sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Post.it: Tempo de Ano Novo


“O tempo perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem, e o tempo respondeu que o tempo tem tanto tempo quanto o tempo tem.”

Quanto tempo temos para brincar com o tempo. Quanto tempo temos para desperdiçar tempo. Quanto tempo temos para adiar o tempo. Quanto tempo temos para esquecer o tempo.
De uma forma displicente diria que temos “todo o  tempo do mundo”, mas a verdade é que não temos tempo algum  para desvalorizar o tempo.
E uma certeza surge-me cada vez mais premente à medida que o tempo passa, (o tempo está em vias de extinção).
Mas o tempo pode ser prolongado, o tempo pode tornar-se infinito na memória, no coração, se o usarmos bem, se o tratarmos com o devido respeito e cuidarmos dele, não como se fosse o último mas como se fosse sempre o primeiro.
Aquele tempo em que podemos recomeçar, para desta vez o tornarmos, quem sabe, melhor.
Agora que o tempo deste ano chega ao seu desfecho, é tempo de reflectir sobre o que se quer fazer com o tempo do novo ano que se anuncia. E a todos os que tiveram tempo para estar aqui e para ler este pequeno texto, desejo que no Novo Ano tenham tempo para viver com felicidade o tempo que o tempo para todos tem.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Post.it: Sorrisos grátis


Hoje há Abraços grátis em Lisboa, bem, não será hoje, porque na ressaca do Natal ando a ler as notícias atrasadas. “Todos queremos ser amados” (Sean Penn), até aquela minha amiga que depois de 25 anos de casamento sente que ainda não foi “recebida” pela família do marido, que as cunhadas fazem um grupinho de cumplicidades e a deixam sempre de fora. Ou aquela outra que depois de ter chegado cheia de expectativas, vai descendo a fasquia quase até ao chão e já se contenta com um simples Bom dia,  que a afaste da exclusão e da invisibilidade. Seremos assim tão carentes? Sean Penn, diz que sim, “Nunca fui amado”. Mas precisamos tanto assim dos outros para nos sentirmos inteiros? A resposta continua a ser psicologicamente a mesma, sim!
Um sim feito de encontros e desencontros, nas curvas e esquinas da vida. Para afastar a solidão, para enriquecer os nossos dias, para fazer a vida valer a pena, apesar da crise económica, do desemprego, ou dos problemas no emprego, dos maus colegas, dos maus transportes, das filas de trânsito, do stress, etc, etc., o chegar a casa, fechar a porta aos problemas:  abraçar, e ser abraçado pela felicidade que nos faz lembrar a razão de existirmos
A grande questão é que isso não acontece somente connosco: contigo, comigo. Acontece também com os outros, com quem nos cruzamos, mas  que nos escapam por entre os dedos, que nos fogem do coração, que andam distraídos, perdidos, no  seu desejo profundo de também eles serem encontrados, e abraçados.
Felizmente que há abraços grátis, quem sabe num deles encontrem/encontremos o amar e o ser amado, ou pelo menos um Bom dia com um sorriso do coração, também ele, grátis.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Post.it: Ele veio para ficar



Ele  veio,  por  entre  as  prendas,  o  Bolo  Rei  e  filhós. Estava no  Pinheiro enfeitado  com bolas, nas luzes  natalícias.  Nas  canções  de louvor, na união das  famílias,  nas  crianças  a  brincar. Estava  nos gestos  de  amizade e de  amor,  nas estrelas de  um  céu  sem  escuridão,  nas  nuvens  que  de  tanto sorrirem  se  esqueceram de  chorar  adiando  a chuva prevista deixando o sol brilhar.
Ele veio, entrou pela chaminé, pelas frestas da janela, pela porta que lhe abriram. E ficou aconchegado em cada coração, aninhado em cada lar rico ou pobre. Ficou para receber o brilho do teu olhar, o carinho da tua voz, o calor do teu abraço.
Permaneceu a teu lado, em cada passo que davas, segurando a tua mão, curando a tua mágoa, incentivando-te a seguir em frente, oferecendo-te a coragem necessária, a vontade de partir e a certeza de voltar.
Ele veio e ficou chama-lhe Menino Jesus, S. Nicolau, Pai Natal. Chama-lhe fé, crença ou esperança. Chama-lhe o que quiseres, ou melhor, não chames, porque ele, já está contigo, ele já está em ti, esse Natal que veio para ficar todos os dias.


quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Post.it: SMS(s) de Natal

Para todos os que me quiseram desejar um Bom Natal, agradeço e retribuo. Não importa o meio, por sms, e-mail, etc, etc. desde que a mensagem chegue com a intenção de levar mais longe o Espírito do Natal.

"Este ano quero uma prenda. Não quero um objeto que nos prenda. Quero um presente, pois é assim que estás na minha vida: Presente e, se não for pedir demais que estejas também no futuro”.

"Pedi ao Pai Natal para te levar toda a minha amizade. Ele respondeu-me que estava demasiado velho para transportar uma prenda tão grande”.

"Este Natal foi cancelado. Eu disse ao Pai Natal que tu te tinhas portado bem e ele morreu de tanto se rir”.

“Que a chama do Natal se mantenha acesa e que os presentes possam ser recebidos todos os dias”.

“Gostava de ser um anjo para te guardar. Um sol para te aquecer. Um luar para te iluminar. Uma estrela para te guiar e um sino para a tua atenção chamar”.

“Já que nesta época se fala em sentimentos nobres, nada mais adequado que valorizar a amizade. Uma mensagem não vale muito, mas a lembrança vale tudo”.

“Nunca desistas de um sonho. Se não houver numa pastelaria vai a outra ou come antes uma filhós”.

“Venho por este meio informar que já me encontro disponível para receber presentes de Natal. Aceito cheques, dinheiro vivo, transferências bancárias, roupa de marca, telemóveis topo de gama, automóveis Maserati, Volvo ou Austin Martin, e até vivendas de luxo. Atenção, não aceito nada da loja dos chineses!”

“Desejo que este Natal seja como a matemática: amigos a somar, inimigos a subtrair, alegrias a multiplicar e tristezas a dividir”.

“Estou a enfeitar a árvore de Natal mas falta-me uma estrela! Lembrei-me de ti”.

“Boas festas (de preferência pelo corpo todo)”.

