quarta-feira, 21 de agosto de 2013

O Tejo da minha vida

Descobri há pouco tempo (santa ignorância!) que “Tágides” é o nome que Camões chama às ninfas do Tejo! Sim, passei pelo último ano do liceu logo a seguir à revolução dos cravos e não estudei os Lusíadas. Em vez disso, li Sofia de Mello Breyner e Alves Redol e Soeiro Pereira Gomes, que me fizeram olhar para o Tejo com outros olhos e amá-lo e, às vezes, querer odiá-lo.
Vejo-o correr há mais 50 anos, sempre ao alcance da minha vista, parte da minha paisagem quotidiana, da minha vida! E afeiçoei-me a ele e ao seu mar largo e brilhante ao sol, ou cinzento e ponteado de espuma branca de tempestade.
Chega a Vila Franca e as margens alargam-se, deixam-no espraiar-se por entre os mochões, diante do olhar, ora atento ora indiferente, das cidades apressadas e das lezírias planas e ciosas dos seus campos e das suas pastagens, dos seus cavalos e touros. Essas lezírias saudosas das searas e dos gaibéus, dos telhais e dos seus miúdos, dos avieiros e das suas redes, da vida que viveu entre as águas e as margens, tantas vezes galgadas e alagadas, enchidas de pranto e cobertas de lodo e lama. O pranto e a lama que fazem crescer e renascer a vida .
É deste Tejo, carregado de memórias de vidas que nele se fizeram e por ele vieram e partiram, que eu gosto e às vezes desgosto e me zango. Quando se esquece que é água de vida e leva quem ainda não pôde viver.
Não é culpa dele, certamente. Mas fico zangada. Não sei se com ele, que corre sereno à mercê de quem o olha e por vezes não entende, se com quem não se lembra que é rio forte e maduro, com rugas profundas onde a correnteza correr ainda mais, sem tempo para ver se há miúdos curiosos e inquietos, sedentos de água e aventura de quem os adultos se distraíram.
E apetece-me invocar as tágides - que aquietem este rio e cuidem de quem não lhe conhece a força escondida na mansidão das suas águas.