terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Só tenho o sonhar

Que importa se o amanhã,
Forem as lágrimas de um mar.
Quando a esperança mesmo vã
No hoje me faz tão longe voar.

Que importa se o sorriso
For uma leve brisa fugaz.
Só dessa brisa preciso,
Se nela encontrar a paz.

E se for somente um esboço,
Criado por laivos de fantasia?
Sinto que podia ser um poço,
Porque feliz nele mergulharia.

Para ter o terno prazer,
De encontrar no seu olhar.
O reflexo do meu a nascer,
E para sempre aí morar.

Na pobreza do meu viver,
Na solidão do meu amar.
Sem nada para lhe oferecer,
Oferecia-lhe o meu sonhar.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Post.it: Brumas da memória

Somos feitos de histórias, umas melhores do que as outras. Diferentes nos momentos, nas personagens, na história que contam. Mas são parte de nós. Compõem-nos, dão-nos traços de riso ou de lágrimas. Iluminam o nosso olhar ou roubam-nos essa luminosidade.
Contas-me uma história, a tua, confessas-me um pouco mais de ti. Revelas -me como foi viver uma dessas histórias, talvez, não a mais feliz, talvez, inclusive, não seja a história que a memória deseje visitar quando a saudade se torna um rio, por onde velejam os barcos dos nossos ensejos.
Mas o tempo, esse sábio curador, atenua e adoça a mácula das horas, que desejaríamos, tivessem encerrado outro sentido. Mas é a história da vida. Não é mais uma, é apenas aquela que deixou atrás de si um rasto de nostalgia no horizonte da sua existência.
 Podia dizer que se arrependeu de a viver, mas não é verdade, admite sem embaraço, porque como escreveu F. Pessoa “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”. E a alma é grande, porque nela cabe tudo o que já foi, tudo o que é e tudo o que será. Não se arrepende, até agradece a cada memória, o despertar das mais belas emoções. Tal como agradece a cada pessoa que já saiu do seu caminho e a cada pessoa que nele permanece, a história que lhe permitiu viver e recordar, crescer em maturidade e dilatar o sentir do coração, enquanto a bruma do esquecimento a vem docemente envolver no seu manto de paz. 

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Post.it: Escrever o caminho

“Vive a vida na ânsia de um cavalo cansado, cansado, mas não derrotado”. Que continua sem desistir, talvez já não corra, talvez apenas trote, caminhe de passos lentos, trôpegos até. Mas quando se tem um objectivo superior,  as forças renascem, o ânimo reacende-se.
E não importa a soma dos anos, nem a neve que se instalou nos seus cabelos.
Escreve, regista cada momento, no diário de memórias, antes que o tempo as roube. Escreve, mesmo que a mão trema, continua firme o coração. Escreve para encontrar um caminho que o leve à meta, conhece-a, ou melhor, adivinha onde ela está. Já tentou seguir por atalhos, numa escrita ténue de sentimentos e suave de emoções. Um a escrita que tocou  uns, que passou ao de leve por outros e ao lado de muitos.
 Mas agora, agora que o fôlego lhe vai faltando, escreve com coragem, com a última réstia de alento. Escreve desejos que já não se escondem, que se assumem reais. Não podemos adiar a vontade, quando esta dita o ensejo, o destino. Mesmo que ele não se cumpra. Que fique aquém do nosso empenho.
Escreve, porque a voz o trai, por timidez ou inibição. Escreve, porque sempre encontrou nas letras a amizade leal que só elas podem oferecer.
No final da tarde, pousa a mão cansada da missão. Pousa os pensamentos. Descansa os desejos. Saboreia cada frase, respira cada palavra e sorri. A obra não está perfeita, mas está igual a si, humana, palpitante de vida. Numa escrita que o eterniza tanto tempo quanto o permitir o papel folhado por muitas mãos que nunca o conheceram como homem, apenas com autor daquele livro de capa bonita que fica bem em qualquer estante e quem sabe em qualquer coração que o leia, ofereça, partilhe e o leve tão longe como o sonhar de quem o escreveu.
A mão continua pousada, incapaz de escrever a palavra fim, porque nenhum livro tem um final definitivo, cabe a cada leitor acabá-lo. Enquanto ele, autor, descansa a pena e adormece ao mesmo tempo que o sol se põe no horizonte.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Post.it: O que nos liga

