segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Destino

Buscava um sentido
Buscava uma razão
Para o meu ser perdido.
No vazio da multidão.
Buscava um olhar,
Buscava um sorriso,
Buscava um lugar
A que chamar paraíso.
Olhei-te e não te vi
Mergulhada no meu sentir.
Quase que passei por ti,
Sem em ti me deter.
O destino chamou-me,
Disse-me para parar.
A tua mão tocou-me
E eu parei no teu olhar.
Onde estavas tu, quis saber?
Onde estava eu, questionavas?
Quando dentro do nosso ser
Já eu te amava, já tu me amavas.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (11)

Na ilha dos seres brilhantes, o conselho de decisores acabara de ser informado do desenrolar dos últimos acontecimentos e da situação da princesa e dos jovens magos cuja missão era libertá-la. O elo de luz que unia todos os presentes agitou-se em pequenas ondas e o seu zunido tornou-se mais forte e grave. O jovem Ansiex e alguns dos seus apoiantes oscilavam na sua levitação. Entre eles tinha-se desenvolvido a convicção de que deveriam lançar uma ofensiva contra o reino das fadas, para impor respeito e dissuadir qualquer intenção de invasão por parte delas.
Ornix viu a agitação e compreendeu o seu significado. Com alguma tristeza, dirigiu-se ao conselho:
“Amigos, creio que estas novidades evidenciam a nossa convicção de que não existe intenção beligerante por parte do reino vizinho.”
“Conselheiro Ornix, perdoe mas tenho de interrompê-lo. Como seu sobrinho conheço bem a grande bondade do seu coração e a sua infinita sabedoria, que muito aprecio. Porém, creio que estais a ser demasiado optimista e isso pode comprometer a nossa segurança.”
A desaprovação desta atitude foi quase geral. A maioria dos conselheiros demonstrou o seu desagrado por esta indelicadeza e sobretudo por aquilo que ela significava – existia, entre eles, uma tentativa de quebrar a unidade que punha em causa a decisão antiga de nunca recorrer à violência e de não utilizar os profundos avanços científicos e tecnológicos para atacar, mas apenas para melhorar a vida da população e, se necessário, em defesa do reino e apenas como último recurso.
O brilho em torno de Ornix tornou-se mais intenso e a sua voz fez-se ouvir em tom grave e profundo:
“Ansiex, a tua intervenção causa-me uma enorme tristeza. Não por estares em desacordo comigo mas por temer que todo o empenho e amor que coloquei na tua educação não tenham encontrado eco no teu coração. Tremo só de pensar que poderás estar a aproveitar esta situação para te afirmares como líder de alguns conselheiros que, pela sua juventude, não se recordam da época em que púnhamos o orgulho e o medo à frente da sensatez e da paz. Essa fase da nossa história foi ultrapassada e valeu a pena. Este pequeno incidente não pode levar-nos a abandonar as nossas esperanças de vivermos em paz e de continuarmos a progredir nesse caminho.”
“Meu tio, sabe que sempre o respeitei. Perdoe-me se não concordo consigo. Mas, como membro deste conselho, tenho o direito de expressar a minha opinião e disponho-me a que seja votada contra a sua”
Foi interrompido por um burburinho agitado de onde surgiu a voz clara e firme do conselheiro Amix:
“Jovem Ansiex, tem todo o direito a expressar a sua opinião, mas com o respeito devido a seu tio e a este conselho. Como sabe, a votação é uma forma primitiva de decidir. Foi uma fase necessária até termos aprendido a ouvir-nos com respeito mútuo e de mente aberta e coração puro, na procura da verdade, sem vaidades pessoais ou interesses faccionais a impedir a construção de uma resolução sábia.”
O brilho dos membros do conselho e o anel de luz tornaram-se suaves e o zunido foi-se transformando em melodia apenas perturbada pelo incómodo de Ansiex que, a julgar pela harmonia da sala, concluiu que acabara de perder os seus apoiantes, tocados pelas palavras de Amix.
Ornix tomou novamente a palavra e propôs:
“Creio ser chegado o momento de concretizar um desejo que tem vindo a clarificar-se entre nós: encetar relações diplomáticas com o reino mágico das fadas e quebrar de vez esta era de receio e desconfiança. Pelas informações que temos, também elas evoluíram e pretendem viver em paz e mantê-la.”
Todos se elevaram um pouco e o anel de luz tornou-se mais brilhante. Apenas Ansiex se manteve na mesma posição, mostrando assim que não concordava.
Vários conselheiros pediram a palavra e cada um foi apresentando argumentos e sugestões que pareceram convencer Ansiex. Este acabou por apoiar a sugestão de seu tio, alcançando-se deste modo uma decisão consensual de todo o conselho.
Por fim, o conselho de decisores resolveu enviar um grupo de robotixis ao reino mágico das fadas para entregar uma proposta de concretização de um encontro diplomático entre o conselheiro mor e dois dos seus mais directos assessores e a rainha das fadas e duas das suas conselheiras. Propunham que esse encontro se realizasse o mais brevemente possível, na praia, entre as águas do lago das mil cores e a barreira de espinheiros e onde, como gesto de boa vontade da parte dos seres brilhantes, seriam libertados a princesa e o jovens magos.

Ao mesmo tempo, no reino das fadas, a corte tinha tomado idêntica decisão. Dois magos alados voluntários estavam já a preparar-se para entregar no reino dos seres brilhantes uma mensagem da rainha Amada, que começava por pedir compreensão e desculpa pela atitude de sua filha, tomada sem sua autorização e contra a lei geral do reino que proibia de passar a barreira de espinheiros. De seguida, propunha encetar relações diplomáticas para resolver o incidente, em paz e com a promessa de que tal não voltaria a acontecer.
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Continua
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No reino mágico das fadas (12)
http://posdequererbem.blogspot.com/2011/03/era-uma-vez-no-reino-magico-das-fadas.html

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Post.it: Entre o ontem e o amanhã

Toda a gente bordeja entre um ontem e um amanhã. Viver é abrir caminho a cada passo. O que decide do hoje, e do amanhã, é a lucidez das opções que fizemos.
Tudo isto nos parece lógico em algum momento. Por isso, depois de tudo o que já vivi, dos ontens que já presenciei, continuam a  inquietar-me as interrogações  sobre os amanhãs.   Ventilando questões, sobre este caminho: sobre  cada pedra,  cada curva,  cada declive ou íngreme subida. Confiro a ilação e: vou arrumando cada pedra para que no seu conjunto formem uma estrada; suponho que a curva por grandiosa que seja, traz a expectativa duma chegada; que cada  declive pode auxiliar no percurso e servir como um breve descanso para encetar a subida. Então,  para aquietar o viver, temos que antever cada obstáculo como se fosse um desafio. Encontrar em cada impedimento, uma forma de desenvolver novas competências para os ultrapassar.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (10)

