Escrevo-te, parece tão fora de moda,
mas que fazer quando todos os outros meios por modernos que sejam não são tão
claros, íntimos, sensíveis ao que te quero dizer.
Porque
não falar contigo directamente, olhar-te nos olhos e revelar-te o que me vai no
coração? Não! Que susto, só de pensar apetece-me fugir, esconder-me num recanto
escuro e profundo, onde não me possas encontrar. E no entanto quero tanto estar
perto de ti, ser clara, luminosa, sem pieguices, como tu costumas dizer “chega
de pieguices”, tento mas de repente todas as palavras mesmo aquelas que penso,
repenso, analiso ao pormenor e que não me parecem lamechas, quando as ouço a
saírem-me da boca, têm esse tom que não queres ouvir, calo-me, e escrevo, no
desespero de conseguir acompanhar o pensamento, o sentimento que me fazes
sentir. Tão feliz, tão miseravelmente infeliz…
Porque para mim é tudo, és a minha
vida, os meus dias, horas, sonhos, pensamentos, ausências, momentos, és tudo,
tudo em mim.
Morro
de ciúmes, não, ciúmes não, é demasiado forte, dramático, vais rir-te, vais
quem sabe, fugir de mim, dos meus medos, das minhas inseguranças.
Tenho
inveja, sim, é isso, tenho inveja do ar que respiras e que te preenche os
pulmões, que te afaga os alvéolos, que te faz ruborizar o rosto. Tenho inveja
desse frio que te entra pelas narinas e se distribui por caminhos traçados da
tua anatomia. Tenho inveja, sim, confesso envergonhada, mas sim confesso.
Porque na minha fantasia, patética, dirás, queria ser o sabonete que todas as
manhãs te navega o corpo, que conhece cada recanto da tua pele, que inala o teu
odor, que conhece o teu calor.
Escrevo-te, disparates, bem sei, que
queres sou ainda menina, aprendiz nas artes do amor, anda faço esboços mal
traçados enquanto tu já tens na tua vida obras de arte que exibes com orgulho
de macho conquistador, não sabes, ou melhor, não queres saber da dor que me
causas, quando me olhas como me dissesses, “pobre criança, vê lá se cresces” e
eu tento “crescer” aliás tenho crescido, deito-me no sofá empanturro-me de
bolachas e chocolates que me alimentam o ego magoado.
Resta-me esta carta, que escrevo com
medo de escrever. Com receio de me revelar. Com medo de que ainda não tenha “crescido”
o suficiente para ti, que não chegue a ser
amada como já amaste outras. Vou dar-te a carta e pedir em silêncio, “lê-me,
lê-me de imediato, agora, não esperes, não me faças esperar! Não, não leias! Rasga
a carta, rasga-me o peito, os sonhos. Esquece que te escrevi, esquece que
gostei de ti, esquece que existo. Ou melhor que não existo para ti, que me vês
sem ver, que me ouves sem perceberes as palavras que te digo por entre aquelas
que escutas sem entender nelas uma só silaba da minha vontade”.
Escrevo, continuo a escrever, hoje e
talvez para sempre, agora, com uma estranha alegria. Agora com uma doce
felicidade, decidi que não te vou amar nunca mais! Não vou pelo menos dizer-te. Decidi, aliás, que
não te vou dar esta carta, porque é demasiado ridícula, não é? Não, não
respondas. Prefiro saber que sim mas, acreditar que não.
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