segunda-feira, 30 de julho de 2018

Meu querido, mês de Agosto

Férias é quando a alma vai a banhos,
enquanto o corpo fica na cama a imaginar,
que se refresca no azul desse imenso mar,
Férias é quando vivemos dias sem planos.

São momentos em que nos permitimos,
acordar sem ter aquela hora marcada.
Quando dos amigos nos despedimos,
julgando ser noite e já é madrugada.

Claro que nas férias há muita ilusão,
acreditamos que tudo é para durar,
e lá deixamos à deriva o coração,
qual barco sem cais para aportar.

Mas há o outro lado que faz parte,
Onde o sol deixa o corpo a escaldar,
E os castelos de areia de rupestre arte,
Vão numa onda que os vem roubar.

Ou a  areia colada na pele molhada,
as crianças na rua pela noite fora,
o calor sufocando a noite cansada,
o sono que tarda, o sonho que demora.

Por vezes o  vento sopra em desatino,
lá vêm os mosquitos para nos devorar,
ou o fumo do peixe assado do vizinho,
E pensamos, para o ano havemos de voltar.


sexta-feira, 27 de julho de 2018

Post.it: Escrevo com caneta

Ainda escrevo com caneta, gosto de ver desenhadas no papel, as linhas sinuosas das palavras. Caminhos que sabemos onde começam, mas raramente onde se encontra o seu términos. Quando se coloca o bico da caneta sobre o papel, por vezes, já temos uma ideia de por onde queremos ir, o que queremos escrever, mas rapidamente a caneta, ganha vida própria na nossa mão, então, desliza, por vezes parece que até voa e nós, apenas tentamos seguir essa pressa, essa urgência de dizer algo. Quando para, retomamos o ar, que de tão ofegante não nos cabe nos pulmões Mas, ainda não refeitos, já a caneta nos puxa pela mão e lá seguimos no rasto de uma estranha inspiração. Quando leio o que a caneta escreveu, pergunto-me, de onde vieram aquelas palavras, aquelas ideias, não que as classifique ou adjective, de boas ou péssimas em qualidade de texto, em consonância de sujeito de predicado, no uso correto dos verbos, ou das figuras de estilo, afinal, que sei eu sobre escrita, na maior parte do tempo sinto-me apenas um grão de trigo, perdida numa imensa seara, torcendo e contorcendo o papel envergonhado, por ousar colocar na sua imaculada brancura, breves laivos de uma alma ainda mal saída da sua nascência.
Ainda escrevo com a caneta, fiel companheira de sorte e infortúnio, como posso, sequer pensar em a substituir pelo matraquear de uma teclas gélidas e insensíveis, falta-lhes o traço de adorno, o estilo quase desenhado e encadeado de letras, palavras e frases. Mais do que o conteúdo, a mensagem, a pintura, o risco transformado em formas, contornos, olhos que nos olham, bocas que nos beijam, braços que nos confortam, lágrimas e sorrisos, quiçá uma gargalhada, ou porventura, um terno e misterioso, suspiro… quando se vira a página e se conclui que está tudo dito.
Porque só a caneta nos oferece generosamente o seu silêncio, um silêncio tão repleto de murmúrios que só um coração atento e delicado consegue escutar e receber deixando que nesse espaço de conforto e reconhecimento pare e se recomponha do cansaço dos dias vazios de essência vital. Dias que nos enchem de coisas, de sons desarmoniosos, de conversas que nos colhem os últimas sementes de esperança em poentes de maresia para os transformar em nuvens cinzentas de um fumo civilizacional, numa força volátil desta adrenalina sedentária e asas que se abrem encetando um voo mas que sem força anímica permanecem no chão sem energia para voarem, para sonharem e acreditarem nesse sonho transformando-o em realidade. 
Ainda escrevo com a caneta, porque só ela me liberta dos grilhões da gravidade atmosférica e me permite voar em busca, não deste, mas de todos os horizontes que não conhecem fronteiras nem muros de pedra e de medo.

