segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Tudo é transitório

 
Os amigos passam,
Os sonhos passam,
Os anos passam,
Só as árvores ficam.

Que as raízes permaneçam,
Nos amigos que venham,
Nos sonhos que nasçam,
Nos anos que nos chegam.

Mas para isso é preciso,
Encontrar no solo a fertilidade,
Encontrar no sol o sorriso.

Na mão que a planta o calor,
Na semente plantada a lealdade, 
Na vida que a acolhe o amor.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Post.it: Bem-vindo Outono

Gosto do Outono, das folhas caídas, das árvores despidas. Deste adeus que não chega a ser uma despedida mas um virar de página, um virar da folha.
Gosto das horas serenas, das tarde intensas, do pôr-do-sol que acontece no momento exacto em que o cansaço nos envolve, quando a paz do dia desenha no horizonte a amena oferta de um manto de estrelas.
Gosto das mangas que vão crescendo  envolvendo os braços nus e aconchegando o corpo com a suavidade do algodão.
Gosto das bebidas quentes que vão substituindo os sumos gelados.
Gosto das noites longas aninhada no sofá com um livro que nos fala de vidas, aquelas que sonhámos para nós e do final feliz que ainda não nos aconteceu.
O Outono é-me uma nova e diferente primavera, com tons de nostalgia, com cores de saudade.
Há um silêncio no Outono que me aquieta os sentidos enquanto o pensamento com  pontes de passado vão construindo o futuro. 
Talvez tudo me toque serenamente nesse quase outono de vida, num caminho de flores nascidas, de árvores erguidas, de folhas amarelecidas. 
De repente torna-se mais luzente a noção de que tudo é transitório, que é preciso sentir o tempo, cada época no que tem de generosa beleza. Que importa o calor do verão, já não me incomoda porque sei que também ele passa, que importa a morte das folhas se vão de novo renascer na Primavera, que importa a chuva se a terra precisa dela para voltar a florir. 
Aqui estou, aqui estarei, sem medo do infinito, mesmo que as minhas folhas se libertem, mesmo que os sentimentos se desnudem, as próximas estações continuarei a vivenciar.


segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Post.it: Tal numa outra vida

Há coisas que nos parecem tão óbvias que quando não acontecem nos deixam sem rumo, sem palavras, sem sonhos, quase que sem chão. Tornam-se miragens, tornam-se utopias, fantasias, histórias que o vento nos contou mas como era do vento, no vento voou sem se concretizar.
Incrédulos por ver o navio passar, por observar aquela nuvem a desvanecer-se, por sentir a hora a completar-se sem o despertador das coisas boas que podem acontecer, tocar nas nossas vidas.
Pousa-se a mão cansada de acenar, no que era um olá mas que se transformou em um adeus. Param-se os passos que outrora correram impulsionados pela esperança. Cala-se a voz depois de ter dito todas as palavras que ninguém escutou.
Que fazer? Inspirar-se nas páginas dos jornais, gritar, apontar uma arma, atirar âncoras que prendam ao fundo do mar, amarrar um corpo para que fique igualmente prisioneiro o coração? Ser mais um a tornar-se notícia de um “crime passional”?
Não, mil vezes não, abençoado anonimato de quem age com alma branda, com desprendimento, recolhimento, aceitação; com dor, sim dor, porque sempre dói a perda, mesmo que seja o fim do que no fundo, só em nós começou, só em nós existiu.
“Talvez numa outra vida”, diz-nos uma voz interior que não nos quer roubar a uma última centelha de alento.  “Sim, quem sabe”, repetem os lábios num sussurro esbatido de eco cada vez mais longínquo.
Ao meter as mãos nos bolsos, não procura nada neles mas encontra uma última recordação do seu querer, uma concha, aquela que recolheu na praia onde idealizou que caminhariam lado a lado, de mãos entrelaçadas por um futuro luminoso, devolve-a ao areal, quem sabe ela tenha mais sorte e encontre algures o complemento da sua existência. 
Quanto a si, vai repetindo até que a memória lhe roube as células da lembrança, “talvez numa outra vida”….

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Post.it: Qual o plural de melhor amigo?

Fazem-me cada pergunta… Olho desconfiada para o meu interlocutor, deve haver por aí alguma rasteira, é o meu primeiro pensamento. Mas ainda assim ponho os neurónios todos a trabalhar. Uma e outra resposta vêm-me à mente, mas será a certa? Haverá certa? Uma só? Talvez várias, segundo as interpretações, segundo, talvez, os corações.
Qual o plural de melhor amigo? Gramaticalmente “melhores amigos”, óbvio, fácil, demasiado fácil para me ter chegado em forma de pergunta. Afinal a questão não é assim tão simples, porque “todos são melhores amigos”. Imagino o coro de vozes discordantes que esta afirmação levantou, pessoas sempre cépticas de que o melhor amigo possa existir em número considerável, bom, talvez com a sua parcela de razão, mas passo então a explicar, todos são os melhores amigos de alguém, formando assim no seu vasto conjunto (muitos) “melhor amigo”.
Ainda me parece fácil ser este o desenredo, o melhor é adensar a questão, aprofundar  o caso, se quisermos ir mais longe na aparente vã filosofia.
De tão cheia de incertezas, eis que uma certeza começou a emergir, primeiro o óbvio de que não há apenas uma resposta. Mas o meu interlocutor queria uma, a sua, e pareceu-me satisfeito com a que lhe dei.
À pergunta, qual o plural de melhor amigo, apenas conseguimos responder com  a fidelidade do sentir, “o melhor amigo é único”, por isso nunca existirá um plural para esta frase, esta expressão, este reconhecimento, este merecimento. 
E mesmo que o sejam apenas no singular, felizmente que (o) temos.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Férias

Com os horários que fazemos,
Os caminhos que escolhemos. 
Chegar onde e quando queremos.
Ir à toa mesmo quando nos perdemos.

Ou apenas estar, em algures ficar.
Ou apenas dormir, talvez sonhar. 
Ou apenas o relógio desligar.
Ou apenas deixar o olhar voar.

Desapertar o nó da gravata.
Esquecer aquela colega chata
Sentir o cheiro a campo, a mar.
Deixar a vida numa rede balouçar. 

Passear de chinelos pela calçada. 
De roupa descontraída e amachucada. 
Ficar horas sentada numa esplanada,
E não fazer absolutamente nada.

Mas tudo o que é bom chega ao fim,
Ou talvez não tenha de ser assim.
Guardar ondas marítimas no peito,
Um voo de gaivota leve e perfeito.

Para que se torne uma quase eternidade,
Sem se transformar em dolorosa saudade.
Quem sabe chegue até às que hão-de vir,
Com a gratidão de a voltarmos a sentir.