Ser pai é mais do que comprar as fraldas, é também mudá-las quando estão sujas. Ser pai é mais do que comprar as papas, é também sentar-se e dar-lhas, colher a colher. Ser pai é mais do que ir visitar o filho ao quarto quando já dorme, é também contar-lhe uma história para adormecer, aconchegar-lhe a roupa da cama e dar-lhe um beijo de boas noites. Ser pai é mais do que o ver caminhar, é também ensinar-lhe os primeiros passos, evitar-lhe as quedas, abraçá-lo e incentivá-lo a seguir em frente. Ser pai é mais do que dar-lhe uma casa cheia de tudo, é também dar-lhe um lar repleto de amor.
Mas ele pensou que tinha tempo para tudo isto. Deu tudo por certo e seguro. Primeiro tinha que acabar o curso de Direito, conjugar os horários com o emprego e os estudos. Um dia teria a recompensa dos seus esforços, em tempo e bem-estar para a família. Um dia teria tempo para ser feliz com o filho e proporcionar-lhe tudo para alcançar a felicidade. Porque era em nome da felicidade que tudo fazia, que tudo adiava. Mas a felicidade não pode ser adiada, não pode esperar que alguém tenha tempo para a apreciar. Tinha tempo, repetia para si, tentando convencer-se que estava a fazer a melhor opção. Mas o tempo não esperou por ele, a família não adiou a sua vida na espera de que ele tivesse tempo para a viverem em conjunto. Soube-o um dia quando chegou a casa e encontrou apenas as paredes despidas, quando o silêncio o recebeu à chegada e os papéis do divórcio o aguardavam na bancada da cozinha. Passou a visitar o filho em fins-de-semana alternados. Sentia que era pouco, muito pouco o tempo que passava com o filho, porque uma distância emocional crescia entre ambos. Entretanto outro “pai” ocupava um espaço na vida do seu filho, um espaço que devia ser seu. Uma figura paterna que oferecia-lhe um tempo que ele, o pai, não tivera para lhe dedicar.
A vida seguia o seu percurso, entretanto, acabara o curso, arranjara um bom emprego e tinha agora um tempo que não sabia onde ocupar dentro da casa vazia.
No dia de S. José, também chamado, Dia do Pai, pendurou o diploma, no espaço da parede onde antes estavam as fotos do seu filho a crescer. Não ia passar o dia com ele, porque este, estava na escola e depois tinha o treino de futebol, mais tarde tinha os tpc(s) e por conseguinte, não tinha tempo para jantar com ele, com um pouco de sorte, quem sabe, o filho tivesse tempo para lhe telefonar ou mandar uma sms.
Sentou-se no sofá em frente ao televisor, olhou pela milionésima vez para o telemóvel mudo. Pegou-lhe, marcou um número, do outro lado respondeu-lhe uma voz familiar, uma voz cada vez mais gasta pelos anos mas ainda cheia de carinho.
- Olá pai, telefonei-lhe para lhe desejar um bom dia e saber como tem passado.
- Olá filho, ainda bem que telefonaste, estava mesmo a pensar em ti, queres ir à pesca neste domingo? Levas o meu neto, faz tempo que não o vejo.
Era assim que lhe falava, sem cobranças, sem queixumes, com a mesma alegria de sempre, e com a mesma disponibilidade para estar com ele, para lhe ouvir as mágoas e oferece-lhe uma palavra de conforto. Não tinha diplomas, mas tinha a sabedoria da vida, essa sabedoria que cresce em quem tem tempo para estar com a família, para a conhecer, apoiar e sentir. Numa casa que não tinha muita riqueza mas tinha sempre vozes de alegria, conversando, partilhando e construindo um lar onde nada faltava, nem tempo para ser pai.