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Post.it: Os mares do pensamento

Estranhos são os mares do pensamento… Orlas marítimas que nos elevam e afundam. Quando o navegar tem por objectivo, apenas um cais onde aportar. Mas as ancoras não encontram  solidez que o segure,  os ventos sopram fortes nas velas erguidas. O pensamento  nada contra a maré, mas não resiste e voa. Neste vai e vem em que parte e regressa, aquele que foi, já não é o mesmo que regressa.
Quantos oceanos  cruzou, quantos vendavais venceu, tudo isso, para que o sonho possa por fim, dormir nas águas calmas de um renovado amanhã.
Sem olhar de novo  para a praia, lá, que ficaram os despojos das suas batalhas perdidas. O caminho agora, é sempre em frente, seguindo a luz de um farol que se acende para si como um sorriso de esperança, em oferta de trégua e de bonança.
Esta água, de tanta mágoa, com a força que esculpe a rocha, com uma voz de silenciosos murmúrios, que em onda se eleva mas rendida, se ajoelha no areal.
Já não lhe quero mal por me afogar os sonhos, por me naufragar as esperanças, por me inundar o peito de medos.
Um dia, sim, um dia,  a maré há-de mudar e as velas vão dançar na brisa. Nesse dia, vou estar ao leme, a emergir das maiores profundezas, a galgar cada crista marítima. E vós meus pensamentos, meus amargos tormentos, acenar-vos-ei da mais alta arriba e, vos verei partir, meus longínquos e, apesar de tudo, doces momentos.


sexta-feira, 20 de julho de 2018

Post.it: Quem diria...

Quem diria…
Dizes num fio de voz cansada. Ultimamente é a única frase que te ouço proferir, todas as outras que se lhe seguem, são como que um balbuciar de um retorcido fonético, numa língua que ninguém entende. O teu neto em tom jocoso diz que agora falas russo e nós, reconhecendo a inocência do menino, sorrimos, com tristeza.
Quem diria, ficamos nós, também a pensar…
Que aquela menina cheia de energia, sempre a pular à corda, ela e as suas tranças negras havia de perder as tranças, e a gargalhada cristalina para se tornar doutora, com óculos de aros grossos e cabelo arranjado no cabeleireiro todas as semanas.
Quem diria que o João, aquele menino de rosto sempre afogueado e caracóis ruivos que nem o vento os desmanchava, havia de casar e ter um rebanho de filhos, cada um igualzinho ao outro, com rosto afogueado e caracóis ruivos.
Quem diria…
Que a Joaninha, tão tímida e certinha, entraria por caminhos perdidos, escondida nas sombras da noite entre uma dose na veia e a seguinte para voltar a casa, se é que aquele conjunto de paredes despidas pode ser uma casa, mas para ela é quanto basta para descansar os ossos.
Quem diria…
Que aquela criançada tão inocente e tão feliz, teria este destino, o que lhes calhou em sorte, ou em falta dela.
Hoje, na mesma rua, talvez ainda nas mesmas pedras da calçada, correm outras crianças. Por vezes apetece-me gritar-lhes calem-se! Já viram as horas que são? As pessoas precisam de dormir sem o vosso barulho! Mas suspendo o impulso, olho aqueles rostos, aperta-se-me o peito, que futuro os espera?
Não o sabem, talvez tenham mais sorte que as outras crianças que por ali passaram. 
Não posso prever o amanhã, apenas posso deixa-las viver o hoje, um agora feliz, antes daquele surpreso, quem diria…