“Este Natal queria dar-te uma prenda linda, fantástica, imprescindível, maravilhosa, autêntica, mas infelizmente… eu não estou à venda!!!

“Neste Natal não te esqueças da minha prenda e como o melhor da vida são as pequenas coisas. Podes oferecer-me: uma pequena vivenda, um pequeno iate, um pequeno Ferrari…”

“Não penses no passado porque já não o podes mudar. Não penses no futuro porque não o podes prever, não penses no presente porque ainda não o comprei”.

“Esta mensagem não é para aqueles de quem me lembrei, mas para aqueles que pretendo nunca esquecer”.
 

FELIZ NATAL
e
“Que o Natal não seja um dia mas uma vida”.

 

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Post.it: Nada se apaga


“O mar vai apagar as nossas pegadas, mas não o facto de as termos feito”.
O tempo vai apagar a nossa lembrança, mas não o facto de a termos vivido.
O sol vai secar os vestígios da chuva, mas não o resplendor da natureza pela sua passagem.
O Outono vai levar as folhas das árvores, mas não a recordação da sombra que fizeram no verão.
O vento vai desfazer a solidez da rocha, mas não a sua capacidade de resistência.
A noite vai apagar o dia, mas não a vivacidade de cada hora.
A tristeza vai apagar a alegria, mas não a razão que a fez surgir.
A mágoa via apagar a felicidade, mas não a esperança de a reencontrar.
Porque o mar apaga a pegada mas não a areia que a moldou. Porque teremos sempre a vida presente em nós, no sol que nos ilumina, na chuva que nos faz renascer, nas sombras que nos refrescam o verão, no vento que nos leva algo mas que nos restitui coisas novas, no dia que adormece na noite, na tristeza que apenas antecede a alegria e na mágoa que nos ensina a receber de coração aberto, cada novo momento de felicidade.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Post.it: Estrela do Natal


Eu sei que és uma pessoa muito ocupada, que tens muitas solicitações. Que tens uma vida muito preenchida. Que queres chegar a todos mas não que consegues. Que mesmo quando não tens tempo para mim, não me esqueces.
Sei de tudo isso, mas hoje, só hoje. Só hoje que todos os corações estão mais abertos a acarinhar outros corações. Hoje que todos os abraços crescem para neles caberem todos os amigos.
 Por isso hoje, só hoje, peço-te apenas que me ofereças, um pensamento e sei que com ele acontecerá a magia do afecto, sei que esse pensamento se elevará numa corrente de energia, que chegará ao céu e que criará nele uma estrela especial, porque será feita de amizade, de carinho, de paz.
Mesmo que nesse dia não possas estar a meu lado, que não te possa ver nem escutar a mensagem desse pensamento, sei que ao abrir a janela o vou encontrar nessa estrela.
Como a distinguirei de todas as outras? Será fácil, porque ela é a mais bela, a mais cintilante, a mais luminosa de todas as estrelas do firmamento.
Acredita que o meu coração vai agradecer reconhecido esse pensamento transformado no melhor presente que poderia obter de ti, Pai Natal. 

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Post.it: O chique e o choque


Como me enjoa ouvir certas expressões de “moda” ditas num tom anasalado. Mas relativizando lá vou brincando com essas “dondoquices” e referindo que também falo num tom chique desde que fui operada ao nariz.
 A verdade é que me irrita solenemente ouvir o vocabulário que impera na boca de pessoas que querem, porque querem, sentir-se enquadradas num determinado grupo social. Lá compreender, compreendo,  porque ninguém gosta de ser socialmente um “excluído”, mas sinceramente este tipo de atitude dá-me alguma “alergia nos neurónios”.
Então fingem-se ricos, novos-ricos ou meramente pobres envernizados, mas pouco polidos.
Vou escutando aqui e ali, um “ror” de palavras sem sentido. Outro dia fiquei surpreendida ao ler a crónica de um famoso escritor da nossa praça, usar com ligeireza a expressão “ror” que me causa horror pela anulação do “h”. Mas depois lembrei-me que o tal escritor, também devia ser chique e relevei.
Enquanto isso lá  vão também “comendo” os r(s), tratando-se por queridas, e por meninas enquanto os filhos chamam tias às mães da amigas, sem contudo não terem nenhum laço parental além disso são exageradíssimas em tudo.  Quanto aos “r(s) omitidos, não entendo qual a razão, talvez não seja considerada  uma consoante chique no nosso alfabeto, mas a verdade é que a sonoridade  confere-lhes um modo de falar à bebé. “Hoje quando ia pa casa encontrei a Maria, estava um ror de magra. A menina  não imagina como ela está, envelheceu mil anos!”
Este foi o diálogo que escutei numa rua chique da capital. Ri-me por dentro e pensei, “imagino a inveja que a menina não deve ter sentido”, mas tenho a certeza de que ela me iria logo responder, “Credo! Eu? De todo…”
Já pensei seriamente em procurar uma gramática de português com vocabulário chique, para me manter actualizada. Mas depois de começarmos a escrever em “brasileirez” será que ainda  vamos ter sacrificar mais a língua pátria?
Quantos dizem que a língua portuguesa é “traiçoeira”, quando me parece que é cada vez mais “atraiçoada”…

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Post.it: Tudo desaparece

O querer, os sonhos, desejos, a esperança, a exigência, a crítica, o orgulho, a arrogância. Os gestos, as palavras, o que lemos, o que escrevemos, o que ouvimos, o que vemos, os hábitos, os vícios. A espera, a demora. A ausência, a solidão. O nome, a roupa, o cheiro, a voz, as lágrimas, as gargalhadas, os silêncios, a revolta, as discussões, os medos, os ganhos, as perdas, as fotos, as lembranças, o ar que respiramos. Tudo, tudo desaparece, talvez por algum instante mais permaneça uma energia, um rasto de nuvem derramada pelo azul do céu, depois, depois apenas o esquecimento. Que alguns não querem esquecer, outros não querem lembrar.
Mas enquanto a vida nos pertence, cada madrugada, cada pôr-do-sol,  podemos sonhar, podemos desejar, lutar, conquistar, perder, ganhar, rir, chorar. Amar, Amar? Sim, quem sabe amar. Fazer o que não foi feito. Mudar o rumo, seguir em frente. Rescrever a nossa história, um novo passado, no presente que dentro em breve será ontem.
E apreciar cada instante, cada sopro de vento. Agradecer cada Primavera, mesmo que não tenha flores. Cada Verão mesmo que chova. Cada Outono, mesmo que as árvores não tenham folhas. Cada Inverno mesmo o seu gelo nos magoe o coração. Seremos gratos por cada dia, feliz por cada noite. Reconhecidos por tudo e por todos, os que estão e os que já partiram.
"A certeza de que um dia tudo desaparece dá-me a feliz expectativa de que ainda estando aqui posso, quem sabe, adiar um pouco mais, prolongar por um pouco  mais, a minha existência em ti".