O que nos liga é esta última gota de orvalho esquecida na madrugada. O que nos liga é este céu, este dia, talvez esta hora. No momento em que o pensamento se reconcilia com as lembranças e dói no peito uma nova dor.
Passam-se dias, meses e a dor instala-se como se tivesse encontrado um lar. Sufoca-nos, rouba-nos o alento. Escurece o sol, entristece as flores, o tempo sem energia, arrasta-se como se carregasse às costas cada hora, cada minuto, cada segundo que demora a passar.
Alteram-se os sons, emudecem as vozes, até Chopin muda de tom, num tilintar copioso, que não é chuva, mas notas de um chorar dentro da alma.
Há palavras a quererem sair mas já sem nada para dizerem, quedam-se silenciosas em respeitosa contemplação.
 Os olhos escondem-se num fechar de pálpebras, que já não querem ver a paisagem, como se o horizonte fosse apenas um vazio de imagens sem emoção.
Por fim, liberta-se um suspiro há muito sufocado no coração. Um suspiro que se eterniza em busca dum eco que lhe corresponda. E a dor... a dor ganha um nome, o teu, saudade.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Post.it: Produtos gourmet

Na vida já experimentámos várias situações, já atingimos um patamar superior, aquele que nos permite ter bom senso para escolher, para avaliar. É uma sensação impar, uma sensação de poder. 
Finalmente podemos optar e dizer, não e, esse não, ser tido em conta. Conquistámos o nosso lugar social e familiar. Agora queremos apenas o melhor, nada menos que isso. O melhor da vida, longe da ansiedade, da dúvida, dos receios de fracasso. Longe da apreensão de não sermos aceites, de sermos avaliados. 
Conscientes de quem somos, do que crescemos, descobrimos que já não é preciso esconder ou fingir uma força que não temos. Aceitamos que somos apenas seres humanos. Redescobrimos o valor da amizade, os amores vêm e vão como ondas na maré, mas os amigos, esses permanecem como um reduto de segurança. Uma amizade que nos permite ser a intrínseca  verdade, conquistada a pulso, numa luta contra gigantes que descobrimos afinal, que apenas estavam em nós. E que essas pequenas fraquezas e vulnerabilidades fazem parte do  nosso “charme”. Partilhamo-las com orgulho delas e com grande surpresa,  encontramos idênticos sentimentos no nosso núcleo de amizade. Agora sim, estamos mais íntimos, mais solidários, mais amigos. E no final desse encontro sentimo-nos mais enriquecidos. Claro que a paixão ainda paira de quando em vez nos nossos pensamentos, ainda nos agita o coração, esse fascínio que faz milagres à pele, ao olhar, à auto-estima. Mas temos consciência que é um pouco como um gelado, cujo sabor já conhecemos, sabe bem, mas não preenche e como tal comemos mais, desejamos mais, quando damos conta estamos uma "baleia" solitária, porque a paixão, essa,  já partiu e, nós acabamos no melhor dos casos num qualquer spa, numa dieta drástica ou num vale de lágrimas. 
Os gourmets da vida já não sentem atracção por “gelado”, ou pelo menos já os escolhemos com mais requinte, com mais calma. Apreciamos a qualidade, informamo-nos dos elementos que o compõem, verificamos as calorias, se é duradouro ou fugaz. Não há garantias, nunca houve. Mas há a tranquilidade de se saber o que se quer e  que finalmente, merecemos produtos gourmets.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Post.it: Na sombra dos dias