Entretanto, no reino mágico das fadas, a rainha Amada e a sua corte ouviam, da boca do chefe do corpo militar – um mago com belas e robustas asas – o relato do que se passava na praia, incluindo a presença de vigilantes e robotixis a voar nos céus próximos da costa.
A rainha Amada receava cada vez mais pela filha e pelo reino. Decidiu que, se até ao final do dia não tivessem notícias dos jovens magos que tinham ido em busca da princesa, enviaria um novo grupo de voluntários com a proposta de um encontro diplomático com os dirigentes da ilha dos seres brilhantes. Teria de confiar na nova magia para a proteger do efeito mortal da luz dos seres brilhantes. Mas o que na realidade a preocupava era a reacção dos seus inimigos ancestrais. Poderia confiar neles? Não se aproveitariam para a atrair a uma cilada e, assim, puderem conquistar o reino mágico?
Deveria colocar a salvação da sua filha à frente do interesse do reino? Conhecia a resposta correcta mas, no seu coração de mãe, a dor gritava o contrário.
A fada Gentil, amiga da rainha e sua confidente, sabia que a soberana, desde que fora criada a magia protectora, acalentava o desejo de encetar relações de vizinhança com o reino dos seres brilhantes, sempre contido pelo receio de não encontrar nos interlocutores desejo e disposição semelhantes aos seus, adivinhou no semblante crispado e tenso da rainha a luta interior que travava. Resolveu assumir ela a responsabilidade da proposta e dirigiu-se a toda a corte:
“Como conselheira-mor gostaria de propor uma estratégia para resolver a situação. Poderá ser arriscada, mas tem hipóteses de ser bem sucedida e de se transformar no princípio de uma nova era para o nosso reino e para o dos nossos vizinhos.”
Ouviu-se um murmúrio geral. Há muito que se falava na corte de um grupo de fadas e magos que, secretamente, defendia a possibilidade de se estabelecerem relações diplomáticas com o reino vizinho, mas os argumentos contra esta ideia eram muitos e tinham o peso do medo criado pela devastadora experiência das antigos conflitos que, durante séculos, opuseram os dois reinos. A paz conseguida com a completa indiferença e ausência de relações, depois de um acordo que os dois reinos haviam cumprido, era considerada pela maioria das fadas e magos como um bem a preservar e, como tal, eram totalmente contra tal possibilidade. A favor dela concorriam as notícias dos informadores sobre os progressos que se haviam operado na ilha e sobre a forma pacífica e justa como era dirigida pelos decisores. Porém, nada fora confirmado mas muitos acreditavam que os seres brilhantes, tal como eles, não queriam perder a paz alcançada.
Quando os comentários se extinguiram, perante o gesto da rainha Amada de se colocar de pé ao lado da fada Gentil, esta continuou.
Adivinharam a minha proposta. Pois bem, penso que é o momento certo para arriscar a comunicação com os seres brilhantes. Não podemos trazer a princesa Marbel pela força e não podemos perdê-la. Por isso, só nos resta a possibilidade de negociar, por bem, o seu regresso. Peço que todos reflictam em silêncio e, daqui a uma hora, ouviremos a opinião e as propostas de execução desta ideia.
Toda a corte ficou em silêncio, sabendo que a decisão que tomasse, qualquer que fosse, teria consequências imprevisíveis e que não havia nenhuma magia que pudesse libertá-los de tal responsabilidade.
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Continua
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No reino mágico das fadas (11)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Post.it: A rotina dos dias

Há dias em que tenho dificuldade em despertar. Não por ter sono, até porque normalmente acordo  cedo, ainda antes do sol cumprimentar a lua.
Tenho é alguma dificuldade em despertar para a rotina que compõe os dias. Quando estes se preenchem de compromissos que pautam a vida. Obrigações de se ser adulto responsável. Obrigações de quem tem que pagar os seus impostos e a sua sobrevivência ou até os seus pequenos prazeres. (Porque afinal a felicidade compra-se).
 Quantas vezes me apetecia não ter deveres por cumprir, já F. Pessoa o dizia: "Ter um livro para ler / E não o fazer! / Ler é maçada, / Estudar é nada. / O sol doira Sem literatura. / O rio corre, bem ou mal, / Sem edição original. / E a brisa, essa, De tão naturalmente matinal, / Como tem tempo não tem pressa...".
 Levantar-me, dirigir-me meio sonâmbula até à cozinha, fazer um café cujo fumo e odor me invadam os sentidos e acalentavam o espírito. Abrir a janela, deixar a natureza entrar por ela, o vento para dar asas ao pensamento, o sol para me aquecer a alma e o canto das pequenas aves para encher de melodia o meu dia. Depois sentar-me na minha velha secretária, que vem comigo de viagem em viagem, sólida, companheira que me transmite confiança pela sua presença ao longo do caminho. Pegar numa esferográfica, sim é verdade, continuo fiel à escrita à mão porque preciso de ver a alvura do papel ser preenchida pela tinta azul. Preciso de sentir o deslizar da mão sobre o papel. Só assim sinto que desenho, imagens de palavras esvoaçantes. Só assim me sinto ligada à solidez da terra fértil de sensações. Então escrevo, por vezes nem sei bem o quê. Deixo-me guiar pela fluidez dos sentimentos. E então choro quando as palavras saindo de mim são uma torrentes de emoções. Mas também me rio de muitas palavras que rodopiam e brincam diante dos meus olhos como se soltasse do meu ser um delirante sentido de humor. A escrita,  essa quase magia em que me envolvo, revela os mistérios que me vão na alma, e na alma vão asas de vento, flores que crescem em suspensão num jardim de fantasia.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Partirei

Partirei, sim partirei,
Quando o sol se erguer sozinho
Quando o mar acordar de mansinho
Quando a brisa amansar o vento
Dando-lhe um murmúrio de alento.
Quando as aves cantarem em desafios
Quando as correntes embalarem os rios.
Quando as nuvens escreverem amor
E esta palavra  já não rimar com dor.

Partirei, sim, partirei,
Deste abraço que sempre te dei.
Da lágrima que num beijo sequei.
Do mais terno sorriso que te ofereci.
Deste sentir que eternamente escondi.
Que no infinito do meu ser guardei.
Esse  sentir  que tão puro e tão bonito,
Ficou contido no mais ansioso grito.
Porque deixaste que amizade,
Rimasse sempre com saudade.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (9)

O aposento onde encontraram Marbel tinha paredes maleáveis que esboçavam ondulações ao ritmo de uma melodia quase imperceptível que enchia todo o espaço e que parecia comandar a intensidade das luzes suaves e intermitentes com tonalidades que variavam entre um amarelo muito claro e um laranja forte, o que criava um ambiente relaxante e confortável. O calor da bolha protectora dos jovens magos fez aumentar a intensidade da melodia, da luz e do movimento ondulante das paredes, como se tudo se tivesse animado para presenciar a libertação da princesa.
Os jovens magos desfizeram a magia protectora para que a princesa os pudesse reconhecer. Desvendaram Marbel e libertaram-na das faixas de tecido confortável que a aprisionavam. Ao princípio, os seus olhos tiveram dificuldade em se abrir e os ouvidos demoraram a sentir de novo os sons. A boca não foi capaz de articular qualquer palavra, apenas se abriu para sorver o ar livremente. Os braços e as pernas estavam entorpecidos e todo o corpo demorou a ganhar força e segurança para se erguer. Mas, em poucos minutos, Marbel ergueu-se e foi abraçada pelos jovens magos no meio de exclamações de alegria.
Rapidamente puseram-na ao corrente do seu plano e decidiram recorrer imediatamente à magia protectora. Com a alegria do reencontro e mais um coração a construir a força da união, seria mais fácil criar energia suficiente para reconstruir a bolha que os tornaria invisíveis e indetectáveis.
Mas, quando uniam os braços e os erguiam, buscando união de pensamentos e esforços, todo o espaço foi invadido por uma luz intensa e branca que impôs o silêncio e imobilidade às paredes. Surgiram três vigilantes e dois seres brilhantes.
Colocaram-se em círculo, com a princesa no meio, de modo a ficar protegida e todos fecharam imediatamente os olhos para não sofrerem as consequências da luz dos seres brilhantes e tentaram tornar-se invisíveis e voar, mas algo os aprisionou e manteve imóveis. A boca da princesa ainda começou a balbuciar palavras mágicas para imobilizar os seus captores, mas foi impedida de terminá-las por uma qualquer magia que lhe tolheu o pensamento e a calou repentinamente.
A voz do professor Inventix fez-se ouvir:
“Podem abrir os olhos. O nosso brilho já não é letal para vós”.
“Como sabemos que diz a verdade?” – perguntou um jovem mago.
“Não sabem. Terão de confiar ou ficar para sempre com medo.”
O mago que o questionara sentiu-se atingido no orgulho, mas manteve a prudência.
“Não se trata de medo, mas de responsabilidade. A nossa missão é resgatar a princesa e não colocá-la em perigo.”
“Como queiram. Por nós podem ficar de olhos fechados para esta realidade e também para o facto de que as coisas mudaram radicalmente desde que os nossos reinos foram beligerantes. Agora e aqui nesta ilha, ninguém quer conflitos nem problemas.”
“Então, porque aprisionaram a nossa princesa?”
“Porque entrou sem permissão no nosso território e não conhecíamos as suas intenções. Depois de as descobrirmos, preparávamo-nos para a transportar até à barreira de espinheiros e, aí, a deixar para que fosse recolhida por vós. Foi quando nos apercebemos da vossa chegada e verificámos que, do vosso lado do lago das mil cores, há grande movimentação, o que pode significar perigo para nós.”
“Mais uma vez, que garantias temos de que fala verdade?”
“Nenhumas. Ou confiam ou ficam para sempre na dúvida e com medo.”
Os jovens magos tinham, entretanto, conseguido activar a magia da comunicação de pensamentos e resolveram que apenas um deles arriscaria abrir os olhos e enfrentar a luz do ser brilhante que, com voz calma e segura, os desafiava a confiarem. A princesa tentou convencê-los de que deveria ser ela a arriscar, uma vez que era a responsável por toda a situação. Porém, todos se opuseram veementemente e o mago que já tinha falado retomou o diálogo com o professor Inventix.
“Pois bem, vou confiar em si. Mas, antes, gostaria que me ouvisse.”
“Muito bem. Fale.”
“Este incidente foi provocado por um acto irreflectido próprio da juventude da nossa princesa, sem conhecimento de mais ninguém no reino mágico das fadas. A nossa vinda e a movimentação que avistaram do outro lado do lago das mil cores têm apenas como objectivo encontrar a princesa e conduzi-la ao reino, sã e salva. Devolvo-lhe o mesmo desafio: está disposto a confiar em nós?”
Fez-se silêncio de palavras e pensamentos, a luz ganhou novamente tonalidades amarelas e tornou-se menos intensa, enquanto a melodia voltava a insinuar-se no ar e as paredes recomeçaram timidamente a sua ondulação.
Os dois grupos confrontavam-se com a mesma questão: “Devemos confiar?”
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Continua
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No reino mágico das fadas (10)