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Post.it: O tempo do coração


O tempo passa, passa connosco, passa por nós. Leva-nos consigo, ou deixa-nos para trás. E mesmo quando o queremos parar, suspender, adiar para um momento melhor. O tempo prossegue alheio aos nossos desejos. Vai deixando em nós abraços que ficam no corpo, beijos que nos amaciam a pele, brisas que esculpem doçura no rosto. E um eco, que nos chama e incentiva a prosseguir o caminho. É um tempo que nos é exterior, que vai caracterizando os nossos dias, os nossos anos, que vai escrevendo na vida, a nossa história, a nossa permanência, a nossa passagem.
Mas dentro do peito, o tempo é imutável, permanece sempre idêntico, aconchegando o coração, amadurecendo-lhe os sentimentos, desenhando-lhe moléculas de esperança, e deixando fluir células alento. O coração não sente os dias marcados pelo decorrer mecânico dos ponteiros do relógio ou pelo despertar e adormecer do sol.
O coração marca o seu compasso pelo palpitar da vida que o faz acreditar que antes que a última badalada lhe soe na alma encontrará uma razão para ter permanecido sereno e guardião de um querer que um dia sentirá reciproco. Quando vai ser? O coração não questiona, continua a bater, continua a sonhar, continua a esperar. Porque para o coração não existe tempo.
 E mesmo que esse tempo corra lá fora, que o verão com o seu calor abrasador lhe  queira derreter a firme vontade, que o gelo do inverno o queria congelar, que a chuva o queira levar nos seus rios de esquecimento, nada pode apagar da memória do coração o nome daquele outro que ficou inscrito no ADN do seu  viver.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Post.it: Bússolas


Há pessoas que são como uma bússola, indicam sempre o “norte”, seguem sempre numa direcção, a sua direcção. Alguns dirão que o fazem por teimosia, por incapacidade de seguir para “sul”, por medo de escolher o “este”. Mas eu admiro-as, porque elas têm uma certeza inabalável de que aquele é o seu caminho. Pode não ser isento de mágoas, pode estar recheado de derrotas, mas não desistem de lutar, porque têm um objectivo, uma certeza, um fé. Porque só com fé se atravessam mares de lágrimas sem se afogar nelas. Só com fé se erguem depois de cada queda. Só com fé não cedem aos convites de seguir por caminhos aparentemente mais fáceis mas que se revelam incapazes de nos levar até onde queremos ir. Admiro estas pessoas, porque têm um rumo a seguir, uma missão a cumprir, uma verdade que é sua e uma coragem que, não sendo invencível, supera as batalhas perdidas, erguendo-se todas as vezes que forem necessárias e prosseguem no mesmo destino com a certeza de que é o seu.
Depois há os outros, os que vivem sem “norte”, que saltitam de direcção a cada entrave, que buscam a felicidade a “sul”, que se dirigem para “este” ``a procura de um pouco de estabilidade, mas já o vento de “leste” os impele para “sudoeste”. A sua “bússola” permanece inquieta, porque não encontram um magnetismo que as prenda em terra firme, qualquer brisa as empurra, ora para o “céu” ora para o “abismo”.
Suponho/espero que também elas um dia encontrarão o seu “norte”, a sua força, a sua fé e possam deixar de procurar na distância esse lugar que está algures, tão perto…

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Post.it: Mulher moderna...


“Sou uma mulher moderna” diziam os seus lábios com um sorriso, mas de olhar triste. “Sou uma mulher moderna”.  insiste em dizer-me.
“É verdade que o sou enquanto acendo o computador na sala enrolada num cobertor, onde enrolo a solidão, enrolo o silêncio. Sou uma mulher moderna” Repete como se quisesse convencer dessa verdade sem que isso a magoe. 
“Porque o sou, quando clico no teu nome e te deixo invadir a minha vida, com frases, com imagens. Fazes-me rir, mas também chorar”. 
Fazes um silêncio, aposto que estás a tentar pensar que és uma mulher moderna mesmo quando vives as emoções apenas através de um monitor.
Já não pede mais do que isso, habitou-se. Como ela diz, num to de voz que não me convence. “Primeiro estranha-se, depois entranha-se. Afinal pode ver o rosto dele através de web câmera. Meio desfocada, é verdade, mas  imagino por momentos que está em Marte e que por isso, só por isso não o posso receber na minha sala, embrulha-lo no meu cobertor…” 
“Escuto a sua voz, apesar de me soar diferente, de serem audíveis algumas notas desafinadas pela tecnologia. Reconheço a sua voz, cada vez com maior dificuldade, apenas com o esforço rebuscado da longínqua memória.”
Olha-me com o olhar vazio, vazio de esperança, encolhe os ombros e aceita essa realidade que passou a ser a sua. “A única possível” diz, sem acreditar muito nisso.
“Além disso, sou uma mulher moderna, posso muito bem  habituar-me à ideia de que a distância não existe, que o afecto navega através de cabos, que desliza na fibra óptica, que voa até aos satélites vizinhos das estrelas e que depois de toda essa viagem, entra-me  de mansinho no coração.
 Já não bate à porta como antigamente, já não faz serenatas na janela, entra simplesmente quando carrego num botão. Mas continua a ser amor, o amor de uma mulher moderna.”
Com um coração “à moda antiga”, quero dizer-lhe, mas não digo. Ela também o sabe. Sabe que para além do “ver” tem saudades do “sentir”. Precisa sobretudo de ter uma  vida real que lhe preencha o vazio que fica dessa realidade virtual. 

