quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Post.it: A paisagem

A paisagem é sempre o que quisermos, essencialmente o que somos, porque ela é vista por um olhar, apreendida por uma consciência, valorizada por uma experiência, julgada por uma estética, apreciada por uma moral, desenvolvida por uma política. Quando a paisagem nos entra pelo olhar, sobe à consciência e é analisada pela experiência, tocada pela beleza da estética e observada pelos valores individuais de cada um. E numa tentativa de harmonia a razão insurge-se em prole do naturalismo com argumentos científicos, mas o coração, num compasso descompassado entra na discussão, acelera-se-lhe o sangue cresce o fulgor – a fé. Só a fé, responde – pode conceber tal natureza dessa paisagem que se nos oferece.
Enquanto isso, o sol, alheio aos debates da ciência, do humano ou da religião, continua no seu trabalho, quase missão de florescer primaveras, de aquecer verões, de iluminar invernos, de aconchegar outonos. O vento sopra gargalhadas pela vã disputa, as árvores erguem-se em majestosa indiferença, o céu desinteressado de tal disputa, continua a estender o seu manto azul sobre o dia, o mar no seu vai e vem tenta escutar, tenta quem sabe, até algo acrescentar mas o movimento contínuo das águas fá-lo desistir. As rochas numa imponência desafiante obrigam a um renovado e atento olhar, como as explicar?
De repente um silêncio que nos mergulha no peito, calam-se as dúvidas, emudecem as científicas certezas; quanto tempo se perde na tentativa do Saber e tão pouco nos fica para o Sentir.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Era uma vez: Vida

Era uma vez…
Um grão pequenino, caído na terra.
Veio a chuva, o vento. Vieram o sol, as nuvens, a chuva e outra vez o vento.
No segredo da terra, o grão já era rebento, a  fazer-se raiz à procura do sustento e caule em busca de luz.
Nasceu, pequenino, verde, encarquilhado.
O sol sorriu-lhe e aqueceu-o
Ele espreguiçou as folhinhas enroscadas no caule e recebeu a luz e sentiu a frescura da brisa e bebeu do orvalho da manhã.
Confiou na terra, no sol, na chuva, no vento e deixou que a fizessem erva alta, a crescer em busca do céu. Frágil, bailando na brisa, depressa se fez forte, sustendo o esboço de espiga, querendo ser trigo.
E em redor, milhares, talvez milhões iguais a ela, um mar de verde a brilhar ao sol e a ondular ao vento. Verde, muito verde, à espera, confiando no sol que haveria de torná-la seara dourada.
E o verão chegou. Intenso, quente, luminoso.
A seara, dourada, bailava na brisa, à calma da tarde.
E a espiga, crescida baloiçava-se feliz, no topo do fino caule, debruçada sobre a terra que a fizera nascer.
A erva alta deixava-se embalar pelo vento e ouvia os grãos a crescerem na espiga, com ânsia de se fazerem pão. E ela, cansada, sentia uma alegria que não podia explicar.
Seria o sol? Seria o dourado da seara? Seriam os grãos a crescer?
Não!
Era simplesmente a vida, vivida, sentida, cumprida!
Deixou-se ficar serena, à luz da tarde, a saborear essa vida que recebera e agora oferecia.
E sorriu, de felicidade, simplesmente por existir.

Nota: Dedico este pequeno texto a Olhares, pelo seu aniversário. PARABÉNS, pelo que é, pelo que escreve e pelo que oferece à vida de todos nós.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Post.it: O barulho

“O bem não faz barulho e o barulho não faz bem”.

Ouvi esta frase, que quase parece um trocadilho, há muito anos, tocou-me fundo no peito, moldou-me os sentidos, fez-me crescer num repentino despertar de aprendizagem.
Quem me dera que me tivesse sido dita antes, muito antes, quando ainda mal soletrava as letras, quando o mundo se revelava meu e eu ingenuamente, egoisticamente acreditava. Segui pela estrada fora exigindo a vassalagem das pedras, subordinação das árvores, submissão dos mares, sujeição dos ventos, exigindo um céu azul, um sol brilhante. Criticava a vida, obrigava, gritava direitos de puro nascimento, fazia barulho, tanto barulho que passado um tempo, só o silêncio escutava.
O silêncio que como um pai paciente e amoroso, esperou até aos últimos resquícios de fulgor, pelo pacificar da alma, pela ternura, pela calma. Então, só então, como quem fala de banalidades, lançou discretamente aquela frase.
 Escutei-a, repeti-a uma, mil vezes, buscando-lhe o sentido e de cada vez que a murmurava no pensamento, soava-me diferente, mais intensa, mais verdadeira, mais necessária, mais urgente.
Abracei-a, senti-me abraçada por ela, não como um encontro, mas um reencontro. Como quem sabe que algo de importante, de essencial existe mas que ainda não se cruzou com ela. Quando há o encontro, acontece o reconhecimento, envolta numa espécie de saudade “esperava por ti, como demoraste…” Sim, podia dizê-lo, porque o senti, mas o que importa…, o que importa é que chegaste.
Talvez na hora certa, quando estava finalmente preparada para ti. Para te receber em mim e te transportar no peito e quem sabe um dia oferece-la como se fosse banal, até porque devia ser, se nos fosse naturalmente inata, uma célula que herdamos ao nos tornarmos vida.
 E tu estás preparado para ela? Só tu, com todos os teus sentidos, todos os teus valores e vivências, o saberás. Se esta frase te tocar, te enlaçar e tirares dela algum sentido para o caminho, então, sim, estás...
O bem não faz barulho, cada oferta que damos à vida, de ser feita sem alarde, ela sabe agradecer, sabe retribuir.
O barulho não faz bem, incomoda, magoa. É um gesto de quem não se importa com o outro. Por vezes, muitas vezes, só o silêncio entende, só no silêncio está a solução, quando o barulho que nos vai crescendo por dentro já não consegue escutar a voz do coração.



