Queria-vos
falar do Livro, não do seu conteúdo enquanto veiculo transportador de um texto, mas
do livro como objecto histórico. Porque ele é muitas vezes isso mesmo. Hoje
quando, “passeamos” o olhar pelas estantes de uma livraria, somos atraídos por
um titulo, um autor, uma capa colorida. Mas no passado, o Livro antigo (obras
que datam de 1501-1800), tornava-se ele próprio, história. Porque encontramos
nele a história do seu caminho, do seu crescimento. Parece-nos estranho
compreende-lo assim, mas é verdade o livro também cresce ao longo dos anos na
informação que fica registada nas suas páginas. Desde o “nascimento” do livro
no Escriptorium de um convento,
passando pelo gráfico, um trabalhador ambulante que andava de terra em terra,
procurando alguém que com algum poder económico lhe encomenda-se a confecção e
reprodução de uma obra. O gráfico que sem oficina ainda e com parcos conhecimentos literários, revelava
vastos conhecimentos da sua arte, para colocar os caracteres móveis na forma
inversa que depois iriam surgir direitinhos na grande folha de papel que
dobrada em diversas partes iria constituir um caderno, sem trocar a ordem
natural do texto, porque raros eram os livros desta época que tinham paginação.
Cadernos que permaneciam assim para serem vendidos, sem serem cozidos, ou
encapados. Cabia a quem o adquiria encomendar uma capa, mais rica ou mais
pobre, em pergaminho, pele, ou tecido,
com brasão incrustado a ferro quente ou letras em fio de ouro. Quando o
folheamos, estes detalhes surgem silenciosos à espera de uma observação e lenta
atenta, minuciosa, e porque não, carinhosa. O texto, esse, talvez seja supra conhecido
pelas diversas reimpressões, mas aquele exemplar que nos veio parar às mãos, é
único, tornaram-no exclusivo pela riqueza de pormenores. Alguns quando lhe
colocaram a capa acrescentaram mais um caderno com 12 dobragens correspondendo
a 24 páginas em branco, isto desperta-nos a curiosidade, mas a resposta surge-nos
evidente, o possuidor desse livro, quis acrescentar a sua opinião sobre a obra,
inspirar-se nela para os seus escritos ou torna-lo um diário dos seus desabafos.
Alguns fazem-nos sorrir pela cortesia, ou pelo tom irónico. Com que mágoa, com
que delicadeza viramos cada página, encontrando aqui e ali marcas da sua
vivência, assinaturas, dedicatórias, manchas de (lágrimas?) de (risos?) de
velas que o iluminaram nas longas noites em que fez companhia à solidão.
Páginas com texto desgastado de tão lido, de tão sentido.
E
o livro de hoje? Pouco nos diz, apenas é portador de um texto literário. Tem um
percurso de vida tão curto, tão desvalorizado, abandonado, lido e esquecido.
Poucos lhe acrescentam algo para o futuro, talvez uma assinatura, uma mera
rúbrica.
Poucos os levam até às próximas gerações. Sem
a durabilidade de materiais que tinha o livro antigo, perece depressa e sem
história.
A
história que o Livro já teve no seu longínquo passado, quando era um bem de
riqueza, sempre presente nas casas reais e elemento obrigatório nos saques, ao
lado do ouro da prata e dos diamantes. O Livro já foi um tesouro que se tornou nos
nossos dias, um bem de “consumo imediato”. Felizmente que ainda posso “ler”
alguns livros antigos e tocar ao de leve, a riqueza do seu passado.
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