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Post.it: O menino que brincava com o olhar


Brinca com o olhar e das nuvens faz histórias, transforma-as em casas, em carros que passeiam no céu, em animais que se vagueiam no azul celeste. Nos dias de inverno o céu encoberto obriga-o a compor outras fantasias, então desce o olhar e encontra nas árvores novos amigos.
Das folhas caídas faz desenhos, que o vento como se fosse um menino mal comportado desmancha num sopro. Mas depressa fazem as pazes e o vento mais calmo devolve-lhe as folhas roubadas depois, em conjunto fazem novas construções. Com as pedrinhas faz caminhos que o levam para um local onde brincar é obrigatório e todos os meninos têm brinquedos coloridos, que ele não tem. Por uns instante um brevíssimo instante, uma tristeza quer invadir-lhe o olhar.
Mas a brisa rapidamente dissipa as nuvens cinzentas e o sol volta a brilhar. O  vento bate-lhe na janela.
– Vamos brincar?
– Sim, vamos, mas brincamos a quê?
– Eu esculpo com um sopro aquela nuvem e tu adivinhas o que ela representa.
– Está bem, podes começar. E assim o menino que brincava com o olhar continuou a voar na sua imaginação e a partilhar uma amizade com o vento. Porque mais importante que ter brinquedos é preciso saber brincar, mesmo que seja apenas com o olhar e a fantasia.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Post.it: Um Natal sem "presentes"


Se eu me tivesse portado bem durante o ano, neste Natal o Menino Jesus certamente me traria todos os presentes que desejo. Se eu me tivesse portado bem durante o ano, não precisaria de pedir porque certamente teria esses presentes conquistados.
Mas reconheço que pensei mais em mim, que estive sempre demasiado ocupada para ti. No entanto, bastava um telefonema, um e-mail, ou até uma pequena sms e neste Natal receberia de ti um sorriso luminoso.
Bem sei que adiei os nossos encontros, as nossas conversas de café, escondi-me nas minhas dores para não escutar as tuas. Quando bastaria uma tarde de sábado, de domingo, de um dia qualquer, afinal o anos tem tantos. E neste Natal teria a tua presença na minha festa, na minha vida.
Quantas vezes te deixei para amanhã e esse amanhã nunca chegou. Claro que tinha razões, sempre as mesmas, a falta de tempo, mas no fundo são apenas opções que se fazem e eu fiz as minhas. Por isso neste Natal não faço parte das tuas escolhas para partilhares comigo o teu Natal.
E a ti que não fui visitar quando estavas doente, quando estavas carente de um abraço? Porquê? Nem eu sei. Sei apenas que fui desejando que melhorasses mas não participando nessas melhoras. Por isso neste Natal não vou receber o teu abraço caloroso, aquele que ficaste à espera que eu te desse.
Neste Natal não vou receber presentes, por causa da crise. Essa crise que por vezes invade os sentidos, uma crise de esquecimento, uma crise de indiferença, uma crise de egoísmo.
Não me portei bem este ano, por isso não me posso queixar da crise de carinho, da crise de solidão que vou sentir neste dia. Neste Natal em que o meu pinheiro não vai estar enfeitado com luzes de esperança. Pela minha chaminé não vão entrar “presentes” de afeto. E todas as melodias de Natal se vão calar ao passarem à minha porta.
Não posso voltar atrás no tempo, não posso mudar o passado, mas posso prometer ao futuro que vou tornar todos os dias um permanente Natal, com presentes de amizade e amor para que no próximo Natal a minha árvore brilhe de sorrisos. 

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Post.it: Cabelos brancos


Ainda me lembro de te ver no rosto liso, um olhar terno, um sorriso luminoso emoldurado por uns cabelos negros que dançavam permanentemente ao vento, mesmo quando não havia vento. Surpreendia-me sempre esse esvoaçar. 
Então imaginava que não caminhavas, que flutuavas com  rapidez, essa rapidez que te impunhas para generosamente responder aos meus apelos infantis.
O tempo passou e eu nem percebi, por isso não me lembro quando os teus cabelos começaram a ficar raiados de branco, de imediato imaginei que eram pipocas a saltar em cada fio. E de repente, como que num passo de magia, todos os teus cabelos ficaram brancos como se um manto de neve os cobrisse. 
Estremeci, assustei-me com aquela imagem, mas o teu rosto que já não é liso revelou-me o mesmo sorriso, o mesmo olhar terno e ofereceu-me aquele abraço quente que reconheceria único no meio de muitos outros. 
Com o peito inquieto perguntei, pintaste os cabelos? Com voz cantante na memória dos meus embalos, respondeste, “Não os “pintei”, pintou-mos a dor”.
Então chorei baixinho e de imediato, amei-os.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Post.it: Coisas da manhã


Já ouço a madrugada a cantar canções de alvorada. Já ouço o sol a espreguiçar os seus raios. Já ouço o bocejo das estrelas ensonadas de uma noite inteira a cintilar. Já ouço as horas na sua marcha compassada, trazendo atrás de si o ponteiro  saltitante dos segundos que querem, porque querem,  apanhar os pachorrentos minutos.
Já ouço o rio que parece mais feliz no despertar de mais um dia. Já ouço os pardais chamando os amigos para irem brincar e fazerem, o que fazem os pardais? Pardalices, responde prontamente o meu sobrinho que já soletra o b,a, ba e por isso se sente um mestre no conhecimento da natureza. “Pardalices”? Aceito. 
Já ouço na rua as crianças que saltitam na sua felicidade infantil de quem não tem ainda obrigações, e pode continuar a fazer o que sabe “criancices”, adianto-me ao meu sobrinho que já abria a boca para dar um ar da sua graça. Então rimos, sem saber porquê e abrimos a porta de casa para entrar definitivamente no dia que nos espera lá fora,  antes que a noite regresse com a sua negritude e nos faça pensar, “tolices”...



terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Post.it: Dezembro mês do Natal


