sexta-feira, 2 de outubro de 2020

O caminho


Tudo se esfuma na poeira do tempo, já não somos cada vez mais transformamo-nos num fomos. Neste chão onde andamos vamos pisando as pegadas de quem veio antes de nós, e aplanando o terreno para os que nos seguem, todos
fazemos o mesmo caminho, unicamente porque não há outro.
É o mesmo planeta, debaixo do mesmo sol, vizinho da mesma lua. Bem podem construir prédios, rasgar avenidas, arrancar as árvores velhas e plantar novas, tenho  a certeza de que a cada primavera, nascem as mesmas flores.
Já quantas vezes me cruzei com aquela papoila. Quantas e quantas vezes cheirei aquela mesma rosa. Há quantos anos ando a despetalar aquele malmequer na esperança de que um dia a última pétala me diga, bem-me-quer.
 Mas todos os anos ele renasce resplandecente de cor, espreguiça cada pétala  e desafia-me com ar trocista a tentar de novo, sabendo antecipadamente que vou perder.
A cada passo há pedras, também elas já velhas conhecidas, feitas de terra amassada com chuva, mar e lágrimas, cristalizadas pelo frio e o calor, moldadas pelo vento.
Cá estão elas no percurso, sendo o caminho que abraçamos ou rejeitamos  e as lançamos em outra direcção. Mas, passados poucos ou muitos anos dá-se o reencontro, tenho quase a certeza que já me cruzei com aquela pedra.
Está diferente, contudo reconheço-a, mais pesada, rugosa, áspera mas, tem algo daquele tempo, a forma como se aconchega na minha mão. Desta vez não a lanço para longe, vou levá-la comigo, não sei se tenho tempo para um novo reencontro, vamos ficar por aqui, cruzando memórias de um mesmo caminho.


 

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