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Post.it: Para além das aparências

No corredor do hospital amontoavam-se as macas com doentes que não tinham vaga num quarto. Uma senhora idosa gemia, médicos e enfermeiros quando passavam por ela mandavam-na calar.
“Que vêem quando olham para mim? Que pensam sobre o que hoje sou? Não passo certamente de uma velha que aguarda o seu final. Uma velha que geme de dores que vocês desconhecem e talvez julguem que apenas estou senil, que gemo para chamar a atenção. Mas olhem bem para mim, bastam uns minutos. Esqueçam-se destas rugas profundas que desenham o meu rosto. Já tive a pele lisa e macia, uma pele de bebé que os meus pais acariciavam enquanto me ajudavam a crescer.. Olhem para os meus lábios, murchos que já não sabem sorrir, de onde saem  contínuos gemidos, quando outrora saíram risos duma juventude irrequieta e feliz. Sim, porque já fui jovem, corri pelos campos, amei e fui amada. Vá lá, tenham paciência, olhem-me nos olhos, estes olhos tristes e sombrios de quase cegos. Estes mesmos olhos que se deslumbravam com as maravilhas do mundo, que beberam a luz dos oceanos e rompiam os horizontes do desconhecido. Segurem nas minhas mãos, estão magras, desfalecidas, imaginem como eram belas, porque o eram realmente. Tinham a delicadeza própria dum pintor que deixa na tela a harmoniosa cor da natureza. Olhem para os meus braços, conseguem saber como eram? Se soubessem como eram? Se soubessem como os meus filhos se aninhavam neles e adormeciam cheios de confiança de que esses abraços seriam eternos.
Hoje nada mais sou do que um pedaço de vida fugidia. Um ramo seco duma velha árvore. Ela cumpriu a sua missão perante a natureza e a humanidade. Gostaria de pensar que também cumpri a minha e que posso partir com dignidade e com o carinho daqueles que conseguiram ver-me para além da aparência. Que cuidassem de mim como eu cuidei de todos aqueles que passaram pela minha longa jornada existencial. Pessoas a quem dei amor, amizade ou tratei com humanidade. Peço-lhes, permitam que este final de viagem seja um lampejo de paz e felicidade.”

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Post.it: O verdadeiro Eu

Quando nascemos, os pais projectam em nós as suas ambições, o que eles nunca foram ou o que desejam que nós sejamos. Depois vêm os outros, os amigos e aquilo que eles esperam de nós. Surge então a questão: Será importante alterarmos o nosso comportamento para melhor nos ajustarmos ao que o mundo espera de nós? Se o tentamos fazer, ficamos com a nossa conduta essencialmente à mercê do meio social que nos rodeia e condiciona. E vamos tentar sempre estar em consonância com o que os outros desejam que sejamos. Isto parece complicado, sobretudo se tivermos em conta que ao longo da vida nos deparamos com diversas pessoas e cada uma delas com perspectivas diferentes, o que nos obrigaria a permanentes reajustamentos. Seria bom questionarmos, será que os outros nos vêm tal como somos? A  verdade é que criam “modelos” daquilo que apreendem sobre nós, através das nossas acções. É importante que existam estes ajustes, é importante que respeitemos a liberdade de cada um, desde que esta não invada a nossa. Mas tão ou mais importante do que os outros pensam e sentem sobre nós é o que nós pensamos sobre a nossa pessoa. Se por um lado não devemos ceder a um crescente narcisismo, por outro não podemos anular totalmente a nossa auto-estima. Também é verdade que não podemos tornarmo-nos um ilha e cair no isolamento. O ideal é sempre o meio termo, compreender que a análise dos outros sobre nós é sempre um reflexo das nossas atitudes exteriores, mas só nós é que sabemos o que somos e como gostamos de ser, nas nossa fraquezas e virtudes. Conjugando todos os elementos e exteriorizando-os para revelar o nosso verdadeiro Eu.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (8)

Entretanto, os jovens magos voluntários, dentro da sua bolha invisível tinham encontrado uma abertura no edifício rosa e lilás da clareira e encontravam-se, agora, num túnel estreito e tenuemente iluminado por uma luz bruxuleante, que mudava de tonalidade ao ritmo do ruído electrónico e vagamente irritante que as paredes e o tecto abaulado produziam, no seu movimento lento e ondulante.
A bolha flutuante transportou-os pelo túnel até uma sala oval, em matizes de verde, ampla e semi-iluminada que, à primeira vista, parecia completamente vazia. Mas, quando os seus olhos se habituaram à penumbra da sala, os jovens magos verificaram que havia inúmeros aparelhos incrustados na parede, com milhares de botões e etiquetas com sinais de um código estranho para eles. Pareceu-lhes uma sala de controle e, por isso, tentaram interpretar o significados dos aparelhos e respectivas indicações. Uma das etiquetas apresentava um desenho. Carregaram no botão correspondente e a parede oposta iluminou-se, mostrando o que parecia ser uma planta do edifício, onde se via, numa espécie de filme de cada compartimento. Os jovens magos desconfiaram um pouco da sorte, mas resolveram arriscar e registaram mentalmente o caminho até à única sala onde lhes pareceu descortinar um vulto humano deitado que consideraram poder ser a princesa Marbel. Dirigiram-se para aí, tentando ser rápidos, pois sentiam que a magia protectora começava a enfraquecer.
“Já sabemos onde estão! Eu disse-vos que resultaria!”. Era o professor Inventix que, no mostrador do seu bloco electrónico, vira acender-se o painel luminoso da parede da sala oval dos painéis.
“Excelente ideia, professor!” – cumprimentaram – os vigilantes que o acompanhavam “com toda a certeza vão dirigir-se para a sala lilás onde se encontra a princesa. Temos de selar a entrada”.
Mas o professor Inventix não concordou:
“Não! Deixemos que cheguem até à princesa! Quando ela for movida, saberemos que se encontram no aposento e ai, sim, selaremos a sala!”
Todos concordaram e ficaram atentos ao visor do bloco electrónico, à espera de que surgisse o sinal de qualquer movimento.
A fada Marbel, no escuro, cansada de estar na mesma posição e temerosa do que lhe reservava o futuro, arrependia-se amargamente de ter iniciado aquela aventura. Percebera que não conseguira enganar o leitor de pensamentos e irritava-a que os seus captores a julgassem pouco expedita e fácil de enganar. Na verdade, ela própria concordava com esta descrição, o que a aborrecia ainda mais. De repente, sentiu um calor reconfortante junto de si e, sem saber porquê, sentiu-se segura e amparada. “Princesa Marbel! Está bem? Fizeram-lhe mal?”
Marbel não pôde responder, mas os olhos, mesmo vendados, encheram-se-lhe de lágrimas. Tinham vindo salvá-la!
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Continua
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sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Post.it: Já ninguém escreve cartas

