quarta-feira, 10 de abril de 2013

Post.it: Não és um erro


“Se encontrares erros aprende com eles. Não tentes mudar, nem impor a tua gramática, a tua lógica de armários bem arrumados, de gavetas imaculadamente alinhadas. Somos iguais, mas tão diferentes. Eu danço na chuva enquanto tu te escondes dela. Eu procuro a sombra, tu queres brilhar.
Se encontrares erros não os corrijas, são a minha maneira desordenada de pensar, de sentir, mas bem organizada onde é necessário, aqui, dentro do peito.
Talvez não diga o que queres ouvir, talvez não escreva o que queres ler, mas ofereço-te tudo isso em cada abraço que permanece aberto à espera para te aconchegar.
Se encontrares erros, não os apontes, não sou perfeita, sou apenas aquela pessoa que se senta ao teu lado, que te ampara nos momentos em que precisas, que te escuta o tempo que tu quiseres, que sabe a hora de chegar, que sabe a hora de partir. Que quando está, está inteira, que quando sente, é verdadeira.
Sou aquela que não te conhece erros, apenas aquilo que és. Mesmo que dês pontapés na gramática, que violes todos os acordos ortográficos, que troques as letras, que atropeles as palavras, vou sempre entender-te nas entrelinhas do que escreveres, vou escutar-te no meio dos teus silêncios, porque uma convicção se ergue firme em cada amanhecer como uma bandeira que se desenrola no estandarte do horizonte, nunca serás o maior erro da minha vida, mas antes a minha, mais plena certeza.”
Escreveu tudo isto num talão do multibanco, escreveu-o com pressa, entre o nevoeiro do olhar que afastava com impaciência, e os cabelos que lhe toldavam a visão. Era um desabafo silencioso, um grito sufocado que se libertava na velocidade da escrita. De repente levantou-se, amarrotou o papel com raiva, com mágoa e atirou-o para o chão, saiu do autocarro num ápice de fuga. Apanhei o papel, pensei que talvez o tivesse deixado simplesmente cair, quis chama-la, mas já tinha desaparecido na multidão.
Desembrulhei-o com receio de estar a cometer uma inconfidência, mas quem sabe contivesse uma pista para o devolver. Li-o, entendi-o, percebi que  tinha tido coragem para o escrever mais faltara-lhe essa mesma coragem para o dar a ler, numa contestação, numa revelação. Voltei a amarrota-lo, coloquei-o no cesto dos papeis, com a esperança de que ele fosse apenas o ensaio do que iria passar para a oralidade e não apenas mais uma mágoa emudecida.
Afinal, quantos sons não existem calados à espera de ânimo, de audácia, para ultrapassar os seus medos e conquistar o direito, a liberdade de ser-se quem se é?…