No calendário os dias sucedem-se constantes, terminam as férias e de repente num aparente salto cósmico já visualizamos o mês de Dezembro,  a chuva, o frio, mas também a lareira ou o cobertor que nos conforta como se fosse um amigo sempre disponível.
Mas Dezembro tem mais, muito mais do que isso, tem aniversários,  o pagamento do seguro do carro, o subsídio de Natal (ou talvez não) e claro o Natal e Final de Ano. Mas falemos do Natal, já nos imagino a contorcer num desconforto que não sabemos ou não queremos explicar. 
Por outro lado encontro nas crianças uma reacção completamente oposta. Um sorriso radioso, um novo brilho no olhar e em saltinhos irrequietos lá vai perguntando, “o que me vais dar no Natal?" “Compras-me aquele brinquedo que vi na televisão?”. A sua felicidade magoa-nos, por mais que nos queiramos esquecer e afastar deste momento a sombra da “crise”, não conseguimos, ela espreita-nos em cada canto da nossa vida, no emprego cada vez mais precário, nos direitos que nos são sonegados, nas obrigações que nos exigem, mas também nos magoa não conseguirmos corresponder às expectativas daquele pequeno ser que deposita em nós a confiança de um Natal repleto de sonhos concretizados.
Os dias encurtam a distância e o calendário já não nos oferece a surpresa diária que recebíamos quando abríamos o quadradinho e descobríamos nele um pequeno chocolate, prelúdio de uma festa que se anunciava feliz. Agora cada dia perscrutamos no túnel que se adensa uma solução que não nos surge e no entanto, quando o peito se aquieta, podemos descortinar lá bem no fundo uma pequena luz. 
Então começamos a perceber que o Natal se sobrepõe ao sentido material que lhe conferimos. Que o Natal é sobretudo um estado de espírito,  que Natal significa nascimento e que em nós devia significar renascimento da esperança. 
Porque o Natal deve ser vivido no coração e repartido em amor por todos à nossa volta. Afinal o amor não custa dinheiro, os abraços são grátis, a alegria não paga imposto e a amizade presente vale mais que uma ausência repleta de presentes.
Então sento-me no chão da sala e se neste Natal não existirem brinquedos novos, vamos brincar juntos com os velhos, criando com eles novas histórias.



segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Post.it: Fernando Pessoa

Foi dia 30 de Novembro, mas nem sempre a memória está em consonância com a lembrança, essa lembrança que queremos viva, antes que a memória a apague.

“Morrer é difícil, mas consegue-se”,  esta  ironia de Ernest Jünguer tem um fundo de verdade, “porque às vezes, não se consegue…”
Quem pode calar estas palavras que dão sentido ao caminhar? “Às vezes ouço passar o vento; e só de  ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido”. Quem pode silenciar na infinitude do tempo, esse poeta que “é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor. A dor que deveras sente”. Ou apagar da memória que nos embala e faz crescer  sem deixar de sonhar porque “Matar o sonho é matar-nos. É mutilar a nossa alma. O sonho é que temos de realmente nosso”.
É esse sonho que nos permite avançar no mundo, ter pensamentos, “que se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens”.
Um  “Amor, quando se revela. Não se sabe revelar. Sabe bem olhar para ela. Mas não lhe sabe falar. Quem quer dizer o que sente. Não sabe o que há-de dizer. Fala, parece que mente. Cala, parece esquecer”.
Morrer é difícil quando a sua herança literária continua no nosso coração pátria. “ò mar salgado, quanto do teu sal. São lágrimas de Portugal. Por te cruzarmos, quantas mães choraram. Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar. Para que fosse nosso, ó mar”.
E sempre essa mensagem, terna e profunda que nos fica a acalentar os sentidos, e a pergunta é latejante no peito será que vale a pena?
A resposta vem pronta e repleta de sentido:
“Tudo vale a pena. Se a alma não for pequena”

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Post.it: Voltarei


Se me esperares, voltarei. Sei que voltarei.
Não sei quando mas a tua espera me chamará.
Mas tens de me esperar com muita coragem.
Tens de me querer com toda a força.
Como se abraçasses o calor do sol,
Sem nunca teres medo de te queimar.
E mesmo que a chuva traga alguma tristeza.
Mesmo que a neve te queira gelar o coração.
Não permitas, um dia a neve vai derreter.
A chuva também deixará de cair.
O verão triunfará sobre o frio inverno.
E uma nova primavera vai renascer,
Cheia de flores, cheia de esperança.
Espera até esqueceres o passado,
Porque eu vou voltar para fazer o futuro.
Tu sabes que voltarei porque me conquistaste.
Porque não duvidaste de mim um só instante.
Não receies que nesse encontro não me reconheças.
Porque já nos encontrámos muitas vezes.
Tantas quantas as que de ti parti, mas voltei sempre.
Sempre que chamaste o meu nome,
Felicidade.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Post.it: O mar que somos


Todos os mares são uma simples gota de água no cosmos da vida. Da nossa vida, repleta de rios, de lagos, de mares tempestuosos mas também de momentos de feliz bonança.
São mares que nos navegam em contínuas ondas que nos levam na corrente do destino até praias de um suave areal, ou a rochas que temos que escalar com um esforço que parece superior à nossa capacidade humana. 
Mas chegamos lá, porque é para lá que temos que ir, com dificuldades mas com empenho, com exigência mas também com coragem. E o mar a correr-nos nas veias em células ondulantes que nos impelem a tomar determinada resolução. 
Quantas vezes tentamos lançar âncora, aninharmo-nos numa enseada, amarrarmo-nos naquele cais. 
Mas o mar balouça-nos na alma, e as vagas arrastam-nos os sentidos. É tempo de partir murmuram-nos as marés. É tempo de seguir em frente insiste cada gota de oceano com provocantes salpicos.
Conseguirá a vida resistir aos apelos marítimos? Talvez, durante algum tempo. O tempo suficiente para que um novo mar navegue o nosso universo. Esse universo composto de cada gota de água que nos chora e nos ri dentro do peito preenchendo o mar de que somos feitos.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Post.it: Simplificando a questão


