Busco
um livro sem final, para acrescentar o meu. Procuro um livro sem fantasias
porque a realidade também pode ter um final feliz. Basta escolher o caminho
certo, tomar as decisões mais correctas. Basta seguir o coração, e, ir com ele
para além da razão. Não garanto que seja fácil, não garanto que tudo dê certo, vai
ser preciso lutar, contrariar os ventos e as marés. Vai ser preciso circular
por vezes em contra-mão, desafiar os perigos, magoar-se, arriscar. Seguir em
frente mesmo quando nos apetece parar e conformar-se com o que é fácil. Acreditar,
acreditar mesmo quando não há certezas. Quando a dúvida nos asfixia, quando
todos nos gritam que não e nós sussurramos no último fio de voz um sim em que
queremos confiar. Mesmo quando já não temos confiança e, no entanto continuamos
a caminhar naquela direcção, a deixar que a lua nos roube o sono e nos encha de
um breu mau conselheiro. Mas o sol volta a dar-nos ânimo e esperança, por vezes
uma nuvem tenta ocultá-lo na sua majestosa escuridão, mas há sempre um raio
mais persistente, mais teimoso, que rompe o nevoeiro e sorri-me num gesto de
incentivo que diz “continua, não pares, eu vou à frente para iluminar o túnel”.
Então caminhamos, cegos de cansaço, mortos de desesperança, mas firmes no
voltar de cada página, porque o final da história aguarda-nos como uma meta
pronta para ser cortada.
Ergo
os olhos exaustos da leitura, descanso o coração empolgado pela memória
daquelas linhas, outros olhos observam-me, olhos muito abertos em suspense da
continuação, ávidos por uma conclusão “E então, e então, o que aconteceu
depois?”. “Meus queridos netos, o depois fica para amanhã que agora já estou
cansada de ler”. “Oh, só amanhã é que conheceremos a tua história e saberemos
se houve um final feliz? Ainda falta tanto tempo para amanhã”. Os jovens,
sempre tão impacientes, como se o tempo não corresse a seu favor, quando tudo,
mas tudo corre na sua direcção. Mas não leio mais, não por cansaço como me
desculpei, mas com receio de os desiludir, de não encontrar na minha história
um final feliz, apenas momentos de felicidade, que para os jovens famintos de
ventura lhes sabe sempre a pouco. Amanhã, certamente já refeita da emoção de
recordar as minhas memórias, invento-lhes um final feliz, para que continuem a
acreditar que o seu pode ser um deles.