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Post.it: Fim do ano escolar

Final do ano escolar, sempre a mesma agitação, tensão, passa não passa, entra não entra na faculdade, termina ou não termina o curso, sempre o agora e o depois nas nossas e suas preocupações.
Porque eles são os nossos filhos, as nossas sementes de esperança. A força do caminho, a coragem do destino. São o nosso horizonte, a mão que toca cada nuvem por mais alta que esteja. A realidade dos nossos sonhos. São o “nós”  que prossegue e chega muito mais  além. A mão pequenina que recebe o testemunho que lhe damos no ADN envolto de carinho e embalo.
São os passos que nós lhe ensinámos a dar e que passam a ser os seus nesse equilíbrio de quer voar e voa, aos poucos, quando arrisca a ser quem é. Nós, pais ficamos atrás incentivando a que prossiga, ao lado acompanhando para que não se desvie, à frente para lhes desbravar o caminho. E eles vão tropeçando, como quando os ensinamos a andar de bicicleta, um dia, hão-de ir sozinhos, ainda que não completamente, porque estaremos sempre presentes mesmo quando ausentes, estaremos perto, ainda que longe.
Nascem, crescem, vão para o infantário,  para a escola, saem da escola, para a faculdade, para o emprego, se tudo correr bem..
 Nesse entretanto, trazem-nos desenhos num emaranhado de cores que nós colamos na porta do frigorífico orgulhosas do nosso pequeno “Picasso”, trazem-nos os testes com notas que olhamos com desvanecimento ou que preferimos nem olhar.
Até que um dia nos trazem uma fita colorida e lá assinamos não com o nome mas com toda mistura de sentimentos maternais, porque erguemos o olhar e continuamos a ver a criança naquele quase homem/mulher.
O que lhes desejamos? Tudo, que seja deles o mundo, o universo, todos os dias de sol, todas as flores da primavera. Se não poderem ter tudo, que tenham momentos de sucesso, dias de alegria, horas de felicidade. E a certeza de que, podem ir mas sempre voltar. 
Porque aqui, neste coração, está o vosso lar, com um abraço sempre disponível para vos aconchegar.

sexta-feira, 13 de julho de 2018

Post.it: Que nos voe...

Talvez este não seja o melhor ano de cada vida, talvez sobre ele tenham pairado nuvens demasiado escuras.
Talvez algo tenha acabado, mudado, desaparecido. Talvez algumas pessoas queridas, tenham partido e outra chegado.
Talvez este rio leve consigo, um pouco de mim. Talvez no chão não existam apenas passos esquecidos mas, tantos outros perdidos, sem terem  encontrado o seu destino  e permanecem às voltas na sua rotunda existencial.
Talvez o vento não tenha limpo o horizonte do sentir e ainda ande por aí em busca de uma luz no fundo do túnel.
Talvez as estrelas tenham ficado sem brilho porque se extinguiram há anos luz, só nós teimamos em ver a ilusão da sua presença.
Talvez os corações tenham encalhado em cada cais vazio de gente mas cheio de esperas no desencontro das marés.
 Talvez se tenham calado os murmúrios de promessas que pelas arribas ecoavam e nas dunas se aconchegavam.
Talvez o sol tenha tardado e o voou de andorinhas não tenha sequer chegado. Talvez a primavera que se delonga em florir, tenha tirado a cada olhar a razão do seu sorrir.
E quando as velas latina se desfraldam, quando as ancoras se erguem, está na hora de dar novo rumo à proa, girar o leme e confiar nas ondas.
Porque como diz o escritor “Não se pode amar uma ausência sem espessura de gente”. 
Que nos sopre o vento de feição, que nos voe para a felicidade o coração…


segunda-feira, 9 de julho de 2018

Post.it: Planando

 “Cada momento feliz, torna-se um ontem transformado em saudade”.
Então enche-se-me o peito de alegria, porque ele está cheio de saudades, do tempo já ido, do tempo presente e daquele que espero um dia conhecer e transformar em memória que me preencha e me dê vontade de chegar mais além. Porque o horizonte já me chama, porque o amanhã já me reclama. E eu sem pressa, sorrio ao tempo, sim já tive pressa.
Pressa de construir a perfeição, de realizar sonhos mesmo antes de os sonhar. Queria porque queria, ser feliz; queria porque queria este, aquele e o outro amor, não, não era por leviandade, mas pelo desejo fugidio de viver num só instante a eternidade de todo o existir.
Era a juventude, essa juventude que não se contabiliza em anos mas em palpitações, em deslumbramentos do coração. Ou talvez porque já ao longe adivinhasse que a velocidade da esperança abrandaria, que a sede de infinito caberia um dia na palma da minha mão e não se perderia mais por horizontes do olhar.
Digo-o sem melancolia, sinto-o sem pesar, vivo-o sem amargura, porque tudo se transformou em suave ternura. Por vezes ponho a mão sobre o peito, como que acariciando o coração, falo com ele das nossas aventuras e desventuras, ainda não velho, talvez apenas um pouco desgastado, descompassado.
Já não voamos cortando o vento, rompendo as nuvens, brincado com os raios solares. Hoje, planamos, saboreando as correntes de ar quente e pairamos sobre o luar. A vida, essa, tornou-se-nos um jardim de flores que colhemos com a similar delicadeza com que a natureza a faz desabrochar. 
Um certo ar outonal, que ainda tem sorrisos primaveris, espreitando irreverentes, pelos cantos furtivos do olhar. Cada instante da vida é único, porque, irrepetível e feliz, torna-se o melhor, deste agora que é, totalmente nosso.

