quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Post.it: O futuro

O futuro foi ontem, e eu estive lá, com todos os desejos, com todas as lutas, com todas as vitórias e alguns fracassos.  Sei como foi o futuro, porque o plantei, porque o cuidei, é verdade que nem sempre é o suficiente para que resulte em sucesso, há elementos que não controlamos, que nos escoam por entre os dedos em rios de vida. E tudo o que idealizámos, de repente segue um rumo diferente ou simplesmente não nos acontece.
O futuro que não se concretiza torna-se passado que arrumamos nos confins da nossa existência. De vez em quando revisitamos essas memórias, abraçamos com carinho aquelas que nos deixaram algumas saudades.
Porém, é uma visita que se quer breve,  para que não nos prenda na análise magoada do que foi, do que poderia ter sido, porque não foi, porquê. Porquê?
Não há resposta, nunca houve, além disso, à porta, o futuro clama por nós, exige a nossa atenção, dedicação, antes que também ele se torne passado repleto de dúvidas, de arrependimentos, de saudades que nos impedem os passos. E depois, como já dizia o meu avô na sua filosofia arrancada à aridez do solo no trabalho de sol a sol,  “o tempo não espera e cada minuto perdido, é um minuto não vivido”. 
O futuro foi ontem, o hoje é a sua materialização e o amanhã a recolha do fruto. Mais doce, mais amargo, consoante o grau de amenidade que caracteriza cada uma das suas moléculas de vida.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Post.it: O silêncio de um abraço


“Tudo o que tem de ser dado soletra-se no silêncio”.
- Então porque continuamos a falar, a questionar?
- Porque ainda não ultrapassamos a surdez do sentir.
Este poderia ser um diálogo, e é. São as questões que me coloco, são as dúvidas que vos coloco.
Se só o vosso silêncio me responder, congratulo-me, é porque ficaram a sentir, a reflectir,  a ter o aprazível encontro com o senso comum algo que sempre tive dificuldade em reconhecer na continua mutação de cada momento humano.
Como humilde ignorante, confesso  que os meus neurónios continuam aos gritos, ambiciosos no seu discurso de perscrutação. É bom querer saber, dizem. É saudável questionar para que se possa evoluir. 
Mas também é magnânimo reconhecer a verdade e o valor de tudo o que não se diz. Sentir que basta simplesmente aquietar o peito, a mente,  deixar que cada pensamento se livre da sua demanda e se permita levemente voar. 
 Para perceber que é naquele silêncio  que o melhor de nós é dado. Quando a oferta de um abraço contem e transmite todo o dicionário de sinónimos de afecto, de carinho, de amizade e amor.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Rimas magoadas

Tinha vontade de escrever,
De reinventar a poesia.
Sentia no peito a crescer,
Rimas de generosa alegria.

Mas parou-se-me a escrita,
Pereceu-me a inspiração.
A escrita já não acredita,
Que algures a escutarão.

Ficaram as emoções magoadas,
Ficaram as palavras ofendidas.
O vento não lhe apaga as pegadas,
O tempo não as torna esquecidas.

O porquê, insiste a memória,
Em repeti-las quando tento.
Risca-las da minha história,
Varre-las do pensamento.

E às emoções que me eram rio,
A expressão “Verbo-de-encher”.
Ficou uma sensação de vazio,
Roubando a naturalidade ao dizer.

Agora, a rima no seu recanto,
Ainda semeia sem primavera,
Flores que não têm o encanto,
Que já tiveram numa outra era.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Post.it: Anestesia

Uma espécie de sono involuntário. Quando nos dizem “conte até 10”, mas só até ao 2 deve bastar. Depois o nada, o vazio, o infinito do espaço, o eterno do tempo. De repente, “roubam-nos um momento de vida, porque ficamos ali inertes, sem possibilidade de animicamente o viver.
“E se não acordar?” perguntam-me. (Maravilha das maravilhas), penso sem verbalizar. Ficar para sempre a sonhar e ninguém saber que sonho, sem o interromper. “Mas e o que fica por dizer, e o que fica por fazer?”. Se não se disse em algum momento, se não se fez em altura alguma, então,  não era para dizer, não era para fazer, nem que nos fosse permitido viver mais 100 anos.
E, confesso, é tão bom ficar anestesiada, nada sentir, nem dor, nem mágoa, nem alegria, nem tristeza.
Mas e se acordar? Se voltar à realidade sem sonhos concretizados? Aos dias de chuva que me inundam o coração? Às noites sem luar que me escurecem os pensamentos? Posso pedir mais um pouco de anestesia? Posso voar mais um pouco? Posso fugir? Posso lá ficar sem ter de regressar?
E o que fica por dizer, e o que fica por fazer? Ora, depois penso nisso. Tenho tempo. Quando voltar. Quando acordar. Quando deixar de sonhar, de acreditar.
Agora, feche os olhos e conte.
 1, 2, 3…