Às vezes, ao escutar a conversa das crianças, questiono com  alguma nostalgia, por onde se perdeu a singeleza das palavras e das ideias mais puras? Quando começámos a compor verdadeiros enredos de uma curta-metragem para a mensagem que queremos transmitir? Porque criamos tantos argumentos para explicar o óbvio? Porque caminhamos em círculos quando a recta sempre foi o trajecto mais curto?
Devíamos reaprender com as crianças a fórmula mágica de dizer o que sentimos e dessa forma chegarmos directamente ao entendimento que desejamos, sem discussões, sem falsas modéstias, sem indirectas. Explicamos e voltamos a explicar sem no entanto conseguirmos chegar ao âmago da questão. Na maior parte das vezes não se trata de uma questão profunda, de resolução difícil, mas complicamos o simples na tentativa falhada de a tornar mais clara e evidente. Evidente para quem? Para nós, sem dúvida alguma, porque para o nosso interlocutor cada explicação só gera mais confusão.
 Ossos do ofício dirão os professores, habituados a ensinar. Raciocínios fundamentados dirão os filósofos, habituados a divagar. Tudo em prol da justiça e da verdade dirão os advogados, habituados a arguir. Ou simplesmente os teimosos, convencidos, em suma, chatos, habituados a impor as suas ideias que já ninguém consegue ouvir. Porque não é a sua verdade, porque não é a sua opinião, porque não entendem, porque não são entendidos.
Então, caímos num silêncio magoado, já nada conseguimos dizer, já nada queremos escutar.
Olhamos para as crianças, num misto de surpresa e inveja, porque elas com um vocabulário reduzido conseguem atingir o seu objectivo, conquistar a sua meta, sem violência, sem gritos, sem lágrimas. Como? Questiona a nossa mente formatada pela condição de adultos. Talvez com um sorriso, um encantador sorriso que nos diz tudo o que o coração precisa de saber.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Só o hoje existe


          Hoje, só por hoje
          Vou estar calma, Não me vou preocupar.
          Vou ser tolerante, não vou criticar.
          Hoje, só por hoje
          Vou honrar o que sou e a vida agradecer.
          Vou ser aplicada em tudo o que fizer.
          Hoje, só por hoje
          Vou respeitar toda a natureza.
          Reconhecendo a sua eterna beleza.
          Hoje, só por hoje
          Não vou desperdiçar cada momento.
          Não vou sucumbir ao triste lamento.
          Hoje, só hoje
          É o tempo que tenho para viver.
          É o tempo que tenho para ser.
          Porque o ontem já passou.
          E o amanhã ainda não chegou.
          Uma certeza subsiste,
          Só o hoje existe…


segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Post.it: O impossível em mim


Somos uma eterna procura, de caminhos, de sensações, de metas, de sonhos, de desejos, de felicidades, de saudades. E nessa busca em que por vezes nos perdemos, perdemos o sentido do que somos, porque é a nós que procuramos. 
Cansados de nos encontrar através do olhar dos outros, que nos vêm de forma diferente do que nos sentimos. Não, que nos julguemos perfeitos, mas talvez não tão imperfeitos como nos pinta cada olhar critico, desejosos de que correspondamos ao seu ideal e, sempre que tentamos, ficamos muito aquém, frustrados pelos outros, decepcionados por nós, nessa tentativa inglória de sermos muito mais do que somos e longe, tão longe do que precisam do que sejamos neles.
Porque não nos aceitam como somos? Porque não nos desenham no peito um  esboço de carinho? Para que nele nos revejamos e nos reconheçamos. Talvez porque também eles procuram sem encontrar algo que lhe preencha uma parte incompleta do seu viver. Será que é a nós, tal como somos que buscam? 
Enquanto eu apenas sou o que o impossível cria em mim. “Não sou o outro, sou qualquer coisa de intermédio: Pilar da ponte de tédio que vai de mim para o outro” Essa distância que nos medeia na liberdade do ser. 
Esse intervalo em que nos encontramos, em que nos conhecemos e aceitamos na igualdade e na diferença de cada impossível que eu sou e que tu és.


sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Post.it: Sweet memories


São mais que saudades, são maresias que nos embalam os dias. Lembranças, são pedacinhos de nós que nos semeiam no peito e vão tornando mais sólida a nossa vida. Os que vêm, os que vão, por vezes com uma efémera questão.
“Que ficou de mim em ti? Não sei. Talvez o murmures nesse sopro de vento que não entendo, na dança das folhas cujo significado não alcanço, no cantar dos pardais que não compreendo, no som melodioso do rio que não apreendo.
Fica-se-me a pergunta sem resposta concreta e a esperança de que nem tudo tenha sido em vão. Que em cada pessoa que conhecemos, que recebemos e deixamos partir, nos leva na lembrança como se fosse uma asa de infinito que voando se liberta da linha redutora do horizonte. Não tenho a desmesurada pretensão de me tornar  uma lembrança duradoura, basta-me um segundo, aquele segundo que nos faz sentir um lampejo de luz mesmo que depois se apague no fechar de olhos, sem nunca voltar a surgir.
Que ficou de ti em mim? Um pouco de mundo, do teu mundo, aquele em que entrei, ou melhor espreitei com vontade de entrar, de conhecer e partilhar. Esse universo que tu és, de emoções, sensações, de harmonia e conflito, de alegria e tristeza, amargura e ternura, gotas de mar, raios de sol.
O que ficou de ti em mim foi a lembrança, longa ou finita, porque o tempo é apenas o caminho do nosso viver acontece e eu, sinto que me deixaste naquele instante, o coração abraçado pelo laço profundo de um sonho, que nem cheguei a sonhar”.
Mas ficam sempre as “memories, pressed between the pages of my mind. Memories sweetened thru the ages just like wine. Memories, memories, sweet memories” a ecoar na voz intemporal de Elvis.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Post.it: Um domingo perfeito


O inverno já espreita na janela numa chuva copiosa, talvez com saudades de um verão que se despediu precocemente. O vento bate furioso na porta como se tivesse pressa para entrar em busca de um Outono brincalhão que se esconde por entre as folhas das árvores. Quase cedo à tentação de  o abrigar , de o proteger desse Inverno que nos quer entrar pela vida a dentro, afinal ainda estamos em Novembro, e cada estação no seu tempo, penso com um sorriso maroto enquanto me instalo no sofá. Sabia-me bem uma lareira acesa, mas vou ter de contentar com um cobertor quente. Sabia-me bem um chocolate a escaldar mas esqueci-me de o comprar, por isso vou ter de me contentar com um chá menos confortante mas que dá para enganar o corpo febril.
Sabia-me bem abrir um livro e sentir-me acompanhada por uma bom e clássico romance, mas já li e reli todos os livros da minha estante, além disso não conseguiria ler com os olhos lacrimejantes, o pingo no nariz e esta tosse que não me dá tréguas. Aborrecida, acendo a televisão, desligo-a logo de seguida, não me apetece ver contínuas repetições.
 Por um momento, um rápido momento quase que me deixo levar por um rio de queixumes prestes a correr-me do peito.
Mas decidida a não me deixar abater por meros pormenores, resolvo tornar o meu domingo perfeito, agradeço o conforto do meu humilde lar, a companhia reconfortante de um cobertor, um chá fumegante e de Chopin a encher de poesia musical cada recanto da minha sala, sim porque nenhum domingo de quase inverno é perfeito sem Chopin.
Quando o domingo anoitece sinto que apesar da constipação, apesar do frio, da chuva, da ausência de um chocolate quente, de um livro, de um filme na televisão, foi um domingo perfeito.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Post.it: Desde o primeiro fôlego


