Nestas
férias o meu destino levou-me até uma aldeia na Beira. Uma aldeia distante,
perdida na serra. A ideia era descansar, fugir da cidade e dos seus barulhos,
mergulhar no silêncio e esquecer por uns dias o rebuliço da rotina diária. E
esta pequena aldeia com apenas 70 habitantes parecia-me a ideia perfeita de
paraíso.
Ali, para quem está de visita as horas parecem passar devagar, mas quem
lá mora, o acordar cedo para tratar dos campos, a rega, o amanhar das terras, a
recolha dos frutos. No final da tarde podiam por fim sentar-se no banco do
largo onde a solitária, mas frondosa árvore lhes dava sombra e abrigo à amena
cavaqueira.
Na paisagem surgiam as casas de xisto à moda antiga, umas de traça
original, outras recuperadas, pelo meio, salpicando a paisagem novas arquiteturas
vão permitindo identificar as casas dos emigrantes que trouxeram para a sua
terra as inspirações internacionais.
Casas com janelas cerradas que aguardam o
regresso em férias dos seus residentes que vêm descansar, visitar os familiares
ou simplesmente matar saudades do chão que os viu nascer.
Na pequena aldeia os
dias eram ardentes, as noites quentes, o sono tardava, mas quando chegava era
tranquilo e esvoaçante. A noite prometia ser longa e sem interrupções, mas eis
que pelas 3 horas da manhã um estranho trinado me arranca violentamente do doce
sonhar. Por uns segundos questionei-me, onde estava, que barulho era aquele,
uma buzina? Um grito? Não, era um galo canoro que resolveu exibir os seus dotes
vocais. Depois de uns minutos de cantoria, calou-se por fim. Voltei a serenar e
a adormecer, mas de novo às 4 horas da manhã, às 5, às 6 e por aí em diante, o
galo voltou à sua função de despertador.
Eu, citadina de todos os costados,
fiquei desagradavelmente surpreendida, mas os galos cantam à noite? Questionei.
Passaram-se os dias, e a “canja de galo que ameacei fazer” afinal não
aconteceu.
Acabei por me habituar ao seu canto. Quando voltei para a cidade e
para os seus sons habituais de indiferença e falta de respeito pelo descanso
que uns manifestam pelos outros quando chegam de madrugada com os rádios em
alto som, as conversas e as gargalhadas fora de horas, as buzinas madrugadoras.
De repente, dei por mim a pensar nas silenciosas 70 pessoas daquela distante aldeia.
Na sua azafama, na sua solidão. E para grande surpresa minha, senti saudades do
galo que todos os dias me despertava às 3 horas da manhã.