sexta-feira, 26 de abril de 2013

Post.it: A outra margem da vida


Um olhar da outra margem, olha para mim e não me vê e nessa ausência que significo, devora-me a sombra com o seu sol.
A minha imagem silenciosa fica suspensa na linha do horizonte, aqui onde o deserto me habita, aí onde o nada me envolve. Quando apenas queria ser a sua  sombra, a sua protecção da luminosidade escaldante, tornei-me na mais vaga metáfora, um sonho cravado na dureza do mundo.
Este nada, este ninguém, excepto vida vivida deste lado da margem. Pelo meio, um rio do tamanho do mar. Claro que existem pontes, mas quem as atravessa? Eu, para me perder nessa inexistência de caminho? Para uma margem que não se reconhece na minha? Uma lágrima navega-me no rosto, cai-me no peito que se tornou rio sem margem, sem ponte, sem céu, sem sol e sem luar.
Porque brilhas astro rei incitando-me a sonhar, se o despertar nada traz de novo? O meu cais contínua vazio, desses  navios que ao passar apenas me oferecem um aceno.
Sem âncora, sem remos, sem leme, permaneço à deriva do meu próprio ser. E a tua margem tão perto, tão perto que me fica cada vez mais longe.
Entre o querer e o ser há este rio, este quase mar e uma margem que olha para mim sem nunca me chamar.
O que sou sem a outra margem, o que sou sem essa parte de mim, sem esse reino de fantasia que me fez sonhar acordada, uma mulher, uma ilha, uma luz, uma estrada... 
A descoberta serena de que também há sol nesta margem, basta pousar, deixar o nevoeiro passar e ver além do olhar...