sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Post.it: Os nossos finados

Pessoas que fazem parte da nossa história, que definem o ADN da nossa vida. Que a dado momento fizeram connosco um caminho comum, que riram e choraram as mesmas lágrimas. Que se sentaram ao nosso lado, que escutaram as nossas  e partilharam as suas dores. Olhamo-las nos olhos, vimos e sentimos amizade e amor. Confiamos-lhes os nossos segredos, repartimos os nossos medos., histórias, abraços e por vezes, até silêncios. 

De repente, uma ausência, um vazio, uma ferida invisível que nos dói por dentro,  e a sensação que nos arrancaram algo do corpo e que nos faz tanta falta. A razão sabe que partiu, mas o coração continua a senti-la viva, vibrante de emoções. Os olhos ainda a veem em outros rostos, a sua voz continua a ressoar em outras vozes. Mesmo que lhe tenhamos dito adeus, a verdade é que não nos conseguimos despedir. Há sempre algo que fica por dizer, por agradecer. Há sempre tanto que ainda querias em conjunto viver.

Morreu, dizem-nos, mas recusamo-nos a escutar as vozes que te querem levar de nós Não, está viva! Estará sempre viva, guardada em nós,  enquanto a nossa memória te lembrar, enquanto o nosso coração te amar.



sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Esculpir o tempo

Com que paixão.

Pode o coração esculpir.

Com que ilusão.

Pode a alma te definir.

 

Eis que vens.

Brincas comigo.

Aprisiono-te, não te conténs,

Foges, já não me és amigo.

 

Com que mãos, com que arte,

Se ao menos fosses perene,

Seria eterno o meu amar-te.

 

Mas tudo é vento,

Tudo se perde e esquece,

No sopro de um lamento.




sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Post.it: Sem respostas

Gostava de transformar este (sem) respostas em (cem) respostas, porque as perguntas crescem, o medo tornou-se uma nuvem cinzenta que nem a luminosidade do verão afasta e as
 dúvidas confinam as nossas vidas.
Continuamos a perguntar a quem sabe mais do que nós: médicos, virologistas, cientistas, estadistas, ministra da saúde, ao SNS, à OMS…, de onde veio este vírus, quando se lhe porá termo, quando terminará esta Pandemia?  Quando poderemos andar na rua sem medo, sem olhar para os outros como se fossem nossos inimigos. Quantos irão ficar infectados, seremos nós os seguintes. Iremos resistir?  E a nossa família, as pessoas com quem partilhamos o nosso dia a dia também poderão apanhar, ou melhor ser apanhados Covid19? Quando poderemos voltar a abraçar os amigos, a beijar os mais próximos. Quando voltaremos a respirar sem máscara, quando voltaremos a ver sorrisos em cada rosto? Quando poderemos sentar-nos ao lado de alguém nos transportes sem receio de que nos excluam desse espaço. Quando deixaremos de questionar com o olhar cada pessoa que se cruza connosco sobre se será ser ou não portador do vírus? Quando deixaremos de ter limites para entrar nas lojas, nas farmácias, nos eventos desportivos ou culturais?
Quando, quando, quando?
Quantos doentes há neste momento em todo o mundo, quantos ficarão mesmo depois do vírus desaparecer devido a desconhecidas sequelas? Quantas vidas já perdemos, quantas ainda vamos perder?
Quantos e quem serão, avós, pais, filhos, irmãos, tios, primos, sobrinhos, amigos, colegas, conhecidos, novos, menos novos, até quem sabe, nós…
Quantos, quantos, quantos?
Somos pessoas de fé, isto vai passar!
Somos pessoas de esperança, e vamos dizendo aos outros e a nós que vai ficar tudo bem.
Somos pessoas de resiliência, levantamo-nos todos os dias para trabalhar no local de trabalho ou em teletrabalho, vamos continuar a lutar para sobreviver.
Somos pessoas solidárias, que se entreajudam, que concebem medidas de apoio.
Somos pessoas criativas, criamos mil formas de chegar e de nos unirmos aos outros.
Somos pessoas imaginativas, reinventamos formas de ocupar o tempo de forma lúdica e saudável.
Neste momento, enfrentamos a 2ª vaga, aumentam o número de infetados e nós, continuamos sem respostas, mas já vislumbramos algumas certezas, os efeitos negativos deixados como marcas em cada um de nós. Pelos entes queridos que perdemos, pelos despedimentos, pela forma de vida social e económica que modificou vidas.
Um dia, não sabemos ainda quando, teremos  todas as respostas, encontraremos soluções.
Um dia, não sabemos ainda quando, tudo isto será apenas uma ténue recordação.
Um dia, que esperamos, que desejamos seja em breve, tudo isto será uma lição, de como nos adaptamos, de como nos unimos, de como somos capazes de nos tornarmos melhores quando os desafios assim os exigem.
Um dia, acreditamos, Ficaremos bem.


sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Post.it: LAR

Já fiz tantas viagens, já escolhi tantos caminhos, destinos desconhecidos, percorri ruas sombrias, caminhei por avenidas de luz, atravessei pontes, atalhos de pedra, veredas de terra, trilhos de pó, tudo isto andei, só para regressar a casa.

Uma casa de sol mesmo que de vez em quando lunar. Uma casa de paz mesmo com momentos de contenda.

Mas uma casa onde me sentisse inteira, aconchegada, protegida. Um espaço para lágrimas e sorrisos, mas sobretudo um lugar onde pudesse descansar o coração, onde conseguisse contemplar os sonhos e inspirar ares de esperança.

De onde partisse com vontade de regressar. Onde chegasse e me apetecesse ficar. Uma casa onde me sentisse todos os dias bem-vinda.

Ainda que fosse pequena que nela me sentisse grandiosa. Uma casa com paredes da cor de abraços, com um telhado quente como uma manta de afetos. Com janelas revelando o céu e que à noite as estrelas entrassem por elas para me aconchegar o sono. E nessa casa a que chamaria carinhosamente (LAR), Lugar de amor e reencontro.




sexta-feira, 2 de outubro de 2020

O caminho


Tudo se esfuma na poeira do tempo, já não somos cada vez mais transformamo-nos num fomos. Neste chão onde andamos vamos pisando as pegadas de quem veio antes de nós, e aplanando o terreno para os que nos seguem, todos
fazemos o mesmo caminho, unicamente porque não há outro.
É o mesmo planeta, debaixo do mesmo sol, vizinho da mesma lua. Bem podem construir prédios, rasgar avenidas, arrancar as árvores velhas e plantar novas, tenho  a certeza de que a cada primavera, nascem as mesmas flores.
Já quantas vezes me cruzei com aquela papoila. Quantas e quantas vezes cheirei aquela mesma rosa. Há quantos anos ando a despetalar aquele malmequer na esperança de que um dia a última pétala me diga, bem-me-quer.
 Mas todos os anos ele renasce resplandecente de cor, espreguiça cada pétala  e desafia-me com ar trocista a tentar de novo, sabendo antecipadamente que vou perder.
A cada passo há pedras, também elas já velhas conhecidas, feitas de terra amassada com chuva, mar e lágrimas, cristalizadas pelo frio e o calor, moldadas pelo vento.
Cá estão elas no percurso, sendo o caminho que abraçamos ou rejeitamos  e as lançamos em outra direcção. Mas, passados poucos ou muitos anos dá-se o reencontro, tenho quase a certeza que já me cruzei com aquela pedra.
Está diferente, contudo reconheço-a, mais pesada, rugosa, áspera mas, tem algo daquele tempo, a forma como se aconchega na minha mão. Desta vez não a lanço para longe, vou levá-la comigo, não sei se tenho tempo para um novo reencontro, vamos ficar por aqui, cruzando memórias de um mesmo caminho.