Neste
fim de semana tudo me corria mal, o relógio parecia divertir-se com a minha
tentativa para o acompanhar, com o meu efémero desejo de o ultrapassar, mas
nada feito, todas as marcações resultavam numa infinita espera. Senti-me, salvo
a enorme distância e a absurda comparação, como no tempo da 2ª Grande Guerra em
que se tinha de ir para a fila de tudo. Mas lá estava eu na fila para o
cabeleireiro folheando vorazmente uma revista da moda. Depois na fila da
farmácia, seguidamente na fila da costureira, passando pela fila da gasolina.
Tentei acalmar-me na fila do café, mais que não fosse na ante-visão de
satisfazer o vício. Por fim a minha manhã parecia ir terminar na fila da caixa
de supermercado, porque tinha estrategicamente evitado a fila do peixe e da
carne. Fiz a minha escolha de caixa num raciocínio de lógica quase matemática,
só estava uma pessoa à minha frente, suspirei, será que vou conseguir recuperar
o tempo já perdido? Será que vou ter um bem-sucedido encontro com os ponteiros,
tudo parecia indicar que sim. Mas havia uma suspeita a tilintar-me por dentro,
a campainha da intuição obrigou-me a dirigir um olhar mais atento à pessoa que
estava à minha frente. Não sei descrever a sua imagem, o aspecto físico, a
expressão do rosto, o que vestia ou outros detalhes porque na realidade não
lhes dei importância. A minha atenção foi dirigida aos gestos, à lentidão da
acção e sobretudo à extrema, mas mesmo extrema arrumação de cada produto sobre
a passadeira da caixa. Tentei perceber o que dava tanta harmonia à disposição
dos produtos: seriam as cores, a
dimensão, a forma redonda e quadrada? Não encontrei resposta. Meio curiosa,
meio hipnotizada, já a imaginação me dançava uma valsa lenta entre células e neurónios.
Será que a sua vida seria assim tão arrumada, os seus pensamentos, os seus
sentimentos, desejos, vontades? Será que arrumava a tensão sem “roer as unhas”
nas filas de espera? Será que dava aos outros essa mesma calma, essa mesma
harmonia? Invejei-a, queria tanto ser como ela, calma, ponderada, harmoniosa,
caminhar sem urgência como se soubesse que não precisava ter pressa porque a
meta estava à minha espera. Uma meta de sucesso, de alegria, de felicidade. Uma
meta concretizadora de sonhos, uma meta com alguém que faria sempre parte da
minha vida e de mim, sem ter lutar, sem ter de fracassar, apenas e sempre
caminhar firme e serena.
Mas
o relógio tirou-me desse doce torpor, o almoço estava à espera para ser feito,
as visitas deviam chegar na hora marcada e ainda havia tanto por fazer. Como não
tinha começado a tirar as minhas compras do carrinho do supermercado, fiz uma rápida
inversão de marcha e mudei de caixa, mudei de fila, que apesar de ter maior
dimensão, estava cheia de gente apressada como eu. Pessoas stressadas como eu,
pessoas que não saboreavam o tempo como eu. Pessoas que não tinham harmonia,
que não tinham calma, que não tinham tempo.
Se
um dia a voltar a encontrar, vou pedir-lhe que me ensine a saborear o prazer de
cada dia. A apreciar a beleza da viagem sem me preocupar com a chegada. Afinal,
o futuro, seja qual for, pertence-nos, e o presente passa demasiado rápido para
que desperdicemos a oportunidade de o viver.