Conheces-me
os passos, os que dei, o que vou dando. Falo-te do caminho, desse que aos
poucos conquistei e que a custo vou trilhando. Conheces as minhas noites de
insónia, o que sonho acordada. Conheces os meus dias feitos de tão pouco,
quando era muito o que queria fazer com essas horas, que se transformaram em
anos sem quase os ver passar.
É
verdade que me vão faltando os passos, que se me vai diminuindo o caminho, vão
desaparecendo os sonhos, só a insónia parece aumentar e tornando cada vez mais
clara a noite. Se antes falava com o sol, se antes desenhava figuras com as
nuvens e percorria com o olhar fascinado o arco perfeito composto de cores luminosas.
Hoje tenho por companhia a lua, que vai mudando de posição a cada ciclo das
marés, também as estrelas vão dando a sua cintilante opinião, inquietas como se
fossem crianças a brincar com os próprios dedos das mãos.
Conheces-me
nos silêncios, enquanto esperas que as palavras surjam, que os pensamentos
fluam, que os sentimentos brotem do peito e se tornem audíveis ao teu luar.
Conheces-me
os abraços carentes de abraçar e o vazio desse espaço onde o vento se vem de
vez em quando aninhar.
Conheces-me
porque tens feito dos teus os meus passos, do teu, o meu caminho. Tens as
mesmas noites de insónia, quem sabe até os mesmos sonhos acordados, temos sobretudo,
a mesma amizade, que te faz conhecer-me, que me faz conhecer-te e gostar da tua
longínqua companhia.