terça-feira, 9 de setembro de 2014

Post.it: Penso, logo insisto...

Insisto em prosseguir nesta viagem, descobri-la, construí-la com materiais que vamos ganhando, que vamos conquistando. Construí-la com o cerne do que somos e aí nos revelarmos corajosos prosseguidores, navegadores por entre vendavais; escultores de caminhos que adquirem o rosto do tempo.
Por vezes desenhando sorrisos que nos elevam e então, ganhamos asas e o caminho torna-se mais fácil, mais leve.
Uma viagem que nos leva longe, mesmo quando não saímos do local que nos viu nascer. Uma viagem que nos revela todos aqueles que estão próximos e todos os que se aproximam, que chegam e nos dão  testemunhos de um amor que se sobrepôs a tudo até à dor.
E nessa herança de experiências que partilham, dizem com ênfase de milenar sabedoria…
“É preciso insistir”,  para não ceder à vontade de desistir, de parar, de voltar para trás, e permanecer no velho  e conhecido conforto.
É preciso insistir porque há mares à espera de navios, há margens à espera de pontes, há desertos à espera de fontes. Nós temos tudo isso no peito, nos rios de vida que nos correm dentro das veias e nos fazem hastear velas de esperança aos ventos de nortada. Mas se o vento nos encaminhar para o abismo, para desnorte, vamos contrariar-lhe a direção e tomar firme nas mãos os remos de um novo rumo. Porque até a sorte se faz, no amassar dos dias, no levedar das noites, em fornos de alento. Pode ser duro o momento, mas dele sairá a mais prazerosa sensação de vitória.
Penso e porque penso sei…
Não tudo, apenas um pequeno nada, suficiente para que insista e tarde ou nunca desista. 
Penso, logo insisto que apenas existo para ser feliz…

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Post.it: Setembro

Que nos traz Setembro? O começo de férias para uns, a nostalgia das férias passadas para outros. O regresso ao trabalho (para quem o tem) a espera de uma nova oportunidade. O cheiro a material escolar novo, a ânsia do reencontro de colegas de escola, a expectativa de novos rostos que olham os professores numa mútua descoberta. Um ano inteiro que se abre em portas e janelas. Um ano que no calendário se aproxima no seu ritmo certo para o final. Que na realidade nunca é um final, apenas e sempre um novo começo. Novas possibilidades, novas promessas, umas cumpridas, outras talvez não, fica para o ano...
Mas ainda estamos neste e não vamos apressar o tempo, nem antecipar o futuro. Vamos caminhar lado a lado, como se faz com um amigo que nos conta histórias e que ouve as nossas sem pressa de partir nem de chegar a algum lado. Sem ter outro lugar pra onde ir, está ali para nós, por nós, nas venturas e desventuras da vida.
Mas voltemos a Setembro que já estende a mão incentivando-nos a segui-lo na marcha dos dias, por entre o sol e a chuva.
Que sei do que se avizinha? Talvez os compromissos, as celebrações, coisa de agenda, coisas do coração, mas de tudo o resto que compõe a marcha das horas, que nos preenche os dias… 
 “Apenas sei das auroras/ e das sombras do luar/ do rodar das noras/ e das ondas do mar./ Apenas sei das ruas/ e das noites quentes./ De tantas mãos  nuas/De amores ausentes.” 
De tudo o resto sei pouco, muito pouco. O que desejo? Que cada dia acorde feliz e adormeça concretizado. 
Uns dirão que Setembro é apenas um mês no ano, mas ele é muito mais do que isso, é um mês repleto de coisas por realizar. 
É um dever torna-lo um pouco nosso, um pouco de nós na vontade de que seja vivido com muitos e bons momentos. Um mês que certamente ficará no passado, mas se ficar igualmente no futuro que seja por guardar boas memórias. Por tudo o que de bom nos deu, por tudo o que de bem lhe demos, nem que seja: um sorriso, um incentivo, uma presença, uma esperança, um estar aqui de alma e coração, para um amigo, um irmão, para “ninguém” que em algum momento se tornou para nós em alguém. 
Que nos exista uma felicidade em Setembro que se estenda aos próximos meses e porque não a todos os seguintes anos…