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Post.it: Nascendo

Quem somos? Sim quem somos? Depois de alguns anos, muitos, talvez, já sabemos tudo sobre nós, e às vezes numa falta de humildade, julgamos que sabemos tudo, ou quase tudo sobre os outros.
Mas que sabemos sobre nós, que sabem os outros do que somos? Altos, baixos, gordos, magros, loiros, morenos, brancos, pretos, mas isso é só a forma do “embrulho”, não nos revela, embora em muitos casos, condicione a forma de existirmos. Simpáticos, generosos, bondosos, benevolentes, amáveis, atraentes, francos, leais, persistentes, firmes, convictos lutadores, sim, tudo isto já são características do que somos em qualidades, possivelmente em defeitos.
Mas a verdade é que podemos ser mais, muito mais, coisas que nem nós que há tanto tempo nos “conhecemos”  sabemos. E de repente, por vezes, do nada, surge a revelação, surpreendemos os outros, surpreendemo-nos a nós. E a história, a nossa história muda por completo.
Olhamos para o passado em busca de um indício, lá onde tudo começou, no berço, na infância, na adolescência, nas relações, na solidão. Em algum tempo, em algum lugar, estava lá, não o vimos, não sentimos, ou não quisemos (por medo) sentir. Afinal, apenas queríamos ser “normais”, iguais aos outros, e igualmente felizes como eles. Mas tudo não passou de uma conveniente aparência, ilusão que criávamos não para iludir os outros mas sobretudo a nós.
Não, não era fingimento, como fingir o  que nem sabíamos que éramos? Ou sabíamos, no fundo sabíamos, mas era como que uma mágoa, uma dor fina que não chegava verdadeiramente a doer, uma loucura “pensava”. Disparates da juventude, mas queria, queria muito ser aquele outro que não era, num outro corpo, numa outra alma.
Mas numa torrente impossível de suster por mais tempo, surge, revela-se como um  susto de onda avassalava-me o peito, o desejo de calar um grito que me ecoa na veias. 
Depois, muito tempo depois,  num tempo que nos parece eternidade, uma calma de impotência, tinha de aceitar, de me aceitar. Que há de errado em se ser quem se é? E o que sou! Sim, o que sou? Não sei, vou-me nascendo, de dentro para fora. Um parto doloroso, mais de ansiedade do que de tudo o resto. Na ávida esperança de que um dia, um feliz dia, seja realmente Eu!...

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Post.it: Dá-me...

“Dou-te  para que me dês”, sim é verdade. Não o digo em tom de escondida confissão. Afirmo-o, reconheço-o. Não é egoísmo, não é fraqueza, é a necessidade humana de um feedback.
Pode não ser no agora, nem no hoje em que te dou, mas no amanhã, mesmo que num amanhã que ainda vem distante. Não entendes, dizes que não tens nada para dar, nem sequer dinheiro ou vontade para o comprar. Recebes com medo de um compromisso de reciprocidade, encolhes o gesto da recepção, estendes as mãos semi-fechadas, enclaustras o olhar, cerras o coração.
Mas eu insisto, continuo à tua  porta sem bater, à espera. Numa espera de esperança porque sei que o que me move és tu, a ausência desse sorriso que quero  ver de novo desenhado nos teus lábios.
Se não tiveres nada para dizer, nada digas. Prefiro o silêncio ao “obrigado” frio que obedece ao mero protocolo educacional, ou como reflexo condicionado. Até porque sei, sim sei ou acredito,  que o silêncio não será necessariamente o mutismo dos sentimentos.
Não, não temas, não precisas dar-me nada que exija gasto material, gasto de energia, ou de querer. Dá-me um dia, nesse dia em que o sintas em ti.
Dá-me, preciso de receber, o sol do teu olhar.