Podemos dizer adeus mais de uma vez. Tantas quantas o coração o permitir. Tantas quantas o rumo da nossa vida o conduzir. Tantas quantas os desencontros o redefinirem. Tantas quantas as venturas nos levarem para novos futuros, novos projectos. Mas o que nos define é o antes desse adeus, antes de partir, de mudar, de começar ou recomeçar. Porque é mais cómodo ficar, porque é mais seguro permanecer, porque temos medo do desconhecido, adiamos, protelamos a vida numa gaveta onde escondemos os sonhos, por medo de os sonhar. Estreitamos os objectivos, dilatamos as metas. Esboçamos um sorriso quando nos lembramos do tempo em que desejávamos tudo para ontem, quando ambicionávamos que tudo acontecesse no hoje. Quando podíamos deixar para amanhã. Porque havia sempre um amanhã, esse que se estende num tempo, que se derrama sem termos dele percepção.  Encontramos cada vez mais requintadas formas de conformismo. Até que num momento, num impulso de arrojo, abrimos a gaveta e permitimo-nos sonhar de olhos abertos.
Porque nesse dia descobrimos que podemos dizer adeus mais do que uma vez, mesmo quando dizer adeus nos magoa. Uma dor que nos ensina a suplantar cada obstáculo. Tudo passa, sussurra-nos o vento dançando nos nossos pensamentos, acariciando-nos os sentimentos. Tudo passa, porque somos feitos de tempo, de coragem, de alento. Do primeiro fôlego ao último suspiro.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Post.it: A mente e o mar


A mente é complexa, umas vezes é mar outras vezes é rocha. Mas quando o mar se rende à rocha. Mas quando a rocha se rende ao mar. Surge um instante de magia em que a razão, escuta a voz do coração. E para cada pergunta há uma resposta certa. Para cada dúvida, uma certeza. Para cada problema, uma solução. Para cada escuridão, uma luz. Para cada procura, um caminho.
Mas a mente é complexa, o mar tem tempestades e a rocha é majestosa na sua rigidez. Só quando a onda embala a rocha. Só quando a rocha abraça o mar na sua enseada, há um momento, em que num ápice de encantamento, a paz e a harmonia geram no ventre do infinito, uma semente de felicidade.
Então o mar rejubila em vendavais de ternura, então a rocha por entre as grutas, ecoa múrmuros de alegria.
A mente é complexa, mas de vez em quando consegue, unir o desunido, torna possível o impossível e o sonho em realidade…

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Post.it: O livro antigo


Queria-vos falar do Livro, não do seu conteúdo  enquanto veiculo transportador de um texto, mas do livro como objecto histórico. Porque ele é muitas vezes isso mesmo. Hoje quando, “passeamos” o olhar pelas estantes de uma livraria, somos atraídos por um titulo, um autor, uma capa colorida. Mas no passado, o Livro antigo (obras que datam de 1501-1800), tornava-se ele próprio, história. Porque encontramos nele a história do seu caminho, do seu crescimento. Parece-nos estranho compreende-lo assim, mas é verdade o livro também cresce ao longo dos anos na informação que fica registada nas suas páginas. Desde o “nascimento” do livro no Escriptorium de um convento, passando pelo gráfico, um trabalhador ambulante que andava de terra em terra, procurando alguém que com algum poder económico lhe encomenda-se a confecção e reprodução de uma obra. O gráfico que sem oficina ainda e  com parcos conhecimentos literários, revelava vastos conhecimentos da sua arte, para colocar os caracteres móveis na forma inversa que depois iriam surgir direitinhos na grande folha de papel que dobrada em diversas partes iria constituir um caderno, sem trocar a ordem natural do texto, porque raros eram os livros desta época que tinham paginação. Cadernos que permaneciam assim para serem vendidos, sem serem cozidos, ou encapados. Cabia a quem o adquiria encomendar uma capa, mais rica ou mais pobre, em pergaminho, pele,  ou tecido, com brasão incrustado a ferro quente ou letras em fio de ouro. Quando o folheamos, estes detalhes surgem silenciosos à espera de uma observação e lenta atenta, minuciosa, e porque não, carinhosa. O texto, esse, talvez seja supra conhecido pelas diversas reimpressões, mas aquele exemplar que nos veio parar às mãos, é único, tornaram-no exclusivo pela riqueza de pormenores. Alguns quando lhe colocaram a capa acrescentaram mais um caderno com 12 dobragens correspondendo a 24 páginas em branco, isto desperta-nos a curiosidade, mas a resposta surge-nos evidente, o possuidor desse livro, quis acrescentar a sua opinião sobre a obra, inspirar-se nela para os seus escritos ou torna-lo um diário dos seus desabafos. Alguns fazem-nos sorrir pela cortesia, ou pelo tom irónico. Com que mágoa, com que delicadeza viramos cada página, encontrando aqui e ali marcas da sua vivência, assinaturas, dedicatórias, manchas de (lágrimas?) de (risos?) de velas que o iluminaram nas longas noites em que fez companhia à solidão. Páginas com texto desgastado de tão lido, de tão sentido.
E o livro de hoje? Pouco nos diz, apenas é portador de um texto literário. Tem um percurso de vida tão curto, tão desvalorizado, abandonado, lido e esquecido. Poucos lhe acrescentam algo para o futuro, talvez uma assinatura, uma mera rúbrica.
 Poucos os levam até às próximas gerações. Sem a durabilidade de materiais que tinha o livro antigo, perece depressa e sem história.
A história que o Livro já teve no seu longínquo passado, quando era um bem de riqueza, sempre presente nas casas reais e elemento obrigatório nos saques, ao lado do ouro da prata e dos diamantes. O Livro já foi um tesouro que se tornou nos nossos dias, um bem de “consumo imediato”. Felizmente que ainda posso “ler” alguns livros antigos e tocar ao de leve, a riqueza do seu passado.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Post.it: As mesmas novas palavras


