Outro
dia no autocarro sem ter mais nada de importante para fazer, afinal, a paisagem
vista da janela é sempre a mesma, as lojas são sempre as mesmas, bem não será
bem assim, em cada mês há sempre alguma a fechar. Mas dizia eu que apesar de
tudo isso não tinha nada de importante para fazer, podem sugerir-me que leia,
mas a verdade é que fico completamente enjoada, assim sendo lá ia dando uma
espreitadela pelo canto do olho para os meus companheiros de viagem, à minha
frente estavam duas crianças, não teriam mais de 10 anos numa animada conversa
riam e acusavam as características de cada um,
“ora, dizes tu que queres ser gangster
e ainda bebes leite antes de adormecer!?” O outro corou sem encontrar resposta
deu-lhe um valente empurrão, mostrando “que era o leite que lhe dava essa
força”, ou melhor que à falta de superior argumento partia-se para a
“ignorância”. Como os tempos mudam…
Já
dizia Luís Vaz de Camões, “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. Quando
era criança, os meus primos queriam todos ser cowboys, claro que eu preferia ser uma índia fugidia. Entre gritos
e gargalhadas lá íamos preenchendo os nossos ideais de infância. Nos finais do
século XIX, Teresa Cepeda e o seu irmão Rodrigo, crianças ainda de tenra idade
(7 e 6 anos respectivamente) fugiam de casa perseguindo uma ideia de
felicidade, queriam, porque queriam, tornar-se mártires.
Que
loucura, diríamos hoje, que coragem, que beleza de espirito consideram
certamente naquela altura.
Os
meus primos, nunca chegaram a verdadeiros cowboys,
nem eu a índia. Aqueles miúdos do autocarro, espero que não se tornem gangsters e continuem a beber leite ao
deitar. Quanto à Teresa Cepeda, não se tornou mártir, foi para carmelita e hoje é recordada como Santa Teresa de Ávila.
Estranhos
são os desígnios da vida, dos sonhos que abandonamos pelo caminho ou que
levamos pela vida fora.