Dizem que o mundo é pequeno. Mas é demasiado grande para nós dois. Cada vez que a vida nos obriga a separar depois dum tão curto encontro. Cada vez que adormeço e acordo sem o teu abraço. É demasiado grande quando procuro em cada rosto o teu olhar. Quando sigo o rasto do teu perfume noutro corpo que não é o desejado. Quando chamam o teu nome, agita-se-me o coração, para logo se aquietar desiludido. Neste mundo que é tão pequeno para uns, é demasiado grande quando a solidão toma o lugar que é teu. Bem sei que temos as novas tecnologias da comunicação. Bem sei que no tempo dos meus avós, as cartas eram a única forma de ultrapassar as distâncias. Como eles se riem do meu desespero, da minha saudade. No tempo deles tinham que esperar dias pela volta do correio. “Não aguentava”, grito ansiosa. “Aguentavas sim, até irias gostar, porque era essa espera discreta que mantinha acesa a chama da paixão.”. “Como assim?” questiono. “Vê bem minha querida, hoje estão sempre a mandar mensagens, pequeninas, nós escrevíamos longas cartas, folhas e folhas onde derramávamos rios de ternura. Como tínhamos as limitações do tempo esmerávamos a inspiração e dávamos asas ao coração. Já ninguém escreve assim, por muitos emails ou sms que troquem. Perdeu-se a inspiração que vinha da saudade”.
Invade-me um suspiro de nostalgia, talvez ela tenha razão, o que temos em quantidade perdeu-se em qualidade. Escrevemos telegraficamente, não há tempo, nem inspiração para escrever com o coração. Acho que vou escrever uma carta.

Meu querido amor
Espero que esta carta te encontre bem de saúde. Escrevo-te para te contar como têm sido os meus dias longe de ti. Para te contar sobre a saudade que me invade o coração…

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Quem me quiser


Quem me quiser
Certos requisitos precisa ter:
Possuir um coração aberto,
Para me dar um futuro certo.
Tem de trazer flores sem espinhos
e afastar as pedras dos caminhos.
Tem de secar dos olhos as águas
Para que possa curar-me as mágoas.
Tem de trazer um quente abraço
Que ponha fim ao meu cansaço.
Tem me dar o mais precioso tesouro.
Pérolas de emoção e sonhos de ouro.
Tem de me envolver no fogo da paixão
Que me faça esquecer toda a razão.
Tem de me fazer sentir o paraíso
Na doçura do mais belo sorriso.
Tem de caminhar sempre a meu lado
Esquecendo o seu e o meu passado.
Tem de ter vontade de arriscar.
Tem que ter capacidade para lutar.
Tem que me dar o seu melhor.
Tem que saber cuidar do amor.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (7)

A notícia espalhara-se pelo reino e todas as fadas estavam consternadas com a situação e receosas das suas possíveis consequências. O tempo de conflito com os seres brilhantes deixara marcas em praticamente todas as famílias do reino mágico das fadas e ninguém desejava voltar a passar pela mesma aflição. Ainda assim, havia grande número de fadas e magos nas margens do lago, verificando todos os terrenos que ladeavam a barreira de espinheiros e até havia quem se aventurasse no próprio areal, procurando entre a vegetação das dunas, não fosse a princesa ter sofrido qualquer acidente e encontrar-se caída e a precisar de ajuda. Muitos usavam mesmos os seus poderes mágicos para ampliar as capacidades de visão e audição e outros, mais temerários, voavam baixinho sobre as águas costeiras do lago das mil cores, tal era a vontade de encontrar a princesa que, apesar da sua maneira de ser, sempre inquieta e à procura de aventuras, era querida da população e todos desejavam que se encontrasse bem e regressasse o mais rapidamente possível.
Os vigilantes do lago, a certa distância, escondidos nos pássaros azul-esmeralda que, ao longe, quase nem se viam do lado das fadas, mantinham-se atentos a todo aquele movimento. E também já se tinham apercebido do corpo militar de magos alados e fadas-dragão, muito velozes e com grandes poderes que, discretamente e misturados com a população, se encontravam a vigiar as águas do lago que, com todo aquele movimento se agitavam numa ondulação suave mas inquieta e ululante, que realçava ainda mais os milhares de tonalidades das suas mil cores.
Os vigilantes informaram os serviços de defesa da ilha sobre esta agitação e, como prevenção, foram enviados para o lago os pequenos robotixis, muito leves e quase transparentes, que os engenheiros do centro de estudos e tecnologia avançada da ilha haviam criado e que tinham muitas capacidades especiais: andavam, nadavam, voavam e eram programáveis - podiam realizar desde pequenas tarefas domésticas até aos mais especializados trabalhos de produção e às missões de pesquisa, que incluíam incursões de recolha de informação no reino mágico das fadas. Os que, agora, se juntaram aos vigilantes, eram especializados em missões de vigilância e possuíam sofisticados dispositivos de defesa e ataque não letais.
Por sua vez, o corpo militar do reino mágico das fadas também observava a discreta presença dos vigilantes e dos robotixis e informara a corte e a rainha Amada da sua presença.
Na ilha dos seres brilhantes, o conselho de decisores e o Guardião com os seus especialistas, analisavam a situação, enquanto no reino mágico das fadas, a corte e a rainha faziam o mesmo. De um lado e do outro ninguém desejava um conflito, mas o receio e a desconfiança aumentavam.
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Continua
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No reino mágico das fadas (8)

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Post.it: Tecla amiga

Quando a solidão nos invade o coração. Quando buscamos a mais improvável solução. Surge do nada, neste mundo de inconstância, este “olá”. Enche-nos de questões, expectativas e desafios. A conversa flui amena, pouco a pouco aproxima-se de nós, revela-se, cresce em fantasia, esvoaça na nossa imaginação. Ainda não tem rosto, nasce primeiro o esboço da personalidade. Contextualiza-se, afirma-se, envolve-nos num élan de atractivo mistério. Esse mistério que se esconde e simultaneamente revela-se sem medo protegido na capa do anonimato. Aprendemos a ver um sorriso, porque as palavras também riem. Lemos tristeza, quando as palavras parecem gotas de orvalho. O tempo vai deslizando por entre as teclas, os dedos agitam-se no desejo de chegar mais perto. De traduzir emoções, de partilhar momentos. O frio ecrã ganha calor humano. Surge nele um rosto difuso de contornos que as palavras vão desenhando. Linhas onde escrevemos quem somos ou quem desejaríamos ser. Parágrafos que vão crescendo em ternura. Surge uma vontade inevitável, aquela que pensávamos nunca iria sobrevir, quando dizíamos aos nossos pensamentos “é apenas uma amizade virtual, que começa e acaba no desligar dum botão”. Agita-se a emoção, já não bastam as palavras que nos salpicam os dias de flores. Precisamos de ver esse jardim, sentir-lhe o perfume,  ver-lhe as cores, sentir-lhe o calor. O convite surge espontâneo, “que tal tomarmos um café?”. A resposta demora, enquanto ficamos suspensos do visor vazio. O tempo adquire laivos de eternidade. Surge a mensagem, que não responde àquela questão. Fala como se nem  tivesse lido a tímida proposta.
Como terá sido o momento do outro lado? Daqui, apenas um suspiro. A decepção envolta em aceitação. Por um instante, um breve instante, aquele em que começamos a acreditar que o impossível pode tornar-se possível, sonhamos, voamos, desenhamos esperanças por entre as nuvens. Depois roubam-nos o sonho e a realidade volta a ser virtual, enquanto nós voltamos à nossa simples condição de tecla.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Post.it: A missão da nossa vida