Um adeus, um recomeço, um gesto adiado, um passo parado. Uma espera de tudo, uma espera de nada. Uma pergunta calada. Uma resposta nunca dada. Eis a sua história, sem presente, sem passado e mais ainda supõe, sem futuro. Causas, culpas, não existem. Apenas uma espera cansada de esperar. Que tudo aconteça, que se abra a porta, que alguém bata na janela. Quem? Questiona o coração. “A esperança”. De quê? Menciona a dúvida. “De encontrar a felicidade”. Mesmo que não tenha nome, que surja num rosto desfocado pelo desvanecer da memória.
Mas enquanto há vida, há esperança, repete de sorriso triste, quem já não tem motivos para sorrir. De quem viveu uma vida a esperar, por algo que tardou tanto, que cada vez mais acredita que nunca chegará esse alguém que lhe afague os últimos cabelos brancos e, que lhe encha de sol o olhar já entardecido.
Todas as manhãs ergue a esperança, arranca-a do leito onde teima em ficar, já sem forças para continuar a ser a coragem daquele corpo fatigado, mas não esgotado, refere num ímpeto de teimosa insistência. Porque os seus passos ainda insistem em caminhar na sombra dos dias que passam sem deixar rasto, em busca de outros passos também cansados de andar sozinhos e que queiram fazer companhia aos seus.
Vejo-o afastar-se devagar, porque, embora o coração tenha pressa, a vida não tem pressa de chegar, quer apenas continuar a ser vivida.
Pergunto-me se conseguiria esperar assim, uma vida inteira e, concluo que “depende mais do mar do que da maré”. De encontrar em cada dia uma razão para acreditar. “Dá-me um sonho e eu continuarei a sonhar” e a caminhar ainda que apenas, na sombra dos dias.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Post.it

Pequenos recados,
Não são lições a reter.
Mas que deixo colados,
Para não me perder.

Nada tenho a ensinar,
Mas o pouco que sei.
Para sempre o praticar,
Em lembretes transformei.

Porque a memória,
Já brinca e engana.
Desenhando a história,
Em sonhos de cama.

Alguns são especiais,
Pinturas quase rupestres.
Palavras que de tão banais,
Não igualam as dos mestres.

Pensamentos em viagem,
Por caminhos de emoção.
Quando na sua linguagem,
Fala timidamente o coração.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Romances literários

Romances onde a palavra voa,
E mesmo que não seja boa.
A escrita sempre permanece,
Quando na estante adormece.

Ela liberta-nos deste lugar,
Eleva-nos, faz-nos sonhar.
Com uma outra realidade,
Cheia de paz e felicidade.

Oferece-nos bons amigos,
Que nos afastam dos perigos.
Sentimo-los como quase irmãos,
Tocamo-los no estender das mãos.

Confiamos-lhes as mágoas,
Afogamo-las nas suas águas.
Conhecemos as suas histórias,
E festejamos as suas vitórias.

Desejamos-lhes um final feliz,
O que cada um para si quis.
E na hora da despedida,
Fica a saudade entristecida.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Post.it: A vida que te dei

Porque te dei a vida? Dizes-me isso como se tivesse sido, um acto de egoísmo da minha parte. De quem quer realizar através dum filho os seus sonhos impossíveis. Mas a verdade é que quando pensei em conceber-te, tive apenas como objectivo o desejo de te amar e fazer feliz. Claro que no meu ideal, tudo era possível de te oferecer e de te proteger. Mas fui descobrindo que podia tentar, mas nem sempre, concretizar os meus objectivos e os teus desejos. Em alguns momentos, sinto que fracassei, mas noutros, quando leio uma luz de felicidade no teu olhar, sei que consegui cumprir o meu papel de mãe.
Sobretudo sei que tudo o que fiz foi com o coração cheio de amor e de esperança, sentindo que estava a realizar o melhor para a tua vida. Porque é disso que se trata, a tua vida, a que te ofereci. Pois fui concluindo com alguma angústia, que posso caminhar a teu lado mas não a posso viver por ti.
Porque nunca te prometi que só terias alegrias. Mas tentei ensinar-te a superar as tristezas.
Não te prometi riquezas materiais. Mas tentei que desenvolvesses potenciais para as alcançares.
Não te prometi que viverias num mundo perfeito. Mas tentei que aprendesses a lutar pelos teus sonhos e direitos.
Não te prometi que o egoísmo de algumas pessoas não te magoaria. Mas tentei incutir-te valores para os perdoares nas suas faltas.
Não te prometi imunização contra os obstáculos do caminho. Mas tentei que adquirisses capacidades para os ultrapassares.
Não te prometi que todas as amizades seriam leais e companheiras. Mas tentei que aprendesses a valorizar os verdadeiros amigos e a ser compreensiva com os que o não são.
Não te prometi que serias sempre saudável. Mas tentei ensinar-te a paciência para lidares com os teus males.
Não te prometi que só irias desenvolver pensamentos felizes. Mas tentei fortalecer-te para os aprenderes a direccionar nesse sentido.
Não te prometi que tudo na tua vida iria correr bem. Mas tentei intensificar o teu carácter para que inteligentemente construísses novos objectivos.
Não te prometi que todos te amariam. Apenas disse que te amaria incondicionalmente e para sempre.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Post.it: O que nunca te direi...


