Deixa-me
falar-te de tudo aquilo que nunca lhe direi olhando nos olhos. Chama-lhe
timidez, chama-lhe orgulho magoado, chama-lhe receio do fracasso. Chama-lhe o
que quiseres, porque não irei ouvir. Escondo-me em ti, meu diário, confessor
dos meus dias, omissor das minhas noites. Contador das minhas histórias, das
minhas guerras, das minhas, poucas vitórias. Guarda nas tuas páginas os meus
segredos, porque hoje, vou escrever tudo aquilo que gostaria de lhe dizer.
Hoje,
vou abrir-te o coração, vou oferecer-te os meus mais ternos ensejos e afogá-los
nos mais loucos beijos. Tenho tanto para te dizer, tantos sonhos para repartir
contigo, tantas fantasias para viver contigo. Tantos planos, tantos momentos
que crio só para nós. Guardo no olhar todos os pôr-do-sol que poderíamos
partilhar. Todas as primaveras que veríamos florir. Todos os verões mergulhados
na frescura do mar. Todos os outonos
caminhando numa passadeira de folhas caídas. Todos os invernos à lareira bebendo
um cacau entre gargalhadas quentes. Sim, porque nos idealizo felizes, sem
pensar na chuva que cai lá fora, que desce pelas ruas. Não nos importa o
lamento uivante do vento apelando para entrar nas nossas vidas e a
revolucionar.
Deixa-me
confessar-te que perco os sentidos quando imagino o calor das tuas mãos
aconchegando as minhas, não, não te rias por elas serem pequeninas, sabem fazer
tantas coisas, não sabes quantas… Mas não te guardo segredos, as minhas mãos
podiam oferecer-te um arco-íris para fazeres dele um colar; podiam trazer-te
uma nuvem para descansares o teu cansaço do final do dia; podiam recolher
algumas estrelas do céu para iluminar o teu leito quando fosses dormir.
As
minhas mãos são pequeninas, é verdade que são mas não adivinhas como elas
escrevem numa velocidade vertiginosa todas as palavras que o coração lhes dita
com ânsia para te oferecer.
Deixa-me
dizer-te tudo o que sinto. Antes que a razão me tolde os sentimentos e venha
como uma mãe sensata roubar-me a ternura do momento. O único momento que me
pertence, o único ideal que detenho. A herança que te deixo da minha parca
existência. Esta poesia meio louca.
Estes
laivos de dor/ A que poderia chamar amor/ Sinceros e desordenados/ Tantas vezes,
desapontados/ Desesperados de esperança/ Que deixo aqui, nesta lembrança.