar cada manhã até ao anoitecer com um sorriso nos lábios. Por isso, mesmo que seja só por isso, é bom regressar.