Se morresse hoje, morria feliz. Sentia que tinha feito a minha parte. Cumprido a minha missão. Talvez não tenha feito tudo, talvez não tenha mudado o mundo. Mas tinha cumprido o plano do destino. Se morresse hoje sentia o coração cheio de paz. Sim, porque é sem dúvida alguma um privilégio senti-la. Que me perdoem a falta de humildade, mas penso que a mereci, não por ter sofrido muito, mas por não ter aceite sofrer sem lutar. Não por ter ajudado muitas pessoas, porque na verdade não ajudei, mas por sentir que contribui com o meu pequeno grão de areia. Quem vier a seguir que continue a aumentar o areal, que um dia poderá ser uma linda praia onde as crianças constroem castelos.
Muitas vezes procuramos incessantemente o sentido da nossa vida, qual a missão que esta tem para nós. Mas enquanto esperamos a grande missão, deixamos passar a beleza das pequenas missões que realizamos em cada dia.
É um clássico dizer que só nos realizamos quando atingimos três objectivos: Ter um filho, escrever um livro e plantar uma árvore.
Os meus objectivos são mais difíceis de cumprir, mas quando os atingimos, sentimos a plenitude do que deve ser a vida: Amar alguém, fazer feliz alguém, limpar uma lágrima com um sorriso.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

A eterna idade do amor

Amores da terna idade
Em que até o sentir,
Ganha a doce maturidade
de quem sabe o amor repartir.
Em que a sua mão enrugada
enlaça a dela tão cansada.
E o coração desgastado.
Vive no outro aconchegado.
Foi longa a caminhada,
mas quando acompanhada.
Torna-se leve no sentir
do percurso a seguir.
Na sua lembrança de infinito
ele é ainda tão bonito…
Na sua  recordação carinhosa
ela é ainda tão formosa…
Vão pela rua devagar
Não têm pressa de chegar.
A felicidade esteve presente
neste amor tão permanente.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (6)

O Guardião falou, com a sua voz grave e suave:
“Excelências, trago notícias perturbadoras, os vigilantes detectaram movimentação na barreira de espinheiros e acompanharam, sem serem vistos, um grupo de jovens magos que, a coberto da invisibilidade, voou sobre o lago e se encontra, neste momento, à entrada da floresta. Decidimos aguardar e vigiar apenas os seus movimentos, até conhecermos as suas reais intenções, uma vez que não parecem ter uma atitude atacante.”
“Tomaram a atitude certa, Guardião. E do outro lado do lago, nas margens do reino mágico das fadas, detecta-se qualquer movimentação suspeita?”.
“Não foi detectado nenhum sinal que indicie intenção ofensiva por parte das fadas. Tudo parece confirmar o que o professor Inventix leu na mente da jovem fada.”
“Muito bem” – Orlix parecia aliviado – "Solicite, então a colaboração dos especialistas de conduta do nosso centro de estudos superiores comportamentais. Eles que interpretem os movimentos e atitudes desses magos. E, entretanto, mantenha todo o sistema defensivo em alerta e a postos para qualquer eventualidade.”
Os jovens magos, já conhecedores de grande parte do território da ilha dos seres brilhantes, encontravam-se na floresta murmurante e conseguiam avançar sem dificuldade, embora já se tivessem apercebido de que estavam a ser seguidos. Porém, confiantes na sua magia e animados pelo desejo de salvar a princesa, continuavam com determinação. Alcançaram a grande clareira onde se via a cúpula luzidia de um edifício subterrâneo, num material brilhante de tonalidades rosa e lilás, que parecia translúcida mas não deixava vislumbrar nada para dentro. Não se lhe descortinava qualquer entrada. O seu aspecto era sólido e seguro e todo o espaço envolvente estava ajardinado e bem cuidado. De explorações anteriores, os jovens magos sabiam tratar-se de um lugar associado à segurança da ilha e, por isso, tinham esperança de aí encontrar Marbel.
Como se aperceberam da chegada de outros seres da ilha diferentes dos vigilantes que os tinham seguido e desconfiando que fossem seres brilhantes, resolveram usar o novo poder mágico que lhes permitia movimentarem-se sem serem detectados. Era uma magia que lhes exigia grande esforço e concentração. Formaram um círculo completo e ergueram os braços, unindo as mãos. Buscaram no coração a força da sua união que, a pouco e pouco, foi surgindo e crescendo e preenchendo o espaço entre eles, até que os envolveu, formando uma bolha de pura energia, quente e confortável, que lhes permitia deslocarem-se apenas pela vontade do pensamento. Teriam de agir com rapidez, pois não poderiam manter esse estado de simbiose durante muito tempo.
Os seus seguidores, entre os quais já se encontrava o Guardião, ficaram boquiabertos, perante a repentina transformação dos jovens magos em um único ser que, suavemente, se foi desvanecendo aos seus olhos e desaparecendo da leitura dos radares. Foi como se deixassem de existir.
O Guardião ficou alarmado.
“Como descobriram forma de escapar aos meus radares? É a primeira vez que isto acontece. Podemos estar em perigo!”
“Acalme-se. Toda a postura deles era pacífica e ao mesmo tempo ansiosa. Não denotavam qualquer sinal de vontade ofensiva.”
Era o líder do centro de estudos superiores comportamentais que assim falava. Ao ao longo do últimos século tinha desenvolvido uma ciência de interpretação e terapia comportamental que muito contribuíra para a construção de uma sociedade próspera e pacífica.
O Guardião não se convenceu facilmente:
“E se o comportamento dos magos e fadas não obedece aos mesmos padrões do nosso comportamento. Como pode o professor ter tanta certeza de que não corremos perigo?”
“Certeza absoluta não posso ter, mas pelo que o nosso centro tem observado do comportamento dos habitantes do reino mágico das fadas, as suas reacções e emoções não são muito diferentes das nossas. Além disso, os detectores de sentimentos, apresentam leituras muito claras: não há agressividade nos nossos visitantes, apenas determinação.”
O professor Inventix interrompeu:
“Os leitores de pensamentos também só lêem a intenção de salvamento. É essa a missão deles, com toda a certeza – salvar a sua princesa. Proponho que tornemos visível a abertura do edifício. Assim, saberemos onde vão, mesmo sem os vermos ou detectarmos.”
Enquanto isso, no reino mágico das fadas, a rainha Amada e toda a sua corte aguardavam ansiosamente por novidades sobre Marbel. Os jovens magos informadores tinham partido na véspera e, apesar da nova magia protectora, todos receavam que a luz dos seres brilhantes lhes fosse fatal.
………………
Continua
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No reino mágico das fadas (7)

Post.it: O teu aniversário

Falei aqui de amor, complexo porque é humano. Simples porque é a forma de expressar as emoções mais puras. Falei de amor porque é a nossa essência, somos feitos de afectos. Essa semente que lançamos na terra, que o vento espalha na fertilidade do ser. Esta cresce e devolve-nos em dádiva nas formas mais singulares  de amor ou de uma amizade perene. Amizades que têm a solidez das árvores, porque não há vento que as derrube, porque têm a frescura duma sombra, não há sol que as queime. Transmitem-nos força, confiança e tranquilidade, na certeza que estão sempre ali protegendo-nos das intempéries da vida. Falei de amor, mas este parte demasiadas vezes, enquanto a amizade fica para sempre. Hoje que se celebra o dia de S. Valentim, quero celebrar também o teu aniversário, celebrar a oferenda da tua amizade. Dar-te-ia os parabéns, mas de parabéns estou eu por ter-te como amiga.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Post.it: O último reduto da esperança

