sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Post.it: Chamaram-lhe alienado


Eremita, ascético, místico, mas não triste, não perdido na sua ilha de solidão. Apenas alguém que decidiu viver de uma forma diferente. Ausente de tudo e de todos. Rompeu com a indeterminação, avançou, fez a mudança, concebeu a diferença. Porque na realidade não escolhemos, movemo-nos para onde os outros vão, ainda que digamos que não. A indeterminação é uma devoção que se rende acriticamente aos fluxos de gostos dominantes, a que chamamos dimensão comunitária ou, simplesmente, moda. Mas este ser resoluto, apagou a televisão, desligou o pc e o tlm, abriu as janelas, encheu a casa de sol, deixou entrar nela a natureza e viu-a pela primeira vez com o seu olhar de ser renascido. Viu uma imagem diferente, verdadeira e não digital, cheia de vida e não de pixéis. Fechou as torneiras e banhou-se na frescura do rio. Arou o solo, semeou o pão, comeu-o sentindo o sabor da essência natural da terra. Conversou com as nuvens, abraçou as flores. Contemplou os pássaros e fez silêncio para escutar a sua melodia.
De vez em quando desce à “civilização”, olham-no como se fosse um alienado, ri-se por dentro, desses olhares que se desviavam à sua passagem.
Dessa sociedade empedernida que não tem coragem de reconhecer que muitos dos frutos que está a colher são resultado do modo como semeou. Que é preciso estender a mão, segurar o ramo e caminhar como raízes de árvores. Devagar, mas firmemente em busca da seiva da vida. Em busca de si no mundo, descendo ao magma da existência. Para compreender  o que é verdadeiramente importante e o importante é encontrar a paz. Para que a vida seja vivida em harmonia com todos os seus elementos e que seja sempre construção e não destruição.
Chamaram-lhe alienado, por não compreenderem a sua felicidade. Estão demasiado habituados a ser infelizes e a viver a conta-gotas de alegria.
Chamaram-lhe alienado por inveja da sua liberdade. Viraram-lhe as costas com desprezo e arrogância fingida porque na verdade desejavam segui-lo, libertar-se da rotina dos dias, do compasso das horas e caminhar descalços, deixando na terra as pegadas da sua livre escolha. A escolha de ser um feliz alienado.

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