Primeiro
havia o mundo, o sol, as estrelas, os mares, as árvores, os pássaros que já
cantavam as suas milenares melodias.
Nós, éramos apenas nada. Havia um passado,
histórias, guerras, derrotas e vitórias.
Mas
a vida vai crescendo, se antes era nada, depois é-se um, dois, três, milhares,
milhões. O mundo já girava sem nós, as pessoas, as terras e animais existiam
sem sequer imaginar que um dia chegaríamos.
O
mundo é imenso sem nós, tão imenso que nós, nos sentimos nada perante ele.
Entretanto,
chegamos, tornamo-nos parte, nem que seja no ser-se um entre muitos. Queremos
fazer parte do todo, mas descobrimos que somos apenas uma parte, que somos ímpar nesse universo de pares.
É
preciso crescer, por dentro, sem que isso se veja por fora. Do colo, saltamos
para o chão, damos os primeiros passos, tímidos, cambaleantes, sem destino.
Depois corremos para longe do nada para ficarmos mais perto de tudo. Se as
coisas correrem bem, podemos agora dedicar-nos à descoberta do nosso mundo
interno, a cimentar as emoções, a plantar razões, a conquistar corações, a
lutar pelas nossas visões.
Está
na hora de se deixar de ser ímpar e encontrar o que nos torne par.
Nos
encontros e desencontros, tornamo-nos dois, nem sempre é fácil, é preciso
ser-se livre para respeitar a liberdade do outro. É preciso saber quem somos
para reconhecer o outro.
Ser-se
dois não implica perdermo-nos de nós próprios ou fundirmo-nos com o outro. O que
nos liga uns aos outros é a comunhão de afectos, de projectos e de sonhos.
Depois,
uns e outros, acrescentam-se a outros mais e do nada que éramos, tornamo-nos
muitos.
Um
dia perto do fim do nosso mundo, se pensarmos que voltámos a ser nada,
lembramo-nos antes que afinal somos muitos, tanto quantos aqueles a quem
tivermos deixado a herança de um pouco de nós.
Porque
para se ser, primeiro somos nada, mas isso, é o que define os contornos do
caminho.