sábado, 25 de abril de 2020

Dia da liberdade


Tenho liberdade para sair – Mas fico em casa.

Tenho liberdade para ir – Mas não vou.

Tenho liberdade para crescer – Mas encolho-me.

Tenho liberdade para ser feliz – Mas não sou.

Tenho liberdade para abraçar – Mas não abraço.

Tenho liberdade para sonhar – Mas não durmo.

Estou prisioneira  - Não matei, não roubei, não fiz mal.

Estou prisioneira – Não da doença,  dor ou de ordem superior.

Estou prisioneira – Não da política, nem sequer da legislação.

Estou prisioneira – De um vírus que me condena à solidão!


terça-feira, 21 de abril de 2020

Era um velho...


Dizem que era um velho,
Muito velho.
Dizem que era um pobre,
Muito pobre.

Tinha pouco mais que pão,
E um lugar certo no chão.
Mas todos os dias se levantava,
E com um sorriso caminhava.

Chamavam-lhe louco.
Feliz, com tão pouco?
Mas ele em poucas palavras dizia,
A alegria está em ter este dia.

Bastava-lhe ser quem era,
Que após o inverno viesse a primavera.
Vencera muitas guerras, curara muitas dores,
Conhecera, suspirava, bonitos amores.

Chorar, cria vendavais, e aprofunda o mar,
Devemos agradecer por o sol brilhar.
Acreditem, tenham esperança,
A vida é como uma criança.

Que cai e se levanta sem desistir,
Porque ainda há muito para descobrir.
Por cada escuridão que nos escurece,
Há uma luz maior que nos amanhece.

Era um velho muito jovem,
Como se fosse um começo de viajem.
Era um pobre muito rico,
Tinha um coração de ouro infinito.



terça-feira, 7 de abril de 2020

Post.it: A vida está cheia de nascimentos

“Nascemos muitas vezes naquela idade
onde os trabalhos não cessam, mas reconciliam-se
com laços interiores e caminhos adiados” J. Tolentino

Gosto de pensar que nasço na experiência de cada amanhecer, na descoberta de cada raio de sol que me invade o dia. Gosto de pensar que nasço em cada passo que dou, que já foi mais firme, não pela certeza do caminho mas pela capacidade de o fazer sem pensar que um pé vem depois do outro.
Mas sim, há uma calma que me acalma os sentidos, que me reconcilia com a sucessão de momentos, uns mais dóceis, outros mais angustiantes, outros ainda, os melhores, são aqueles que me sopram brisas inspiradoras de esperança. Sim, porque há esperança em qualquer idade, em qualquer crise, em cada fim que se torna começo.
Crescem os  laços interiores, forma terna de sublimar as nossas pequenas prisões, éticas, morais, educacionais. Compromissos que assumimos com os outros, mas sobretudo connosco. Gosto de pensar neles como algo que se dá porque nos é fonte inesgotável.
Outros laços há que os ato como quem guarda um molhe de cartas para que não se percam da memória que como se fossem pedacinhos de história vivida, sentida, sofrida com lágrimas e risos. Em tempos passados sentia gozo em desenlear nós, tinha paciência para essa tarefa, agora prefiro atá-los, para que não se percam, para que vão formando um fio encadeado de pequenas paragens onde temos de permanecer um pouco mais para saborear essa lembrança.
Como se fossem contas de um rosário, não para rezar e sublinhar as perdas, mas para contar e recontar os ganhos.
Houve caminhos por onde não fui, adiados? Não,  escolhas que fiz. Pouco importa agora, se foram os caminhos certos ou errados. Foram os certos para esse momento. Viver de arrependimentos é não encarar o presente que se torna passado a cada instante sem ter futuro.
O hoje pode parecer um momento estranho porque não sabemos como o viver. O amanhã pode parecer uma noite escura que receia amanhecer.
Mas enganam-se os que pensam que isto significa desistir. Continuaremos aqui, sempre que nos descobrimos amados e capazes de amar. Sempre que reencontramos o riso sobrevivente das lágrimas, porque a vida, acreditem, está cheia de nascimentos. E um amanhã sem Covid-19, sem dores, sem mágoas; está à distância da nossa coragem, da nossa esperança...