segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Post.it: Enquanto a morte dormia


Enquanto a Morte dormia, a Vida nascia, crescia, irrequieta, saltitante e feliz. De vez em quando, perante uma voz mais sensata de mãe, parava, questionava e prosseguia no seu fervor de juventude.
Cansada da Rotina e da Sensatez, amigas de longa data, que inúmeras vezes a mandavam obedecer à Razão outra amiga mais serena e ajuizada, a Vida pensava travessa e obstinada, qual será o problema de acordar a Morte? Que ela resmungue como uma velha de mau humor? Ora que disparate! A Vida não temia lamurias. Então desafiava a Morte, pé-ante-pé, abanava-a e, como nada acontecia de terrível, voltava a aproximar-se, espicaçando a sua indolência. Tornara-se um jogo divertido. Claro que, não ficava sempre isenta de mágoas e de marcas, umas esfoladelas, aqui, umas quedas ali, mas a Vida rapidamente esquecia, afinal era jovem. Tinha uma energia que nem a Morte, velha e cansada, lhe podia roubar.
Até ao dia em que viu a Morte tal como ela era, grande e dominadora. Incapaz de a deter, a Vida tentou fugir, mas a Morte correu mais rápida. Surpreendida perante tanta agilidade, a Vida, tentou tudo, prometeu que iria portar-se bem, pediu-lhe desculpa por todas as provocações, implorou uma segunda chance. Mas nada resultou, então a Vida, olhou a Morte com humildade, sorriu-lhe sem revolta, estendeu-lhe os braços para receber o seu definitivo abraço. Por fim, a Morte compadeceu-se, olhou a Vida e enterneceu-se-lhe o coração. Para aviso, já bastava, afastou-se suavemente e deitou-se de novo na sua cama de nuvens. A Vida suspirou, agradeceu e continuou o seu caminho, desta vez com cuidado para não despertar a Morte que de novo dormia.

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