segunda-feira, 13 de julho de 2015

Post.it: Cheia de abraços

“Tens a camisa amachucada”, sim mas não faz mal, pelo contrário, faz bem. Tenho a camisa amarrotadas de muitos e longos abraços, tantos saudosos, tantos amorosos, tantos chorosos. Fazem parte da chegada, fazem parte da despedida. Um adeus que nunca conseguimos dar de coração leve. Um olá que não chega para compensar as saudades de tantos e tantos anos de distância. “Há quantos anos que não te via? “Trinta? Como o tempo passa”. “Estás na mesma, alguns cabelos brancos”. “Simpatia a tua porque são muitos, quase tantos quantos os dias desses 30 anos”.
Temos que deixar de nos encontrar assim, repetem, uns, outros e mais outros, sempre em funerais, porque para as festas nunca temos tempo, o emprego, os filhos, enfim nós e a nossa vida…
Para a morte teremos sempre tempo, para a dos outros e certamente para a nossa. Aí paramos, pensamos, sentimos (se tivermos tempo para isso).
A morte com tudo o que traz de tristeza, de afastamento, tem o seu reverso,  une, ou melhor reúne, a família que se encontra espalhada de norte a sul e além das fronteiras nacionais, os amigos e até os desconhecidos, porque depois de 30 anos, já mal sabemos quem é quem, nos entretanto do caminho,  a família foi aumentado com os casamentos, com os filhos, eles também já quase com 30 anos e com a sua própria descendência.
Onde tenho andado perguntam-me, pergunto-me, e a resposta parece ser sempre a mesma, tenho estado aqui tão perto, mas tão perto que em muitos momentos me pareceu longe. Momentos da nossa vida em que fomos na direcção oposta, em que fomos mais longe e ainda assim, não parámos a meio, sabe-se lá porquê, até porque no coração cresciam as saudades. Foi preciso aquela urgência, aquele medo que alguém partisse, foi preciso que nos dissessem que tínhamos que nos unir num abraço de solidariedade, de coragem, de incentivo como foi aquele jantar de primos há 10 anos, éramos bem mais de 30, mais de 60 braços estendidos para estreitar os sentimentos, as recordações, a vontade de transmitir um pouco de eternidade. E nesse momento sentimos que unidos vencíamos a doença, a dor, o medo, e vencemos.
Agora, aqui, toda a nossa força junta não chegou, a morte venceu, dizem alguns com profundo pesar. Não, dizem outros num tom de voz trémulo de lágrimas, a morte perdeu, venceu a vida, a que teve e a que espalhou em amizade, a prova disso é que aqui estamos, agradecidos e dizendo-lhe um “até breve”
Cheguei a casa, olhei para a minha camisa, não, não está amachucada apenas cheia de abraços, quem me dera guarda-los, na camisa não posso, mas vou guarda-los bem dentro do peito. Espero que não por mais trinta anos para os acrescentar a outros, espero que não seja preciso mais uma despedida para me amachucarem muitas e muitas vezes a camisa.


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