sexta-feira, 15 de março de 2019

Post.it: Coração

Há noites em que o sono tarda e o sonho se recusa a inspirar-me a espera. Tudo parece estranho, vazio, escuro, silencioso, só a voz dos pensamentos qual roda dentada que ruidosamente se sobrepõe ao descanso que o corpo pede. De repente, quando a tensão diminui e permite uma consciencialização de maior pormenor, eis um ruído, não chega a ser barulho, não incomoda, antes parece que embala. Sustenho a respiração, ponho o ouvido mais atento, é uma batida suave e ritmada, como se realizasse um trabalho incansável, como se tivesse uma missão sem meta, e ele, bate, bate, bate, reconheço-lhe o som, que alegria de reencontro, de agradável companhia, sim, é o coração!
Imagino-o árduo trabalhador durante aquelas horas escuras, enquanto o corpo inerte descansa. Ele arregaça as mangas, mantém-se sério e concentrado na sua jornada, é assim de manhã até à noite, sem queixas, sem greves.
Neste momento sorriu, imagina se o coração fizesse greve, o que seria, eu nem teria tempo para lhe ouvir as reivindicações, ia desta para melhor, num ápice.
Porque, sim, ele tem a minha vida nas suas mãos; senti medo, senti um enorme respeito, amei-o pelo seu cuidado, por ser incansável, imparável até ao dia em que as forças lhe faltarem.
Reconheço que lhe devo dar muito trabalho, aí os doces, as batatas fritas, as autoestradas de vias que ele tem de limpar, filtrar, despoluir. E depois os sustos que quase o fazem cair no chão, ou as paixões  que o  fazem  partir-se em mil pedaços. 
Desculpa coração, nem sempre te dei atenção, não te escutei, obrigada por estares aí para mim. Batendo a cada tristeza, rejubilando em cada alegria, não sou uma companheira fácil, bem sei, mas ainda assim, acredito que não querias estar do lado esquerdo do peito de mais ninguém, pois não, coração?


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