sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Post.It: Urbanidades interiores


É curioso este olhar que olha para fora e  tão pouco  para dentro, não de si,  porque esse é um olhar que tem de ser feito por vontade própria, mas para quem está próximo, à distância apenas de um olhar.
Uma distância que por vezes se perde no horizonte das rotinas, das coisas práticas, da organização, da gestão, do capitalismo, da visão de um todo onde se perde a de cada um.
E bastava uma palavra que diz, sei que estás aqui!. Um sorriso mesmo que só transpareça na expressão dos olhos. Um parar mesmo que não seja para ficar.
Quase invejo essa rua, esse alguém que entra e tem um lugar reservado à sua liberdade de ser, de sentir, de se expressar. Todos são importantes, quero acreditar que sim, mas na verdade, eles são mais. Porquê? Porque motivam, porque desencadeiam ideias, porque provocam, estimulam, entusiasmam, são o estranho que querem conhecer. A mim? A mim já me conhecem, já não lhes trago novidade, e, no entanto, pergunto-me, silenciosamente, pergunto-lhes na mesma ausência verbal, que sabem de mim? Quem sou, de onde vim, que caminhos percorri, que vitórias, que fracassos? Que ideais vislumbrei, que esperanças criei, o que falei, o que calei?
Há um diálogo a muitas vozes, que quero escutar, quero falar com elas, sobre elas, sobre nós,  mas apenas escuto o silêncio misturado com o som gritante dos meus solitários pensamentos.
Abro as asas lúdicas que querem escrever nos altos céus com ânsia de comunicar, de partilhar vontades, projectos, sonhos de um amanhã que envolva todos, sem uma hierarquia limitadora, sem empatias elitistas, sem diferenciação etária, sem exclusão, sem solidão. Mas falta-me um pouco mais de sol, um pouco mais de azul, talvez um golpe de asa para eu ser alguém.
Há um convite a quem passa, entrem, vamos conversar…
Estou cá dentro mas sinto que estou lá fora, sem passar da porta, sem vislumbrar janelas abertas, um sem abrigo sem (o vosso abrigo). Tenho urbanidades interiores caladas no peito, querem falar, querem ser ouvidas, querem ver, querem ser vistas. Quem sabe um dia, se olharem não só para a rua mas também para a soleira da porta.



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