Todas as palavras serão sempre demasiadas, quando não temos quem as possa ouvir. Todas as palavras serão apenas ocas, quando não encontramos quem as possa sentir.
Porque as palavras são mais do que letras ou sons. Têm vida, sentimentos, lágrimas, mágoas, lamentos. As palavras têm asas, aproximam ou afastam consoante os ventos da receptividade. Já não sei que palavras use, depois de todas as que já empreguei, num vazio de palavras submergi, porque nem que gaste todas as palavras do português e desempoeire as do meu latim, poderei conquistar o caminho certo para a tua alma para nela repousar o meu querer.
Retidas numa fronteira de sentimentos adversos, murcham as palavras, perdendo o sentido, esquecendo a direcção. Enquanto perecem sem florescerem no encontro de outras similares, de há muito demoradas.
Novas palavras vão surgindo, sem o ímpeto das que outrora. Porque os sentidos ainda aportados, não conseguem levantar a âncora e navegar por novos mares. Quanto às velhas palavras, guardá-las-ei nas entrelinhas, agora que já não as escrevo e serão para sempre as palavras que nunca te direi…

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Post.it: O nosso mundo


Vivemos todos no mesmo mundo, ou talvez não. Há quem viva em mundos de fantasia porque não consegue encarar a realidade. Há quem viva no passado porque não tem coragem de conquistar o futuro. Há quem viva agarrado a impossíveis com receio que os possíveis sejam piores. Há quem viva almejando o amanhã porque não consegue apreciar o hoje. Há quem viva convencido que é o melhor porque tem receio de enfrentar a concorrência. Há quem viva num mundo de revoltas, de batalhas que nunca ganha porque não aceita que ceder também é uma forma de vencer. Há quem se considere único porque não sabe como conviver com os outros.
Vivemos todos no mesmo planeta, mas decididamente em mundos diferentes. Mundos que criamos à nossa medida, para corresponder a modelos, ideais, expectativas. Mundos que muitas vezes se revelam bolas de sabão, castelos de areia, frágeis e perecíveis.
Quando um dia nos encontrarmos no mesmo mundo, talvez consigamos ver os outros e possamos aprender juntos a criar um mundo real, talvez não seja o melhor dos mundos. Mas é certamente aquele onde podemos construir a nossa felicidade.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Esperei por ti


Esperei por ti,
Em cada Primavera,
Que murchou de solidão.
Em cada Verão,
Que não me aqueceu o coração.
Em cada Outono,
Que no silêncio caiu.
Em cada inverno,
Que só o vento se ouviu.