O amor pode trazer muitas expectativas, muitas decepções, mas ele é sobretudo a fonte de esperança, a onde se vão alimentar os afectos. O amor reconstrói-nos, completa-nos, abre-nos um caminho de luz perene.
Mas porque é que o ser humano, que é por definição um ser racional não consegue racionalizar as suas emoções.
Porque se escraviza perante ele? Talvez necessite desse “desequilíbrio”, como diz Jung, “aquele que não procura novas sensações não progride”.
Somos seres de afectos, por isso buscamos constantemente o objecto o nosso objecto de amor, um ideal que se procura e que continuamos a tentar encontrar alcançar e modelar.
Vivemos o complexo donjuanismo que nos faz procurar nos outros, o nosso sonho, fantasia e desejo. Talvez não exista, pelo menos na perfeição em que o desenhamos em nós. Perante tão altas expectativas, grande é por norma a queda, a decepção e a dor.
Temos contudo também o nosso lado quixotesco, que nos torna humildes, dóceis, que nos faz esquecer de nós em prol do outro. Lutamos pelo amor, contra tudo e contra todos. Demasiadas vezes, apenas contra moinhos de vento, contra marés. Vencemos a persistência mas nem sempre a nossa batalha nos brinda com o prémio da vitória.
Contudo curamos as feridas e seguimos em frente, qual D. Quixote em defesa da sua Dulcineia. Porque o amor, com a sua dose equilibrada ou desequilibrada de emoções é o último reduto da esperança na eterna procura da felicidade.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (5)

O professor Inventix não falhou na sua missão e, em pouco tempo, conseguiu vencer os esforços ingénuos de Marbel e descobriu que, afinal, estava apenas perante uma fadinha desobediente e arrogante que não constituía qualquer perigo para o reino dos seres brilhantes.
O conselho de decisores reuniu após tomar conhecimento desta informação. Notava-se a diferença. O anel de luz que os unia tornou-se mais brilhante e tomou tonalidades mais suaves e o seu zunido parecia, agora, uma suave melodia. Apenas junto ao jovem mago Ansiex havia alguma agitação. Orlix tomou a palavra:
“Amigos, afinal a fada que conseguiu passar o lago das mil cores e penetrar na nossa barreira defensiva veio numa aventura individual e sem conhecimento de sua mãe, a rainha do reino mágico das fadas. É uma jovem desobediente e aventureira. Proponho que seja levada ao outro lado do lago e aí seja deixada, tal como se encontra – imobilizada de corpo e sentidos.”
Ansiex pediu a palavra e todos os ouviram com algum desagrado.
“Mago Orlix, com todo o respeito, penso que não devíamos ser tão ingénuos. E se é apenas uma artimanha para nos entreter, enquanto preparam uma verdadeira invasão?! Acho que devíamos dar uma lição a essa fadinha e enviar uma mensagem mais firme às suas iguais!”
O zunido do anel de luz tornou-se mais forte e agudo. Os magos não gostaram da intervenção. Foi o decisor principal que respondeu:
“Meu jovem, muitos dos presentes ainda se lembram dos tempos em que os litígios e as guerras dominaram as relações entre o nosso reino e o das fadas. A experiência fez-nos ver a todos que nada disso fazia sentido. Vê como prosperámos desde que estamos em paz! A nossa população vive melhor, a nossa ciência evoluiu, a nossa convivência e governação tornaram-se sensatas e justas. Não podemos permitir que este pequeno incidente ponha em causa tudo o que conquistámos. Se descobrirmos que a intenção das fadas é outra, então tomaremos medidas sensatas que conduzam à paz entre os nossos reinos.”
Alguns magos
Entretanto, o Guardião havia chegado e esperava autorização para entrar na sala azul do conselho. Tinha notícias dos investigadores que enviara às margens do lago das mil cores.
Quando entrou na sala do conselho, as paredes ondulantes quase se aquietaram e o zunido do anel de luz tornou-se num murmúrio tão leve que mal se ouvia. Notava-se ansiedade no brilho intermitente da luz que emanava de cada mago. Estavam todos suspensos das palavras do Guardião.
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Continua
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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Post.it: O amor não é convencional

Convencionou-se que o amor era entre um homem e uma mulher.
Que o amor era apenas entre duas pessoas.
Que o amor era efémero.
Que no amor só sofre quem foi abandonado.
Que amor rima com dor.
Que o amor é “fogo que arde sem se ver”
Mas a história da humanidade tem-nos revelado o contrário, que as convenções não passam de palavras,  que não são regras.
Porque o amor depois do fogo inicial pode transformar-se em harmonia, completude, carinho, entrega, partilha e dádiva mútua.
Que no amor sofrem todos os elementos que o compõem, quando por razões várias, ele acaba, esmorece como um verão que dá lugar ao outono de folhas que secam e caem no chão. O amor tem mostrado que existe e pode ser possível sem ser causa de dor mas de imensa felicidade.
O amor tem conquistado o seu espaço, num tempo que não se mede por horas, meses ou anos, batendo ao ritmo alucinado do coração ou deixando-se embalar na sua tranquilidade.
O amor nas suas diversas vertentes não tem que ser a dois. Cabe nele toda a afectividade que o ser humano tem disponível no seu sentir.
O amor está e estará sempre para além do convencional que a sociedade queira impor, para além de falsos moralismos, para além de regras estabelecidas.
O amor apenas quer amar aquele ser que se identifica consigo, que lhe desperta os sentidos, que o completa e preenche como ser humano, quando este entra na sua vida e lhe dá sentido. O amor é o amor, não se esgota nas suas definições. Quando amar pode significar tornar-se melhor “amo-te não pelo que és mas pelo que sou quando estou contigo”.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Post.it: Desamor

Perto da semana do amor também podemos falar em desamor, aquele que a literatura não eleva, não enche de floreados. Desamor, aquela sensação que nos faz sentir culpados dum crime que não cometemos. E gritamos ao intimo “não tive escolha, aconteceu, ou foi acontecendo, não sei!” Quando tudo aquilo que admirava nele se transformou em algo irritante e insuportável. Quando a sua voz era música para os meus ouvidos e agora me soa a agreste. O seu gesto de segurar o cigarro que me acalmava “ Ainda queimas  o sofá” resmungo agora. Os seus cabelos em desalinho por onde passeava os meus dedos, parecem-me hoje simplesmente descuidados, como se não quisesse ter um aspecto apresentável. Olha-me com surpresa, quando o critico. Desespera-me aquela tendência que tem de me abraçar quando estou a cozinhar, de me beijar o pescoço, grito-lhe quando tenho frio. E ainda diz incrédulo, “mas tu gostavas que o fizesse, já não gostas?  Hesita, “já não gostas e mim”. Fujo do seu olhar aflito, não sei o que dizer, não sei o que sinto, desespero, afasto-me. Eu própria não entendo. Que amor é este que se esfumou no ar, que morreu quando estava pujante de vida. Que tortura é esta que nos condena por já não amarmos quem nos ama. É quem ama que perde tudo e nós que não escolhemos deixar de amar? Não temos o direito a sermos compreendidos, chorados, ilibados de qualquer culpa? Esquecem-se que também nós sofremos a dor do vazio que fica no peito à qual se junta a dor de ver a outra pessoa sofrer sem lhe podermos colocar um bálsamo. Pelo menos eles ainda têm longas narrativas, óperas, poemas, dramas cinematográficos sobre o sofrimento amoroso, sobre o abandono e solidão. Recebem lágrimas solidárias dos amigos. São as vitimas de um amor perdido. E nós que também perdemos o amor, quando ele nos abandonou e nos esvaziou dos sonhos, dos desejos, de tudo o que nos fazia amar esse alguém. Também nós somos vitimas, mas ninguém nos consola.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (4)

