Falamos
tanto que nos esquecemos de ouvir. Deves ter coisas para me contar dos teus
desertos, dos teus passos cansados, das páginas que viraste, das lembranças, do
esquecimento. Porque tudo o resto já sei. Os sonhos que desenhaste nas nuvens
e que nunca aterraram, “nem nos dias de nevoeiro”, dizias tentando gracejar.
Bem
sei que te afoguei nas minhas teorias, e tu encolhias os ombros, incapaz de as
refutar.
Percebias
que era o furor da fugaz adolescência,
as primeiras pisadas na vida adulta. Quando eu achava que sabia tudo e tu
dizias que não sabias nada, nem sequer para onde ir. A minha escolha estava
feita, queria ser intelectual, “mas isso é lá profissão?! Rias com ternura
perante a minha orgulhosa ingenuidade, “Sei lá, mas quero pensar, filosofar,
emaranhar-me nas teorias e extrair delas a lógica das coisas”.
Tu, fazias silêncio, não me contavas os teus
planos. Pareciam-te demasiado simples perto dos meus, afinal, apenas querias
ser feliz, encontrar a tua alma gémea e em conjunto rumarem placidamente em
direcção a um futuro perfeito.
“Fantasias” clamava com jovial desprezo e tu baixavas os olhos envergonhada das
tuas cálidas emoções.
Hoje
sou eu que baixo os olhos com vergonha da minha altivez, bem sei que faz parte
do crescimento, da necessidade de afirmação, mas não, não quero fazer disso uma
explicação para me alhear da minha culpa, da minha indiferença. Hoje
já não quero falar, percebi que sabia melhor ouvir, aprender sem julgar. Tenho
saudades das tuas fantasias, tenho inveja da tua capacidade de acreditar e de construir. Porque tu construíste um
lar, enquanto eu, semeei no horizonte flores de solidão.