Os
meus olhos são de mar, confundem-se por vezes com o céu, dizem-me que chegam a
escurecer nos dias tristes, quando a nostalgia se torna um barco e me navega.
Era assim que começava a falar de si com a voz arrastada das recordações.
Mas
eu, continuava, prefiro a segurança de um cais, digo que sou praia invés de
mar, essa praia deserta onde cresci, onde cresceu o meu pai e toda uma geração
que nos antecedeu. Nessa praia ainda encontro os maus passos; riem-se os amigos
desta frase; “são passos novos, os velhos foram levados pelo mar”, dizem-me,
mas eu, que vejo mais longe no horizonte, continuo a encontrar os meus passos
juntos com os da minha mãe, quando fazíamos longos passeios, os das
brincadeiras com os meus irmãos, outros mais adiante, caminham juntinhos,
suspiro, sim, são os meus e os do Miguel, que há muito partiu para, outras
praias…
E
o farol, cada vez que venho até cá, abraço-o. É um amigo, confidente, um pilar
da minha história, quantas vezes foi a minha força. Numa confiança que vem dos
tempos de criança, de que só ele sabe o caminho, a resposta silenciosa para as
minhas gritantes dúvidas.
O
areal, sempre o areal onde pousam as gaivotas, já não fogem à minha chegada,
desviam-se, dão-me um pouco do seu espaço, sabem que aquela também é a minha
casa.
Tudo
isto, sou eu, o ADN de que sou feita, que me circula nas veias com células
carregadas de memórias, de histórias que vivi, que conto, reconto e invento para adormecer a alma que à
noite se aconchega numa duna de sonho com um teto de luar sob o olhar luminoso
do meu velho amigo farol.
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