terça-feira, 26 de novembro de 2019

Post.it: Volta


Volta, sim volta, espero-te há mil anos de esperança. Preciso de te reencontrar, de rever o teu sorriso desenhando no rosto consternado do tempo a pessoa que conhecia.
Preciso de voltar a escutar as palavras amáveis que sempre tinhas para oferecer. As ideias que te floriam o olhar. Volta, ainda recordo os teus passos dançantes, parecias ensaiar um bailado com músicas que só tu ouvias, mas imagino pela leveza dos gestos, pela coreografia das formas, que eram belas. Mas inaudíveis para quem não tem a virtude de viver os sonhos de olhos abertos, de os encontrar em cada recanto escuro porque transporta consigo uma luz que lhe é própria.
Volta, porque o ar precisa de ser respirado por tal volúpia, para se deleitar na quase embriaguez dos sentidos quando todos eles confluem no mesmo caminho doce e terno  da felicidade.
Porque sim, era feliz, e sabia-o e sentia-o e viva-o dessa maneira. E agarrava-me a ela, antes que a felicidade fosse uma ave de asas abertas em busca do vento para voar. E voou... Se ao menos fosse uma  andorinha…
 Dizem que parte mas regressa sempre. Talvez, haja uma espera que não seja infinita, talvez exista um horizonte que conheça o caminho de retorno. Continuo a pedir volta, volta vida. Tal como eras, com te vivia, volta…



segunda-feira, 18 de novembro de 2019

Post.It: O medo

Hesito, temo dar aquele passo, porquê? Porque há uma consequência, já não se pode voltar para trás,  mudar o caminho. É um corte, uma decisão, um acto que pode mudar tudo, que pode ser um final ou um começo. Pode ser para melhor, se assim fosse, não temeria, iria a correr, ganharia asas, voaria. Mas pode ser para pior, então quero recuar, quero fugir, refugiar-me um abraço, dizer não! Primeiro num sussurro, depois a plenos pulmões.
Mas que sei eu. Temo,  tremo, calo, avanço para o cadafalso desta vida cheia de horizontes desconhecidos, de pequenas mortes, porque sim, morremos por dentro cada vez que decidimos isto e não aquilo.
Há um buraco no estômago, um suor frio que nos desce do rosto, as palavras que querem sair mas sucumbem antes mesmo de nascer. Sento-me no canto mas distante como se me quisesse esconder, talvez se esqueçam de mim e decidam por mim e depois não ponham as culpas se der errado, chamem-me cobarde, aceito as minhas fragilidades, tenho mais dificuldades em aceitar os meus medos. 
Mas às vezes é preciso coragem para sentir medo, quando o medo é apenas uma forma aprendermos a pensar e repensar sem agir de forma irresponsável para mais tarde nos arrependermos. O medo pode limitar-nos, pode conter-nos, pode magoar-nos. O medo pode doer-nos sem causar ferida. Pode ser um abraço aconchegante ou um enleio que nos sufoca depende de nós como o olhamos, como o recebemos, como o ouvimos. Se tivermos medo, convém hesitar, mas nunca devemos deixar de caminhar, mesmo que tenhamos medo de o fazer. “Coragem não é não ter medo, mas de agir apesar de o ter.”


terça-feira, 12 de novembro de 2019

Post.it: Gotas de esperança

Chove no seu olhar, uma ausência e muitas despedidas. É como chuva de Verão, não por ser refrescante mas por chegar fora de época. Quando acreditamos que tudo vai correr bem, que podemos entregar a alma ao merecido repouso, depois de um Inverno rigoroso, do frio, dos vendavais, do calor que se construía, com ramos secos duma árvore a que arrancámos a imponência, a solidez. 
Chove no seu olhar que me habituei a ver reluzente, como um sol que brilha mesmo que o céu desabe sobre a terra, criando rios, arrastando sonhos desenhados na areia da praia. Um sorriso embaraçado aflora nos seus lábios que sempre conheci cheios de beijos, para o amor, para os amigos, para os filhos e para tantos outros a quem não negava esse gesto de espontânea ternura.

Pergunto-me: quem, quando, como, alguém pôde ser a causa desse desespero, dessa mágoa. Esse olhar, sempre tão solidário, tão amigo. Esse olhar que não se deve magoar nem com uma pena de gaivota.
Numa voz magoada que lhe desconheço, ouço um murmurar que tenta ter firmeza, que tenta ser de ânimo: 
- Não ligues para as minhas lágrimas, são gotas de esperança.