Há muito que não me recordava daquela senhora de generosa idade e olhar complacente.
Nunca lhe perguntei o nome, mas gostava muito de a encontrar de quando em vez. Tinha sempre um sorriso desenhado nos lábios. O corpo já meio debruçado acusava o cansaço dos anos, mas insistia em continuar a trabalhar. Quando eu a via, ainda o dia mal acordara mas ela já tinha lavado as escadas do seu prédio e ia comprar uma carcaça para tomar o pequeno almoço. O bom dia vinha pronto e cheio de energia, um dia perguntei-lhe a idade. Fez um sorriso de menina e encolheu os ombros sem me responder, deixou no ar a incógnita que só o merceeiro desvendou. – Tem 91 anos, não parece pois não?
Parecia feliz, como se fosse possível ser feliz com aquela idade em que todas as dores e maleitas incomodam.
– Lá incomodar, incomodam. Respondeu-me. – Mas faz parte, já as conheço há tantos anos que nem lhes ligo. Porque cada dia é um presente e envelhecer não tem que ser triste, desolador, como os mais novos pensam. Não é um tempo de acabar mas de começar. Começar a andar devagar mas também a ver melhor o caminho, a paisagem à nossa volta.
A solidão, não tem que ser solitária se tivermos aproveitado a vida para fazer o que gostamos. Dessa forma guardámos recordações que nos fazem companhia.
Por vezes brinco e digo que no meu tempo de juventude não havia PPR(s). Mas que eu tive sempre o cuidado de ir juntando, não dinheiro que este mal chegava para o dia a dia, mas lembranças e criei o meu PPR (Plano Para Recordar)
Muitos idosos vivem tristes porque só guardaram tristeza.
Colocou-me a mão no rosto e disse sabiamente.
– Olhe, sabe o que lhe digo? Comece hoje a sorrir e a juntar sorrisos para no futuro recordar. E quando chegar à minha idade faça viagens de prazer e não de culpa.
Porque o que passou, passou. Recorde apenas o que de bom ficou…
Gostei do teu texto, tão positivo, tão doce. Que ideia genial guardar hoje para recordar amanhã. Quando a solidão passa a ser a companhia, os amigos e familiares já faleceram ou foram-se perdendo pelo caminho, restam as memórias, as pequenas alegrias que fomos construindo. Bom PPR, Bjs, Sandra B.
ResponderEliminarÉs uma pessoa com sorte encontras sempre pessoas tão bonitas, ou talvez seja a tua beleza interior que as veja assim. Obrigada pelo teu doce olhar. Bj, Rui
ResponderEliminarQue vontade tive de conhecer essa velhinha, imaginei-lhe o rosto e veio-me à memória a minha avó, teria 90 anos se fosse viva, que saudades. Bjs, Amália
ResponderEliminarQue avozinha deliciosa, de vez em quando cruzo-me com algumas, fico a imaginar as suas história, depois sigo apressada e esqueço. Tu vais sempre mais longe, páras, olhas, estendes a mão e ajudas (já te vi fazer isso) depois inicias o diálogo e nasce a história. Uma história de amizade e de esperança. Bjs A.
ResponderEliminarPerdoe-me se faço indevidamente esta ligação, mas pareceu-me que havia uma subtil relação entre a “saudade” poética, a melhor forma de vivermos a vida e concluindo com este PPR, é como digo subtil mas parece haver um encadeamento. Digo-lhe que são um conjunto de mensagens muito sugestivas e ternurentas. Na minha idade já não posso recomeçar mas depois de ler os seus textos, sinto que cada dia uma oportunidade para caminhar. Um abraço, Antero
ResponderEliminarQue excelente ideia vou começar a fazer o meu PPR. Não tem custos monetários e os juros são garantidos em recordações de bons momentos. Bjs, Leonor
ResponderEliminarAdorei essa vovó cheia de espirito juvenil. Vou seguir seu consehlo e guardar muitas recordações para quando precisar delas. Beijo, Marina
ResponderEliminarAdorei esta história, tive inveja dessa velhota cheia de energia. Quem me dera um dia ser assim. Bjs
ResponderEliminar