“Sou
um lugar-comum, eis o que se me apraz dizer sobre a minha pessoa. Mulher cheia
de queixumes, cada vez em maior número, porque a idade não perdoa, quando aqui
e ali o ‘caruncho’ vai conquistando território. Vivi os meus dramas, chorei os
meus rios, bom sejamos verdadeiros, assemelharam-se mais a mares, não, não te
rias, já sei o que quer dizer esse sorriso, está bem, rendo-me foram, oceanos.
O que queres, tenho as lágrimas à beirinha do coração. Sou uma viciada no amor,
pelo marido, pelos filhos, pelos netos, pelos amigos até pelos estranhos que me
tocam a alma e me fazem sair pela noite fora, distribuindo comida, cobertores
ou apenas afeto.”
Quando
a olho, reconheço-lhe, mais muito mais do que uma descrição aparentemente
amarga, algo de diferente, algo que me prende a atenção. “Mais uma ruga?”
Riposta no seu humor jovial, confundindo-me com um sorriso de quem já nada
teme. Sim, talvez seja uma ruga, essa marca profunda que me diz algo de novo
sobre o seu caminho. Com se o rosto nada mais fosse do que um quadro onde o
tempo foi rabiscando esboços que ganham expressão e vida. “Gentileza tua,
encontrar no declínio dos meus dias tal encanto, tal beleza que te prenda o
coração por esse singular laço que é a amizade”.
Se
soubesse usar a magia das palavras, se eu tivesse o dom de as oferecer como se
fossem flores oferecia-lhe uma primavera, para que fosse apenas sua, e que nela
permanecesse indefinidamente sem sentir a dureza das outras estações. Porque já
as conheceu todas, demasiadas vezes.
Como
não tenho semelhante dom, resigno-me a manter um silêncio constrangedor na
esperança que o sinta com respeito e ternura. Um silêncio que lhe quer
assegurar uma certeza, “Quando os dias declinam, erguem-se os encantos da
noite”. Pessoas assim, nunca serão um lugar-comum, mas antes um lugar onde nos
sentimos bem em estar e regressar o mais breve possível.
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