quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Post.it: A herança genética


“Tem o nariz do pai”, foi logo herdar essa parte que é nele a mais feia. “Tem os lábios da mãe”, felizmente que ficou com essa semelhança. “De feitio é mesmo o avô”, teimoso, como só ele, “mas também a benevolência da avó”. “Claro que tinha que receber os tiques do tio, bem que eu gostaria que tivesse recebido a inteligência da tia”.
Mas no conjunto, é bonito, não sei onde foi buscar tanta beleza, é generoso, simpático. E no geral tem o equilíbrio necessário para se tornar um filho de quem os pais se possam sempre orgulhar.
Na  infância os  traços são ainda ténues mas perceptíveis  ou adivinhados dessa herança genética,  uma herança que perscrutamos ansiosos por conhecer aquele pequeno ser que ainda mal sabe pronunciar meia dúzia de palavras. Depois como num quadro de pintura, os traços vão ganhando expressão, as sombras vão definindo os contornos, aumentam as palavras, crescem os silêncios, tentamos aqui e ali encontrar semelhanças tranquilizadoras de alguém que conhecemos. “A quem terá ido buscar tão mau feitio?” Procuramos na árvore genológica, sem encontrar a similaridade. Por fim compreendemos que começou a cortar os laços, que adquiriu a sua personalidade, “ou será das companhias?” Ainda hesitamos. Não, não adianta procurar causas, apenas soluções, contornar aqui e ali altos e baixos e continuar a sorrir, a descobrir que ele é mais, muito mais do que o herdeiro do nariz do pai, dos lábios da mãe, é talvez todo o tempo que lhe dedicámos, todos os sins, todos os nãos em todo o amor que continuamente lhe demos.


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