Esperei por ti,
Com a chuva no olhar,
E uma tão vaga esperança,
Que te fez em mim ficar,
Terna e definitiva lembrança.
Essa gota que fechei na mão,
Triste desencontro da felicidade.
Não a quero reter no coração,
Deixo que voe com a saudade.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Post.it: Oração à vida

Vida dá-me a coragem: 
- De viver 365 dias, sem concretizar os meus sonhos. Mas despertar em todos esses dias com vontade de te acolher no meu abraço.
- De para encontrar no vazio, a plenitude de viver grata por ter em ti nascido.
- De encontrar um lado positivo em tudo o que me parece negativo e me desmotiva a seguir     em frente.
- De sentir cada obstáculo como um desafio. Cada pedra como um degrau que me leva ao topo.
- De converter cada lágrima num amplo e sincero sorriso.
- De encontrar na solidão o prazer do reencontro com a minha companhia.
- De vencer os meus receios, as minhas dores e de as transformar em amor.
- De conseguir direccionar sempre os meus pensamentos, os meus sentimentos para um rio de límpidas e tranquilas águas. 
- De acrescentar vida aos meus dias e não me contentar em acrescentar dias à vida.
E quando já nada restar, que encontre nesse nada, a sensação plena de tudo.
E saiba por fim agradecer, cada um desses 365 dias transformados em anos, cada instante desse tempo que me faz renascer e ser um pouco de ti…

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Post.it: Carta para a mãe

“Porque não vieste hoje aconchegar-me os cobertores, nem dar-me um beijo de boa noite?
Onde estás? Já percorri a casa e não te encontrei. O pai permanece em silêncio olhando para o televisor apagado. A mana fechou-se no seu quarto e não me abre a porta. Alguém murmurou em tom de reconforto, que estás no hospital, quero saber mais, mas ninguém me responde. Talvez tenham medo que eu chore. Mas eu choro de qualquer forma, porque tu não estás. Porque me sinto perdido sem ti. Não sei caminhar sem a tua presença a meu lado. Tenho saudades tuas e ainda ontem te vi, mas o hoje parece-me tão já tão longe desse momento, tão imenso no tempo e no espaço. Sempre me chamaram, menino mimado, porque quando te afastavas, chamava logo por ti. Gozavam comigo, mas não me importava, porque tu também não lhes ligavas. A cada expressão de zombaria, apertavas-me mais no teu abraço e fazias-me sentir mais forte. Por vezes diziam-te que tinhas de me “cortar o cordão umbilical”. Olhava-te assustado, com receio que seguisses esse conselho, quando eu ainda me sinto no teu ventre. Preciso dele, porque é   o meu porto de abrigo, que me protege das tempestades do mundo que por vezes me é tão agreste. Mas tu perante esses conselhos, sorrias, era a tua forma de lhes dizeres, que não percebem nada de amor maternal. Dessa magia que só sente quem colocou nos genes todo o seu afecto, que criou na gestação mais do que um ser, mas uma ponte, um laço indestrutível, que não sucumbe ao tempo nem à vida. Sinto-me só, tão só, como se tivessem arrancado do meu ser a alma que tu eras em mim. Escrevo-te esta carta, porque já não sei que mais fazer para chegar a ti, para te dizer tudo o que sinto, para te pedir que não demores ao lar que tens no meu peito.”

“O nosso filho entregou-me uma carta, disse para a entregar à mãe. Olho o envelope, e depois o seu rosto, vejo-o triste, quero abraçá-lo mas ele foge de mim como se fossem só para ti os seus carinhos. Não sei o que lhe dizer, digo-lhe que te entrego a carta. Guardo-a na gaveta da cómoda do nosso quarto. Quem sabe um anjo a vem buscar e a leva até ao céu onde tu certamente estás, olhando para nós, como sempre a sorrir e, lendo a carta que o nosso filho te escreveu.”

