terça-feira, 10 de abril de 2012

Post.it: Heterónimos

Uma conversa que não foi de café, mas de sofá. Exigia um lugar mais tranquilo, mais intimo. Porque era de intimidade que falávamos. Amigas, diferentes, com algo em comum, a procura, a descoberta, a entreajuda, em suma a amizade. Chamei-lhe heterónimos, porque no fundo, mesmo que lá bem no fundo todos temos um pouco de cada uma delas nos dilemas da nossa existência.
“Por vezes sinto-me fora do tempo, deste tempo civilizacional que nos consome a alma, o alento, a esperança. Sinto-me fora dele porque ainda acredito que nem tudo é tão mau quanto parece, que a vida não existe em nós para ser complexa. Ainda acredito em palavras plenas de conteúdo. Ainda creio que um abraço é muito mais do que um gesto mecânico e que transporta generosidade e carinho. Ainda acredito na amizade sincera e no amor verdadeiro”
“Realmente não és deste tempo, nem deste espaço terrestre. Acreditas no que queres acreditar e não necessariamente na realidade que te rodeia. Vives com o coração sempre a saltar do peito. Tens que travar esse ímpeto de agir emocionalmente. O que ganhas com isso? Dissabores, desilusões, mágoas que acalentas no berço onde apenas deve crescer alegria.”
“Mais do que isso, acrescento eu, porque já aprendi muitas lições na vida. Já estou doutorada em questões do coração e tenho um mestrado em reconhecer os bons conselhos da razão. Sabes que mais? Faz da vida uma viagem de comboio. Observa a paisagem mas não desças em todas a estações. Escolhe poucas, escolhe com  o critério do que será bom para ti e não para os outros.”
“Conversa da treta!, lamechices!  Mas vocês ainda se debatem com dilemas existenciais? Saiam dessa! Vivam cada dia como se não existisse amanhã. Façam tudo para serem felizes  porque podem não ter outra oportunidade. Amem mas partam antes que seja o amor a partir. Lutem, conquistem o que desejam, se nesse caminho existirem outros, azar, ultrapassem-nos. Acreditem que eles vos fariam o mesmo.”
“Quanto a mim escolho o meu canto, o meu recanto de paz. Se não chegar ao topo aproveito para tornar a base num espaço aprazível. Se não conquistar um lugar ao sol, fico-me pelas sombras, sempre são mais refrescantes. Não me importa o que desejaria ser, mas o que sou, este rio de tranquilidade em vez de um mar repleto de tempestades. Quanto aos outros, vou citando, “Façam o favor de ser felizes”, comigo ou sem mim, porque eu “Fui ser feliz e não volto”.

6 comentários:

  1. Anónimo10.4.12

    Todos temos um pouco destas ideias, não numa multiplicidade de personalidades mas de momentos. Do que fazemos e pensamos que poderíamos ter feito de forma diferente. De decisões e arrependimentos porque o resultado não é o esperado. Chama-se a isso, crescimento, aprendizagem. E talvez o culminar seja a maturidade de reconhecer o valor do que se é sem desejar ser de outra forma. A aceitação e o burilamento do que somos. Para não darmos às coisas/situações a importância que elas não têm. Por fim, talvez a calma, que não é desistir, que não é acomodação, mas o aproveitar para ser feliz como se é e com o que se tem.. Bj. Sandra B.

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  2. Anónimo10.4.12

    Hoje é que me deixaste emudecida. De prazer e de espanto. Gostei é verdade, mas fiquei sem saber como interpretar. Serás tu, seremos nós que ali estamos? O que importa é que nos ensine algo e sinto que aprendi. Obrigada. Filomena

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  3. Anónimo10.4.12

    Senti-me retratada em todas elas, no que sou e no que desejava ser, quem sabe chego lá e depois posso dizer com tranquilidade de rio, “Fui ser feliz e já não volto” Beijocas, C.

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  4. Anónimo10.4.12

    Identifiquei-me com algumas declarações. Outras, desejei ter essa capacidade, principalmente de ser feliz e já não voltar. Bjs. A.

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  5. Anónimo10.4.12

    Profundo, forte, denso. Diferente do teu registo habitual mas igualmente bonito. José

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  6. Anónimo10.4.12

    Falas de mim? Quase acreditei que sim. Mas nem me conheces! Talvez sejamos (quase) todos assim.

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