quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Post.it: Seara de vento

Não posso negar o que sou, esta seara de vento que corre pela planície. Esta liberdade, esta ansiedade, esta necessidade de horizonte. E de braços abertos acaricio o trigo doirado e adormeço sobre os molhos já ceifados.
Na cidade, sufoco por entre prédios que me roubam o alento dessa visão que almejo,  a luz de mil sois em flor. Cidade que me torna mais um ser anónimo, um número estatístico sem importância nem nome. Apenas vejo sombras por entre luzes de candeeiros na obscuridade que escurece o luar.
Preciso desse rio que atravessa sem pressa a charneca de flores. Preciso de encher os olhos de azul sem fronteiras de betão. Preciso de soltar o coração, sem medo que a noite o aniquile numa qualquer esquina perdida. Preciso de encher os pulmões desse ar ainda não corrompido por veículos que circulam alheios ao que se passa à sua volta. Preciso de acordar com o canto dos pardais. De ouvir ao longe o chocalho das ovelhas. De desejar um bom dia e receber idêntico cumprimento envolto num sorriso e num olhar que me vê. Não posso negar a essência que me demarcou os genes, sou filha da terra num cruzamento de mar, um galo na madrugada a cantar, uma gaivota na tarde a voar…

5 comentários:

  1. Anónimo26.10.11

    Estou sempre aqui, lendo, relendo, porque escreves coisas que não se podem ler com demasiada ligeireza. Amália

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  2. Anónimo26.10.11

    Mais uma viagem conduzida pela beleza da tua escrita.

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  3. Anónimo26.10.11

    As palavras esvoaçam nas suas mãos, desenhando imagens, sensações que de tão belas se tornam claras e envolventes. Não lhe consigo definir, leio em si heranças de grandes escritores: Drumond Andrade, Jorge Amado, Machado Assis, Cecília Meireles e tantos outros… Um abraço, Antero

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  4. Anónimo26.10.11

    Acabei de ler com um suspiro, enquanto o coração continuou a correr na planície.

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  5. Anónimo26.10.11

    Sempre bonito, sempre real e ao mesmo tempo irreal porque nos leva para novas paisagens. Leonor

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