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Post.it: Sem retoques

Numa daquelas conversas de café que cultivo como uma tradição, lançaram-me uma pergunta, talvez pouco ética, mas a verdadeira amizade permite certas liberdades sem ficar beliscada. “Qual é o teu estilo?" Perguntaram-me com olhar pouco aprovador. Tesouras afiadas prontas a esquartejar o que resta do meu look. Devo confessar que saí de casa a voar para não chegar atrasada, coisa que valorizo mais do que a conjugação de cores, padrões e peças de roupa. O espelho, bom amigo, manteve o seu silêncio que entendi como aprovação e fechei a porta convencida que estava cheia de style.
- Bom, o meu estilo? Tento responder meio hesitante, enquanto tropeço nas palavras, como se fosse ainda uma aprendiza da língua pátria. Por fim, balbucio algo perceptível. 
- Nunca me debrucei sobre o assunto, mas suponho que o meu estilo seja a inexistência de estilo. Gosto do que é malfeito, de coisas desajeitadas, que caem e pendem por todos os lados num perfeito desalinho, meio hippie, meio cigana.
Observo-me, sem entender a questão, reparo que uso a roupa uns quantos números acima, porque gosto de me sentir confortável. Além disso, não me importa o visual, é apenas um embrulho, mesmo que mal-amanhado. O meu look, é sobretudo um desafio, não para todos, mas apenas para alguns, aqueles que indiferentes à mera aparência, se acerquem e tenham alguma curiosidade em desvendar o conteúdo. No entanto, poucos têm coragem de passar a fronteira do olhar, erguem muros de preconceito, tornam-me invisível. Não sei se hei-de chorar ou se rir dos julgamentos que a mente faz, estigmatizando sem apelo nem agravo, alguém que tem por culpa a determinação de ser verdadeiro, sem retoques de vaidade. 

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A carta do destino

Haverá sempre um rio, uma ponte,
Haverá sempre um céu como horizonte.
Haverá sempre um mar ondulante,
E uma vaga com o teu nome viajante.

Haverá sempre uma nova primavera
A nascer mesmo, depois de nós.
No jardim duma longínqua quimera,
Que nos deixa cada vez mais sós.

Haverá sempre uma andorinha
Que não sabe se torna a vir.
Haverá sempre uma estrelinha
Na noite escura a tentar sorrir.

Haverá sempre uma nuvem que chora,
Cúmplice da minha perpétua solidão.
Haverá sempre um silêncio que implora,
Sentir o abraço do mais terno coração.

Haverá sempre um frio amanhecer
Que se adia em cada novo despertar.
Haverá sempre escuridão do anoitecer
Reflectindo-se na sombra do meu olhar.

Haverá sempre um novo caminho
Que o tempo nunca consegue deter.
Por muito que lhe chamem destino,
Chamo-lhe carta que estou a escrever.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Post.it: Quantas margens tem o rio?

Quantas margens tem o rio da vida? Suporia que tem duas, a tua e a minha. Mas tem outras, muitas outras, feitas de memórias transformadas em saudades. De desejos fracassados. De sonhos construídos nos braços da noite e despertados na solidão da madrugada.
Quantas margens tem o rio da vida, esse rio feito de lágrimas caladas, e outras, tantas gritadas, mas que acabam sem desenlace, ou tão-somente, enredadas, prisioneiras dum coração que quer, sem saber como, viver a felicidade que acredita é sua e,  está ali. Naquele lugar, naquele olhar, na perdição de uma paixão, ou na salvação duma conciliação. Reconciliação, talvez…
E, então, desenhas margens, soluçantes.
Esboças um futuro que não é feito de nós. Delineias um encontro continuamente desencontrado. Planeias recomeços que não saem do tracejar do pensamento. Gizas um sonho, onde não surjo.
Não podemos deixar de ser quem somos, só porque não conseguimos voar. Não podemos deixar de sentir o que sentimos só porque esse sentir não completa a nossa sorte.
Então extingo as palavras, emudeço a escrita. Tapo os ouvidos para não ouvir o que me dizes dentro do peito. Fecho os olhos, não quero mais, enredar-me no fascínio do que és, quando me brincas na fantasia, quando me envolves de quimeras.
Porque, por muito que o tentemos, seremos sempre silêncios perdidos entre as margens de um mesmo rio, onde tu danças, brisa, sopro de vida, meu derradeiro alento.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Post.it: As datas são ciclos de vida

