quinta-feira, 14 de julho de 2011

Post.it: Peregrino

Rosto moreno, esboço de trilhos vincados na face. Descreveria facilmente o cansaço do tempo, na curvatura do corpo. Como se estivesse debruçado sobre os anos. Os anos que doeram ao passar. Não pela lentidão ou rapidez dessa passagem, mas pelo que lhe roubaram das expectativas que trazia. Diz em jeito de gracejo, que anda à procura dos anos que perdeu algures por onde passou.
Mas o seu olhar brilha como se um raiar do sol espreitasse por eles. A sua idade é uma incógnita, que não esconde nem evidencia. Deixou de os somar cronologicamente para os narrar em momentos vividos, em momentos sentidos e continuamente recordados.
Caminhos, conhece muitos. Quanta estrada, quanto pó, quanta chuva e vento. Mas sempre com um sorriso, sempre com renovado alento. Neste seu percurso de peregrino segue a sua missão. Essa legação que aceitou propagar por pela senda da vida, vestiu as dores alheias, calçou os seus destinos, caminhou a seu lado sem saber onde esse caminho o levaria. Deu liberdade aos seus passos. Mas quantas vezes parou nos seus cansaços. Descansou sem ter abraços. Questionou céu, indagou o mar.  Para voltar a prosseguir por onde o destino lhe indicou. Entendeu por fim para onde ia. - Nunca a estrada estará acabada, cada trilho leva a uma nova jornada. Murmura numa voz esvaída de timbre. Transporta o pesado fardo da vida, aliviado pela força da fé. Quem o vê seguir estrada fora, sente que passa e que ao passar permanece.

8 comentários:

  1. Anónimo14.7.11

    Gosto muito da sua escrita, do seu estilo inconfundível que já reconheço, em poesia, em tom ligeiro ou profundo, identifico-a pela intenção positiva que transparece. Gostei em geral de tudo o que tem escrito, mas fico sempre deslumbrada quando nos oferece estas reflexões, aparentemente tão simples mas tão sentidas. Este é mais um daqueles textos que me deixam suspensa a pairar no ar. Obrigada. Um grande beijo. Adelaide

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  2. Anónimo14.7.11

    Mais um quadro pintado com a ternura das suas palavras. Admiro a sua escrita amadurecida, desconheço a sua idade, pela escrita diria muita próxima da minha, mas pelos temas adivinho-a jovem madura. Seja como for mais importante que a cronologia é sem dúvida alguma a idade interior que não conhece tempo. Um abraço. Antero.

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  3. Anónimo14.7.11

    Amiga, senti que quase via os passos lentos mas firmes deste peregrino. Imaginei-o de sandálias gastas, quase descalço quando “vestiu as dores alheias, calçou os seus destinos”. Destinos de mágoas que o vão desgastando. Que lindo olhar que tens sobre as pessoas. Beijos, Amália

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  4. Anónimo14.7.11

    És uma caixinha de surpresas, cada vez que aqui venho fico admirada com o que escreves, com a assiduidade da publicação e a profundidade dos teus post.its. Chamas-lhe assim com humildade, mas se são pequenos na forma, são grandiosos no conteúdo.

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  5. Anónimo14.7.11

    Gostava de conhecer a tua fonte inesgotável de inspiração. Cristalina, refrescante, reconfortante. Que cada um de nós (peregrinos) desta vida recebemos e retribuímos um pouco com muitos beijos e o desejo que nunca passes e que eternamente permaneças. Beijocas C.

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  6. Anónimo14.7.11

    Que beleza de peregrino. Tenho o sonho secreto de conseguir fazer essa caminhada, mas sinto que a minha coragem interior é pouca para quem abraça tal jornada. José

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  7. Anónimo14.7.11

    Adorei este peregrino, imaginei-o quase idêntico ao da foto. Senti-o profundo “cansado de um cansaço que nunca cansa”, Bjs A.

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  8. Anónimo14.7.11

    Que maravilha de texto. Rui

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