E depois do Natal?
Cabe a cada um cuidar da “prenda” que recebeu. Esse abraço quente, essa palavra
amiga, esse sorriso franco, esse olhar que nos olha nos olhos. “Prendas” que
esperámos o ano inteiro, que tardaram, dizem uns; que chegaram na hora certa,
dizem os que as sabem receber. Porque até para receber é preciso saber. Receber
sem criticar, sem analisar, sem esperar mais.
Porque receber é também dar, dar
o agradecimento dessa chegada, dessa lembrança, dessa partilha. Lembro-me
tantas vezes da minha avó “adoptiva”, das suas sábias e generosas palavras “tudo
o que é recebido com gratidão é também dado com o coração”.
Noutros tempos, quando
era miúda, ouvia esta frase e não a entendia completamente, soava-me a ternura
e por isso a acalentava no pensamento. Foi preciso crescer para não só a
perceber, mas também a sentir. Por vezes temos de “crescer”, para as coisas
mais simples nos começarem a fazer sentido dentro do peito.
Coisas simples como o Natal, não a data, a azáfama
das compras, a mesa recheada, as luzes a piscar. Porque se o Natal fosse apenas
isso, o depois era triste, doloroso, a expectativa áurea da chegada o desalento
da partida, os presentes transformados num monte de papeis rasgados, a mesa replecta de pratos meio vazios, as
luzes ainda a piscar em cores solitárias.
Felizmente, o Natal
é mais, muito mais do que isso. É a mensagem que nos fica a dançar nos
sentidos, que nos faz prometer coisas que nunca conseguimos cumprir na sua
totalidade, mas que desejamos tanto manter.
O calor daquele abraço que nunca
vamos esquecer, aquela palavra que fez todo o sentido no nosso rumo, aquele
sorriso que nos prolongou a esperança mesmo que se torne um dia apenas
lembrança, e aquele olhar, sim aquele olhar que nos diz tanto sem usar as
palavras cansadas de serem ditas e por vezes esquecidas de serem
verdadeiramente vividas.
Não, o Natal não é fingimento, o Natal não é ficção,
obrigação. Natal é como estamos, por
vezes com lágrimas, com solidão, com doença, com uma certa escuridão, mas Natal
é também o que somos, a capacidade de transformar a dor em ternura, a solidão
em carinho, a doença em luta e esperança na vitória e encontrar algures em nós a luz do caminho.
E depois do Natal?
Volta a questão. Natal não deve ser um final, mas um começo. Abrimos as “prendas”,
está na hora de as apreciar, de lhes dar uso. Vamos desembrulhar a esperança, desenvolver a confiança, conservar a expectativa, aumentar o ânimo,
guardar o alento, ampliar a fé, estimular
a coragem, sonhar mesmo quando a realidade nos acordar e acreditar
que o Natal não tem um antes e um depois mas um contínuo presente.
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