Naquele dia, ele correu mais depressa que o habitual. Naquele
dia, sentiu que voava, que o coração em alvoroço lhe saltava do peito.
Naquele
dia chovia mas nem sem importou por ficar molhado. Naquele dia tudo estava
igual, as mesmas pessoas na paragem, os mesmos cumprimentos, o mesmo atraso do
autocarro, mas para ele tudo lhe parecia diferente, havia um sorriso no rosto
de todas as pessoas ou era ele que o via mesmo que inexistente.
Tinha escrito uma carta de amor, a primeira da sua vida, mas
a idade, já avançada, não lhe tirara a capacidade de amar, de acreditar que a
felicidade ainda lhe podia acontecer.
Uma carta de amor, já não se usa,
pensava, mas achava que era nisso que residia a sua magia, a timidez de quem
escreve, a surpresa de quem lê e, depois, quem sabe, a resposta positiva mesmo
que não fosse em palavras mas na beleza de um olhar radiante de luz. Porque
ela, tinha esse olhar quando o olhava,
Chegou à paragem procurou desesperadamente aquele encontro,
mas ela não estava, talvez já tivesse partido, talvez ainda não tivesse
chegado.
Não perdeu a esperança, esperou, passou um, dois, três autocarros,
uma, duas, três horas e, nada. O seu olhar foi descendo, como uma flor que a
haste murcha.
De repente viu-a, a carta, caída no chão... rasgada!
Como ela, assim ficou o seu coração, rasgado em mil pedaços.
Nesse instante, o dia escureceu, a chuva chorou copiosamente, voltou para casa,
sentou-se no sofá, o gato saltou-lhe para as pernas, aninhando-se, pedindo-lhe
afagos.
Sorriu, sim, ainda conseguia sorrir, decidiu, amanhã vou mudar de
paragem, de autocarro, de percurso para o emprego.
Uma carta rasgada não pode significar um fim mas quem sabe,
seja o princípio de uma outra história, esta, com um final feliz…
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