quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Post.it: O baloiço

Dizem que voltamos sempre aos lugares onde fomos felizes. É uma necessidade quase uterina, o regresso, a recordação. A comparação do antes e do agora, a mudança. A sensação de grandeza, parece que tudo diminuiu de tamanho, quando afinal fomos nós que crescemos. Esses lugares, onde corremos, onde sonhámos não com o futuro, mas com a próxima aventura. Porque é-se assim na infância, despreocupado, corajoso, com desejos possíveis, que nos fazem saltar da cama mais cedo que o sol, e correr enquanto ele corre atrás de nós com medo que lhe roubamos o lugar no céu. E roubaríamos, tal é a nossa energia, “se pudéssemos voar”. E voamos, abrimos os braços e deslizamos pelo monte abaixo, rompendo o vento. Esse monte que agora nos assusta pela sua dimensão e perigoso declive. Quando é que perdemos o gosto pela aventura, quando é que começámos a ter medo? Esse medo que nos limita, enclausura. Confortamo-nos, com débeis justificações, dizendo que ganhámos juízo, será essa a razão?
Observo o parque vazio, toco com ternura aquele baloiço de madeira carcomida, agora vazio, abandonado. Já foi o meu palco de ilusões, sonhei voar e voei, toquei o céu, senti o infinito agarrei-o na mão, guardei-o no coração. Hoje só recordo o final da viagem, a queda, o braço partido. Mas naquele momento que durou a infinidade de uns segundos, senti a liberdade do corpo e da alma.
Empurro-o com nostalgia, velho amigo, não te culpo das minhas desventuras, culpo-te de não teres continuado a baloiçar dentro de mim, de me teres abandonado, de me teres deixado partir, de não teres esperado por mim, brilhante, de madeira polida, como se o tempo não tivesse passado.
Mas passou, hoje, ofereces-me um último baloiçar, num silêncio triste. Sento-me receosa que não suportes o meu peso no teu acento enfraquecido. Permaneço, recordo. Obrigada, velho amigo, pela infância que me permitiste ter, agora sim é hora de partir mas sem nunca te dizer adeus, afinal, fazes parte do que sou.

6 comentários:

  1. Anónimo11.8.11

    Gostei. Mas gostei mesmo. Que mais posso dizer, perante uma pessoa que tem todas as palavras, eu fico sem nenhuma. Bj, Leonor

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  2. Anónimo11.8.11

    De vez em quando é bom voltar a ser criança. Até fiquei com vontade de me balouçar mesmo que depois caísse no chão. É verdade, perdemos a espírito de aventura com medo de nos magoarmos. Beijocas C.

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  3. Anónimo11.8.11

    Também tenho histórias destas para recordar, dos penedos da minha terra, das quedas que deixaram mais risos que lágrimas, essas secam depressa, enquanto o riso fica para sempre na recordação. Bjs, Amália

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  4. Anónimo11.8.11

    Por momentos deixei-me embalar, essa é uma das características dos seus post.its, fazer-nos pensar, reflectir, recordar, viajar pelo sótão da memória e como se adivinha o meu é enorme. Gosto muito destas viagens interiores que nos proporciona. Obrigada. Um grande beijo, Adelaide

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  5. Anónimo11.8.11

    Que bonito este texto, até me fez suspirar, as recordações que me trouxe.

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  6. Anónimo11.8.11

    Adorei, obrigada pelo passeio até às recordações da infância

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