sexta-feira, 6 de julho de 2018

Post.it: Ponto por ponto

Por  vezes, basta um ponto e tudo muda, começa ou acaba.
Um ponto em que tudo se une, tudo se afasta. Um ponto em comum ou que nos diferencia na continuidade do caminho..
Quando no princípio trocamos ideias em que nos tentamos conhecer, somos nós e são os outros, ponto a ponto.
No momento em que nos encontramos num ponto de partida, uma viagem que imaginamos perfeita, desconhecendo as suas sinuosidades.
Há um ponto de luz, esse túnel tão esperançosamente iluminado, avançamos com um receio replecto de coragem.
Claro que sempre com muitos pontos de interrogação para com este espaço, o nosso ponto de encontro. Porque é bom unir pontos, construir uma recta que é a distância mais curta.
 Porque procuramos que tudo à nossa volta seja um ponto de equilíbrio, mas será? Talvez, depende sempre muito de cada ponto de vista.
Depois, chegamos a um ponto em que se começa a desenhar a resposta e esse ponto foi quiçá, apenas um ponto de passagem. Ou na melhor das hipóteses, significou um feliz ponto de viragem.
Quantas vezes a nossa vida está assente no mais ínfimo e efémero ponto. Mas se mais pontos houver que valha a pena juntar, quem sabe, o conjunto de todos os pontos seja uma linda e real pintura. 
Depois de tantos pontos, quem sabe possamos pôr sobre algumas coisas, um ponto final.

segunda-feira, 2 de julho de 2018

Post.it: Se for amizade


A família calha-nos em sorte por laços de sangue, por herança de um passado, por destino de um futuro. Nem sempre é a que queremos, preferíamos alguém diferente, uns pais parecidos com os pais dos meus amigos. Uns irmãos que brincassem com as irmãs. Uns avós que ainda tivessem paciência para aguentar a nossa energia. Uns primos amigos, uns tios divertidos, uns cunhados mais afeiçoados, mas enfim, é o que nos calha.
Já os amigos, esses, escolhemos, há quem eleja pelo pedigree, pela disponibilidade, pela bondade, pelo carisma. Eu escolho os meus amigos pelo olhar, pelo sorriso, pela lealdade, pela dedicação, pela humildade, por serem um pouco como eu, mas também por serem diferentes e assim me completarem.
A verdade, confesso, é que não há uma escolha, há antes, um encontro, uma energia, uma oferta recíproca. Por vezes insisto em contrariar o destino, e invisto em amizades que tentam sê-lo mas nunca ultrapassam a fronteira de um mero conhecimento.
Nessa altura, cresce-me um vazio dentro do peito, uma mágoa, uma dor sem ferida mas, como diz o poeta, chega a doer. Que fazer, um bote quando só tem um remo acaba por andar em círculos, a amizade também precisa de dois “remos” para chegar a algum lado.
A amizade tal como uma flor precisa de ser regada. A amizade tal como uma ave de asa partida, precisa de um curativo para ser livre, poder partir e voltar.
Na família une-nos o sangue, por vezes, nada mais. Na amizade une-nos a vontade, o querer, os traços comuns de um caminho lado a lado, com as naturais separações que a vida nos impõe.
Mas se for amizade, sabemos, que nos havemos de encontrar...