
Ontem foi a
festa de despedida, hoje também eu sou livre para criar novas rotinas, acordar
devagar, viver o meu sonho do princípio ao fim sem abruptas interrupções.
Claro que
tenho muito planos: inscrever-me num ginásio, fazer caminhadas encontrar-me com
os amigos, fazer voluntariado, ir às comprar, viajar, viver aventuras, arranjar
o jardim, visitar os filhos, brincar com os netos, fazer pequenos cursos, jogar
golfe, ir ao cinema, frequentar festas, dançar, namorar, aprender a pintar,
escrever um livro de memórias, sorrir, sorrir muito.
Mas ontem foi
a festa, hoje quero apenas sentir a vida a passar devagar pelo meu corpo, pelas
paredes da casa. Há um novo e agradável silêncio, nem o relógio se ouve, o
rádio que relatava as notícias matinais está mudo, a televisão que actualizava
as informações meteorológicas está apagada. Nem a torneira pinga sobre o
lava-loiça de inox. Só os meus chinelos murmuram baixinho os segredos de cada
passo sobre o soalho. Depois um estar de ossos, uma dor que desperta devagar,
habitual companhia, coisas da velhice, penso conformada e sem queixume.
Ontem foi a
festa, merecida, confesso. Foram anos, muitos anos de vida dedicada, cumprindo
tarefas, horários e até para além deles. Os chefes chegavam e partiam, as
colegas vinham e iam, eu, permanecia, fiel àquelas paredes, com os olhos voando
para lá das janelas.
Mas isso foi
até ontem, hoje, depois da festa, há um novo amanhã para quem como eu inicia o
seu período de reformada.
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