O dia de hoje fecha um ciclo de festividades, para uns com relativa tristeza, para outros com indiferença. Uma indiferença que lhes é habitual e que nos leva a esta pequena observação.
Que importância tem o que cada um faz com os dias, são deles. Usem-nos bem ou mal, é um direito seu. 
Que importância tem o que cada um faz com as datas mais importantes para o seu ciclo de vida. Se forem  relevantes ou não para si.
Que aufiram dos feriados, reconhecendo-lhe apenas o beneficio do descanso ou a quebra da rotina que estes permitem. Esquecendo que ele conta uma história feita de lutas e de sangue para conquistar aquilo que hoje somos.
Aos aniversários, que podem constituir uma verdadeira chatice, o ter de lembrar quem apetece esquecer, desvalorizando a importância que cada um tem para a construção da nossa sociedade.
Ao Natal, cheio de teorias, de frases clichés. Natalices que para alguns parece rimar com pedinchices,  lamechices, em suma chatices. Porque lá temos de gastar o nosso parco pecúlio em prendas que ninguém precisa ou nem sequer aprecia.
E lá vão ter que assassinar a dieta, trucidar o colesterol, esquartejar a diabetes. Tudo em nome de uma causa, mais que não seja para não ficarem desenquadrados do espírito de comunhão.
Não me atinge que existam tais sentimentos. Que coexistam tais indiferenças. Só me incomoda o facto de não entenderem que nem tudo é pura fabricação, adaptada a cada comemoração. Que não tem que ser entendido como um mero aproveitamento comercial que nos vicia no desenfreado consumismo. 
Se não convivem bem com tudo isto, em vez de se limitarem a ser a oposição crítica, sejam a diferença, a solução. Revelem novas possibilidades de um Natal, aniversário, feriado, etc., mais baseado em valores espirituais e menos materiais. Mas sobretudo entendam que há pessoas que os vivem e sentem no âmago do seu ser. Que os oferecem aos outros, não só em determinadas datas, mas em todos os momentos, que se disponibilizam a estar presentes, de corpo e alma. Porque há pessoas assim. E confesso, com genuína alegria, conheço algumas e acredito que existam muitas mais.
Porque é delas que a humanidade é feita, quando tudo parece perdido, são sempre as primeiras a chegar e as últimas a partir.
São estrelas que nos guiam pelo túnel escuro em que por vezes nos sentimos mergulhados sem encontrar uma saída.
Gostaria que todos os que desconstroem argumentativamente todas as comemorações tenham a capacidade de construir, com ideais positivos, um novo e melhor mundo que a humanidade possa celebrar todos os dias e não em só em determinadas datas.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Post.it: O espelho

É um objecto sem nenhuma característica especial, parece uma coisa sem nada, sem alma, sem vida, sem atitude, sem palavras. E no entanto ele olha para mim e vê-me tal como sou. Revela cada detalhe que aceita de mim. Que mostra sem apontar defeito. Porque para ele eu sou um ser perfeito. 
Sorri-me, quando lhe sorrio. Olha-me nos olhos e vê-me a alma. Nem sempre gosto dele, há dias que não o consigo encarar, mas não adianta negar a sua existência porque há momentos em que por mais que me esconda, ele descobre-me à sua frente. 
Desnuda-me o sentir, obriga-me a ver quem sou em si. Já não tenho segredos para ele. Conhece cada detalhe, cada cabelo branco, cada ruga, cada estria, cada recanto em que me encanto ou por vezes me desencanto. Nem sempre é fácil estar ali, perante ele, sem defesas, é preciso coragem para abrir as pálpebras. 
Por vezes, tenho esperança que não esteja presente, mas está, porque ele sabe que não adianta fugir da realidade, então retribui-me a tristeza que sinto, a lágrima que teima em espreitar. E quando o vejo, tão triste assim, ponho de lado o meu desgosto e ofereço-lhe o mais amplo sorriso.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Post.it: Lagartixa ou jacaré?