Quem escreve,  usa as palavras como sementes que planta na terra. Umas florescem, outras murcham sem ver a luz do sol. Quem escreve, acaba por escrever sempre as mesmas palavras, com as mesmas letras, talvez noutro lugar da frase. Talvez pensem que quem escreve se cansa das palavras, essas que nos parecem surgir sempre repetidas. Mas então pergunto, por acaso alguém se cansa de pensar, de sentir? Podem ser os mesmos pensamentos, os mesmos sentimentos, mas são os nossos, não nos cansam, preenchem-nos elevam-nos num sonho, também ele, sempre o mesmo. Claro que quem escreve procura novas palavras. Ou procure talvez,  dizê-las de outra forma,   escreve-las de diferentes maneiras.
Mas todas elas já foram ditas e reditas milhares de vezes, por milhões de pessoas.
Palavras que se repetem constantemente nos mais diversos pontos do globo, nas mais variadas línguas.
São sempre as mesmas mas, de cada vez que são ditas, de cada vez que são sentidas, adquirem o sabor de novas em cada boca que as profere, em cada pessoa que as escuta.
Tornam-se únicas, tornam-se nossas, apenas nossas, numa doce pertença. Porque envoltas na magia do momento, ninguém as consegue proferir com a mesma entoação, escutar com a mesma emoção.
Quem escreve, procura novas palavras, sem as encontrar, percebe, que é a forma como são vividas e oferecidas que as torna novas, diferentes e especiais.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Post.it: Faltou-me esse voo


“Faltou-me, algo que não sei bem o quê, uma grama de coragem, uma dose generosa de vontade. Um pouco de iniciativa. Faltou-me esse querer, que se quer com a força que move montanhas. E, no fundo, bastava apenas um sopro de vento vindo do fundo da alma. Mas não o fiz, gastei as minhas energias com desculpas, “não era para ser”, “nunca daria certo”, tive medo. Medo de tentar, de arriscar, de lutar, de voar, de cair, de chorar. E no entanto se “tivesse um golpe de asa”, teria tocado o sol, sem me queimar. Teria mergulhado no azul do céu. No entanto, troquei o assombro pela paz. Troquei o sonho pela realidade.
Por um momento foi quase amor. Quase princípio, quase de felicidade que se tronou numa quase saudade.
Nesta vida que foi quase, quase vivida, essa “asa que se elevou mas não voou”, deixou-me onde estou, onde sempre estive, sem chegar mais longe.
Hoje vagueio-me em silêncios do coração impedindo-o de gritar o nome que entretanto já  esqueci no deserto dos dias. Se ao menos tu (esperança) estivesses à minha espera. Eu voltaria e, quem sabe desta vez, até voasse.”
E voa, voa com o olhar, voa com o pensamento. Voa sem asas, porque já não precisa delas. Os anos permitem-nos isso, libertos da razão, dos conceitos, preconceitos, do certo e do errado, podemos por fim dar deixar voar o coração. Mesmo que seja tarde para a vida, ainda é madrugada, para o dia.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Post.it: Enquanto a morte dormia


Enquanto a Morte dormia, a Vida nascia, crescia, irrequieta, saltitante e feliz. De vez em quando, perante uma voz mais sensata de mãe, parava, questionava e prosseguia no seu fervor de juventude.
Cansada da Rotina e da Sensatez, amigas de longa data, que inúmeras vezes a mandavam obedecer à Razão outra amiga mais serena e ajuizada, a Vida pensava travessa e obstinada, qual será o problema de acordar a Morte? Que ela resmungue como uma velha de mau humor? Ora que disparate! A Vida não temia lamurias. Então desafiava a Morte, pé-ante-pé, abanava-a e, como nada acontecia de terrível, voltava a aproximar-se, espicaçando a sua indolência. Tornara-se um jogo divertido. Claro que, não ficava sempre isenta de mágoas e de marcas, umas esfoladelas, aqui, umas quedas ali, mas a Vida rapidamente esquecia, afinal era jovem. Tinha uma energia que nem a Morte, velha e cansada, lhe podia roubar.
Até ao dia em que viu a Morte tal como ela era, grande e dominadora. Incapaz de a deter, a Vida tentou fugir, mas a Morte correu mais rápida. Surpreendida perante tanta agilidade, a Vida, tentou tudo, prometeu que iria portar-se bem, pediu-lhe desculpa por todas as provocações, implorou uma segunda chance. Mas nada resultou, então a Vida, olhou a Morte com humildade, sorriu-lhe sem revolta, estendeu-lhe os braços para receber o seu definitivo abraço. Por fim, a Morte compadeceu-se, olhou a Vida e enterneceu-se-lhe o coração. Para aviso, já bastava, afastou-se suavemente e deitou-se de novo na sua cama de nuvens. A Vida suspirou, agradeceu e continuou o seu caminho, desta vez com cuidado para não despertar a Morte que de novo dormia.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Post.it: Viver é preciso


Quando lhe perguntavam a idade sorria e respondia: – Muitos! já estou a dever anos há vida. Deparara-se com a morte algumas vezes, depois do primeiro susto, do segundo, do terceiro, passou a encará-la com naturalidade.
– Quando ela chegar cá estarei à sua espera.
Tínhamos longas conversas numa delas disse-me.
– Por vezes pensamos que já chegámos aqui, já passámos por tudo, já vimos de tudo, já chorámos o bastante e rimos outro tanto.
Podemos sentir que se passamos a viver a vida com a tranquilidade dum rio a fluir enquanto nos deixamos simplesmente ir. Mas de repente algo desperta-nos desse doce torpor e surpreendentemente sentimos que ainda temos muito mais para sofrer, para ver e sentir.
O coração que se habituara a navegar sente-se magoado, ferido na sua delicadeza. Como dói a injustiça, a incompreensão, a sensação de que se dedicámos em vão a momentos que nos pareciam bonitos, duma jovialidade luminosa.
Roubados no nosso ideal sentimos que nem que se vivamos 100 anos haveremos de compreender a complexidade humana.
Que fazer? Pergunto-lhe. – Deixar acontecer, aceitar, recolher-se e navegar porque, viver é preciso.