Todos fizeram silêncio quando a rainha Amada, uma fada muito bela, de porte altivo e seguro, mas com expressão gentil e amável, se dirigiu às fadas conselheiras:
“Caras amigas, sinto-me consternada pelo motivo que me levou a chamar-vos aqui e que já é do vosso conhecimento. A princesa Marbel, contrariando tudo o que lhe foi ensinado, cometeu um acto irreflectido que espero não venha a ter consequência graves para o nosso reino. Há muito que não interferimos em nada para lá da barreira de espinheiros, no lago das mil cores e na ilha dos seres brilhantes e eles também parecem ter-nos esquecido. Tudo estava bem assim, até hoje de manhã. Marbel conseguiu iludir a vigilância e tudo indica que se dirigiu ao lago das mil cores. O meu coração está em sobressalto por não saber nada da minha filha e prever o pior e enche-se de temor pelas consequências que tudo isto pode trazer ao nosso reino.”
A rainha calou-se e a sala ficou em silêncio por largos momentos, até que a conselheira-mor, a fada Gentil, de olhar profundo e purificado pelos mil anos já vividos, falou:
“Majestade, por enquanto não temamos o pior. Sugiro que, para prevenir, se envie uma missão secreta à ilha dos seres brilhantes, usando os modernos poderes de invisibilidade e imunidade ao brilho mortal, para descobrir onde está Marbel e como se encontra.”
A fada Astuta, responsável pelos serviços de segurança do reino, pediu a palavra e falou assim:
“Minha rainha, venerando fada Gentil e todas as conselheiras, concordo que não devemos ainda contar com o pior, até porque os meus informadores - os jovens magos, filhos das fadas aladas - há mais de duas centenas de anos que não detectam qualquer acção beligerante por parte dos seres brilhantes nem nenhum movimento seu fora da ilha. Parecem ter-se tornado seres pacíficos ou, pelo menos, apenas interessados no seu território. Por isso, concordo com a veneranda fada Gentil e já tomei a liberdade de escolher, de entre os muitos que se ofereceram, seis dos jovens magos mais hábeis a usar os modernos poderes. Porém, existe um perigo que não sei se poderão contornar – há um ser na ilha que se transforma e tem a estranha capacidade de detectar o movimento. Os investigadores da Universidade Real já desenvolveram uma protecção contra esse poder, mas ainda não foi experimentada. Assim, temo que os jovens magos voluntários possam ficar expostos à prisão ou mesmo a pior sorte e que a situação da princesa Marbel se torne mais grave.”

Ouviu-se um burburinho pela sala. Todas as fadas trocaram opiniões até que a rainha Amada se levantou e se fez completo silêncio.
“Temos de arriscar, pois não há alternativa. Alguém tem uma opinião contrária?”
Ninguém se manifestou, pelo que a rainha deu ordem para que a missão de salvamento começasse.

Enquanto isso, na ilha dos seres brilhantes, Marbel, completamente imóvel e sem conseguir abrir os olhos, começava a sentir-se mal, cheia de medo e com vergonha do que sua mãe estaria a pensar dela nesse momento. Começava a desesperar quando ouviu novamente a voz calma do Guardião, forte mas sem agressividade, dirigir-se a alguém que não ela:
“Entre, professor Inventix. Muito me apraz conhecê-lo e saber que considera aperfeiçoada a magia que permite ler o pensamento. Pode ser que nos ajude a descobrir o que esta fada pretende da nossa ilha.”
Marbel ficou alerta e pensou que tinha de encontrar forma de controlar os pensamentos e tentou inventar uma história inocente e bela que pudesse valer-lhe a libertação. Mas seriam eles ingénuos ao ponto de acreditarem?
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Continua
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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Post.it: Quando o amor já não cabe na mochila

Não deixei nada por fazer. Não deixei nada por dizer. Amei tudo o que podia amar. Lutei tudo o que havia para lutar. Porque não deu certo? Porque acabou? Por minha culpa, por tua culpa? Que importam as culpas. Acabou porque nada é eterno. Somos seres finitos e essa finitude revela-se em tudo o que fazemos.
Quando se é jovem, ama-se, e só o amar basta. O amor é eterno. Eterno enquanto dura. Quando se é jovem anda-se de mochila às costas e nela cabe toda a sua vida, a esperança, os sonhos, as ambições e o amor.
Quando crescemos, na mochila já não cabe nada, passamos  a arrastar connosco uma    auto-caravana, nela viajam os pais, os filhos, os ex amores, os amores e os desamores. Além dos amigos, pilares cada mais necessários ao nosso equilíbrio. Aqueles que nos dizem “não cedas mais, ergue-te e caminha em frente!”
O amor esse já não basta por si só para nos fazer feliz. Temos à nossa volta demasiados condicionalismos, que o desgastam e vão alterando, tornando-o menos doce: a distância, o emprego, os nossos horários, os horários do filhos, dos teus e dos meus, as obrigações familiares, a tua casa, a minha casa, pontos de união e de separação e por fim a rotina dos dias e das noites.
O amor acaba num suspiro, quando lhe estendemos a mão para o abraçar só encontramos a solidão.
Perdeu-se, desvaneceu-se, desencantou-se, desapaixonou-se.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Post.it: Poliamor

Nesta semana que antecede a  chegada de S. Valentim, quando por todo o lado as montras enfeitam-se com corações  que pretendem lembrar a data, abraço o tema do amor, nas suas mais variadas vertentes, dando-lhe as boas vinda e que venha para ficar.

Outro dia li num jornal um artigo sobre o Poliamor, a nova versão de poligamia, mas de cariz mais romântico. Pus-me às voltas com o pensamento e mentalidades latinas à parte, resolvi ver a questão de uma forma objectiva e racional. O poliamor talvez seja uma forma de ultrapassar os ciúmes que nos invadem como uma doença incontrolável, morre-se e mata-se por eles. Acabava-se com o sentimento de posse e amava-se cada pessoa pelo que ela era e a outra de forma idêntica. Dias mais tarde assisti a uma reportagem na tv sobre o mesmo tema, e de repente, esfumou-se a minha ideia altruísta e ultra-romântica de harmonia e equilíbrio sentimental. Desta vez era uma homem casado que trouxera para o matrimónio mais duas mulheres. Quando lhe perguntaram se aceitava a entrada  de mais um homem na relação, repudiou de imediato a hipótese, “não queria que entrassem depois em comparações”. Segundo parece, por mais que se inove, não há relações perfeitas, o sentimento de posse e os ciúmes tanto acontecem na mono como na poligamia.
Então coloca-se a questão para quê mudar a velha estrutura, qual a grande diferença?
Bem se algum se zangar tem sempre o ombro do outro. Quebra-se a monotonia, se um não quiser conversar viramo-nos para o outro. Por outro lado as desvantagens são garantidas: tem de se arranjar uma casa maior ou então uma cama king size, com um a ressonar de cada lado.
Há mais roupa para lavar e engomar. Mais pessoas a desarrumar e certamente menos a arrumar.
Mas permitam-me, soltar a romântica que há em mim,  como estamos na semana do Cupido, desculpem-me estes devaneios emocionais. Mas deve ser bom caminhar na rua com as duas mãos aquecidas por outras mãos que nos oferecem o seu calor e carinho.
Será que o Poliamor pode definir-se por uma relação entre pessoas que têm muito amor para dar e outras tantas têm vontade de o receber e retribuir?


