O
problema é o Eu, não eu enquanto pessoa, enquanto ser social, mas o meu Eu,
ego, auto-estima, vaidade, desejo e vontade.
O
problema é o Eu, que exige direitos que quer que sejam seus, unicamente seus.
Que reclama atenções que acha, lhe são devidas, porque afinal esse Eu, é boa
pessoa, exigente mas generosa, custava que lhe dessem um pouco da medida que
dá?
Talvez
sim, porque quem recebe, nem se apercebe da dimensão de cada gesto, de cada
pensamento, de cada sentimento. Não percebe que cada letra escrita, cada
palavra verbalizada vem de dentro, não do espaço das banalidades mas da fonte
mais profunda, de onde brotam as
emoções.
Então
o meu Eu fecha-se dentro do peito, inventa a sua ilha e sonha que em algum
lugar existe um mundo mais verdadeiro, mais inteiro, mais palpável. Que em
alguém há num qualquer lugar do seu um coração que saiba sorrir, uma alma que
saiba dar de si sem querer apenas receber, guardar, e apreciar sem reconhecer, sem
retribuir.
Mas no fundo bem no fundo, o meu Eu sabe que
esse lugar não existe que esse Outro nunca será
um encontro. Que a vida é feita mais de desencontros do que encontros.
Que tudo neste universo de vidas é uma mera passagem, que tudo é finitude e que
mesmo o infinito de um momento único e belo nem sempre chega a existir.
Porque
por mais que façamos, por mais que nos reinventemos, adaptemos, tentemos conquistar
e quase ser idênticos aos nossos semelhantes, seremos sempre nós, e dentro de
cada um de nós, este Eu.
Um
Eu Honóris Causa, porque tem apenas
um direito constituído de aparências. Uma capa, que nos envolve o dia e
adormece a noite desamparada de coincidências.
Na
realidade estaremos sempre sós, apenas
nós e o nosso Eu, mais ou menos adaptado, mais ou menos feliz com as pequenas
coisas, mas também, quiçá, infeliz com todas as outras, perspetivadas,
ambicionadas, sonhadas, mas que tarde ou nunca chegam a acontecer.
Os
outros serão sempre os outros, mesmo quando entram na nossa vida, mesmo quando
marcam o nosso passado, mesmo quando definem o nosso presente, não os devemos
prender nem os tornar a causa do nosso futuro, um futuro que pode nunca
acontecer da forma como o idealizamos, como construímos esse que é apenas um
castelo de cartas. Não podemos viver com receio de ventos, de chuvas, de
intempéries que desmoronem os nossos sonhos, temos de construir as bases
sólidas
de
um castelo emocional para que não se desvaneça com a erosão do tempo, nem a
cada obstáculo, a cada curva mais apertada da nossa estrada de crescimento.
Como
o fazer? Talvez nunca o saibamos, vamos tentando descobrir em cada momento que
a vida nos proporciona.
E
um dia, talvez um dia o meu Eu se encontre comigo, num desses encontros felizes
em que a emoção e a razão fazem as pazes e partem de mãos dadas pela vida fora
num horizonte de Happy end(s)