 “Quem nasceu para ser lagartixa nunca chegará a jacaré”. Um ditado antigo que parece aprisionar-nos para sempre numa terrível estatística. Amartya Sen, prémio Nobel da Economia (1998), defende que  “a pobreza não se mede pela existência de um ou mais dólares na carteira”.
Porque a pobreza, conclui, ou ausência dela, depende menos do dinheiro do que das circunstâncias onde vive cada pessoa, da sua genética, da sorte, dos seus pais, do clima, da roupa que usa, da voz que tem, das emoções que transmite e de um conjunto impressionante de outras possibilidades que salvam uns mas condenam outros.
Contudo Amartays vai mais longe na sua abordagem “O desenvolvimento consiste na eliminação das privações de liberdade que limitam as escolhas e impedem de exercer ponderadamente a sua condição de cidadão”. Dando ênfase à questão de que as pessoas devem ser livres para fazer o seu caminho, ampliando a ideia de que a liberdade molda a evolução do desenvolvimento humano. Concluímos que não é um percurso fácil mas que é possível, libertarmo-nos definitivamente da possibilidade de entrar e permanecer na lotaria Darwiniana. Para tal temos de construir uma nova herança social, quebrar o elo mais fraco e construir outro fortalecido pelo poder da acção. Conscientes de que podemos ter um papel decisivo no sucesso ou insucesso pelo uso da nossa liberdade. Sem ficarmos simplesmente “condenados” , pela sorte ou pela falta dela.
Agora que esperavam que esta fosse a  conclusão indiciando que se deve contrariar a ordem estabelecida tornar-se num self made man, vou virar o rumo da intenção discursiva. Porque “Se é verdade que a lagartixa nunca chegará a jacaré”, observemos pela positiva, terá uma vida feliz num qualquer jardim sem “acabar em exposição numa loja de malas” Quem é que deseja ser um mau jacaré quando se pode ser uma excelente lagartixa? Não é uma questão de acomodação, mas de opção entre andar eternamente atrás de sonhos ou melhorar em cada dia a sua realidade. Afinal a sociedade é composta de tudo e de todos os que representam com brio e perfeição o seu papel. Agora sim, e em conclusão, tudo é válido e meritório, o esforço para conquistar um lugar no topo da hierarquia ou ser a solidez da base que equilibra a pirâmide.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Post.it: O mar do olhar

Olho o mar, e o meu olhar torna-se barco de vela erguida rasgando as suas águas. Estendo os braços, no sonho de abraçar as suas vagas. Como desejava acalmar-lhe os vendavais, amaciar-lhe as rochas para as tornar o seu aconchego. Que solidão a sua, por não ter a liberdade de entrar pela terra adentro, entender-se numa duna e ter sonhos de luar. Como compreendo essa solidão, tão idêntica à minha, prisioneira do meu querer. Só quando o mar ascender às nuvens e nelas escrever o nome da sua ventura. Só quando já não tivermos âncoras... 
Quando já não precisarmos de cais...
Podemos por fim voar com o sentir leve para amar...
Um amor que não nos aprisiona no eterno desencontro. Um amor que nos faz tocar o céu do reencontro.
Poderemos então desenhar na areia um coração que o mar beijará sem apagar. Porque nem sempre o mar do olhar tem de ser triste. Mesmo feito de águas, mesmo feito de mágoas, o sorriso ainda persiste…
Quando o olhar do mar no nosso olhar, repousar.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

post.it: É tempo de construir certezas

Ano Novo, Vida Nova, dizemos num ímpeto de mudança. Erguendo uma réstia de forças que nos trouxe até aqui, ao início deste ano, desta estrada que se estende como uma folha em branco perante nós. 
Claro que não será fácil continuar a escrevê-la, a palmilhá-la. Para trás ficam capítulos de um viver que já preencheu folhas e folhas de momentos bons ou menos bons. Momentos para lamentar as escolhas feitas do nosso leque de opções, mas também de muitos outros momentos que guardamos num cantinho do coração. Felizes ou não, foram eles que nos fizeram atingir cada meta e criaram em nós esta vontade de querer ir mais além.
                                                  Quando sonhar já não basta… 
                                              Quando o esperar já não conforta…
Não podemos continuar a alimentar-nos de vagas esperanças. É tempo de construir certezas. E porque a época ainda é natalícia, vamos abraçar o presente que é a Vida e darmos as boas vindas ao Novo Ano, desejando que nos seja venturoso e nos dê ânimo para concretizar a pessoa que somos. Feliz Ano!