Era uma vez: No reino mágico das fadas (3)

Entretanto, na ilha dos seres brilhantes, o conselho dos magos decisores fora avisado e já se encontrava reunido. Era um recinto grande, em tonalidades brilhantes de azul que variavam de cambiante e intensidade, à medida que as paredes se aproximavam ou afastavam no seu constante movimento ondulante, que alimentava o fogo de crepitar metálico, que se erguia do centro e iluminava a sala.
os magos encontravam-se em redor do fogo, formando um anel de energia e luz a passar de uns para os outros com um zunido intermitente e grave.
Eram seres estranhos, de pequenos corpos esguios, assentes em pés largos e achatados que os faziam levitar um pouco acima do chão. Os braços, muito curtos, serviam apenas para lhes dar equilíbrio, pois faziam tudo com a mente que residia na cabeça, grande e achatada, onde não se distinguia qualquer órgão e apenas se via a luz intensa que emanava e que tirara a vida a tantos habitantes do reino mágico das fadas. Fora essa luz fatal que ditara o exílio dos seres brilhantes. No entanto, por detrás dela já não havia maldade. A vida dos seres brilhantes, sob a orientação do mago Orlix, que sucedera a seu pai, terminada a guerra com as fadas mágicas, evoluíra para um estádio de sabedoria e paz. Conheciam o poder fatal do seu brilho e já não queriam usá-lo para destruir. Haviam desenvolvido uma cultura de luz na verdadeira acessão da palavra. Só assim se compreendem as palavras com que Orlix iniciou a reunião do conselho:
“Amigos, o nosso reino pode correr perigo. Uma fada mágica foi capturada na na praia sul da nossa ilha”.
Houve alguma agitação: o zunido da energia que os unia aumentou de volume e o tom tornou-se mais agudo. Orlin continuou:
O Guardião está a averiguar a razão desta incursão. Entretanto, toda o corpo de defensores está em posição de alerta, em redor da ilha. Os vigilantes do lago também estão todos em alerta máximo.
O mago mais jovem, sobrinho de Orlix, pediu permissão para falar e foi ouvido:
“E se vêm com intenção de ocupar a nossa ilha? Não seria melhor atacarmos antes que nos ataquem a nós?”
“Ansiex, não te precipites. Não conhecemos a intenção das fadas. Durante tanto tempo os nossos reinos mantiveram uma vizinhança pacífica, sem qualquer interferência um com o outro. Tal como nós, as fadas só devem desejar que as deixem em paz. Veremos o que diz o Guardião. Ei-lo!”
Foi dada palavra ao Guardião que, da entrada da sala e de cabeça baixa para não enfrentar a luz dos magos falou:
“Excelências. Temi o pior. Mas parece que a jovem fada que capturámos agiu isoladamente e sem conhecimento da rainha das fadas, sua mãe. Parece ter sido uma atitude arrogante e leviana da sua parte. Está aprisionada, impedida de fazer qualquer movimento, de boca presa e olhos vendados, para evitar que faça magias que possam prejudicar-nos. Estou às vossas ordens para o que for preciso fazer.”
“Bom trabalho, Guardião. Aguarda a nossa decisão.”

Entretanto, no reino mágico das fadas, a corte estava com a rainha, procurando uma solução para o inesperado problema criado por Marbel. Continuavam a temer o pior, pois não conheciam como tinha evoluído o reino dos seres brilhantes.
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Continua
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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Post.it: Gastamos os anos

Gastamos os anos como se a eternidade fosse nossa. Achamos que no saco dos aniversários as bolas dos anos nascem em vez de diminuir. Adiamos a vida sempre à espera de uma nova e melhor oportunidade, desconhecendo que a oportunidade pode ser essa, que o momento que devemos agarrar e viver é esse. Que o futuro pode ser composto de coisas diferentes, o que não significa melhores. Agarramo-nos a desculpas forjadas na falta de coragem para lutar, para aceitar, para enfrentar. Cedemos ao nosso orgulho, esperamos que sejam os outros a lutar por nós. Que  sejam os outros a dar um passo definitivo. E se o outro tomar a mesma atitude? Seguimos em frente, engolimos a decepção, afastamos os resquícios de esperança, adiamos os sentimentos, adiamos a vida, quem sabe até a felicidade. Agarramo-nos a tentativas lógicas ou talvez ilógicas de que “não tinha que ser”, “não estava destinado” e tantas outras frases, subterfúgios, para nos auto-convencermos que a escolha não foi nossa, para dessa forma apaziguar a consciência que nos diz que tentámos, que lutámos, de braços cruzados. E assim vamos gastando os anos, como se a eternidade fosse nossa…

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Post.it: A derradeira viagem

Já viajei pelo mundo inteiro, subi montanhas, desci rios. Tive aventuras de neve e nos mais áridos desertos, onde até me quiseram comprar, ofereceram ao meu companheiro de viagem 6 camelos (uma fortuna naquelas paragens), felizmente ele não aceitou.
Cruzei céus e oceanos. Palmilhei milhares de quilómetros de asfalto e terra batida.
Mas um dia parei, parei para pensar, parei para sentir. O que significavam as minhas viagens? Aventura, adrenalina, banhos de cultura, fome de alcatrão, satisfação de curiosidade? Tudo isso e muito mais. Significavam sobretudo uma fuga. Não por cobardia de não querer enfrentar a realidade, mas por esta não me satisfazer a plenitude dos sentidos, desejos e ambições. Nessa paragem voluntária, o cérebro viajou mais do que tinha viajado o corpo.
Nessa viagem, a derradeira de uma vida, percebi, que tinha conhecido tantas pessoas nas mais longínquas distâncias, mas na verdade e para minha tristeza, mal conhecia os que estavam em meu redor. Não por falta de tempo, mas por falta de capacidade em viajar pelas profundezas desses seres. Dessa humanidade complexa, rica de mistérios, de sensibilidades, de dádiva, de dedicação e sobretudo de amor. Reconheço que é mais fácil viajar pelo mundo, confesso-me quase inábil na aptidão desse entendimento, exige muito mais de mim do que todas as viagens que experimentei. Exige tempo, interesse, sair de mim e ir ter com o outro. Deixar de ver a vida segundo os meus desejos e interesses, reconhecer e aceitar os dos outros.
É tempo de encetar essa jornada, aquela que já devia ter feito há muito tempo, se tivesse olhado bem nos seus olhos e visse neles a ausência daquele abraço que ficou tantas vezes por lhes dar…

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

É urgente

É urgente reinventar a esperança
 para chegar ao futuro.
É urgente soltar os sonhos
para que cheguem ao céu.
É urgente criar pontes no coração
Para chegar a outro coração.
É urgente derrubar os muros
para acabar com a solidão.
É urgente subir ao infinito
 para afofar as nuvens.
É urgente colher uma estrela
 para a oferecer ao mar.
É urgente voltar a acreditar
 para ter coragem de conquistar.
É urgente acordar a manhã
 para o dia começar.
É urgente embalar as ondas
para adormecer os vendavais.
É urgente fazer girar o mundo
 para que a vida recomece.
É urgente encontrar  o arco-iris
 para dar cor aos sorrisos.
É urgente desenhar um luar
para espelhar-se no olhar.
É urgente plantar uma flor
para que a vida seja um jardim.

Era uma vez: No reino mágico das fadas (2)

Marbel recordou-se do perigo que correra e de não ter sentido medo algum quando avistara o aparato defensivo que a esperava na praia da ilha que, àquela hora, não brilhava por ainda ser dia.
Os vigilantes do lago, pequenos seres voadores de grandes olhos redondos e salientes e um corpo fino como as agulhas dos pinheiros e com asas a motor movidas pela energia do vento que lhes permitiam voar mais rapidamente que o som, tinham alertado o Guardião da ilha, um gigante semitransparente que expandia o seu corpo como uma rede ou uma barreira ou o encolhia até se tornar quase invisível. A cabeça era alongada e pontiaguda onde se salientavam quatro olhos, um voltado para cada direcção que mudavam de cor consoante a intensidade da luz e, de noite, brilhavam como quatro potentes faróis a rasgar a escuridão. Em vez de orelhas, tinha dois radares que detectavam o movimento a mais de mil braços de distância
Marbel chegou à ilha cheia de confiança em si própria e nos seus poderes mágicos, resultado do facto de ter desfeito instantaneamente, com o seu sopro ardente, vários seres serpenteantes e asquerosos que se ergueram das águas para a fazer cair. Vencera também, com o seu olhar gélido, quatro bolhas incandescentes lançadas pelos dragões-peixe e, já próximo da ilha, escapara por um triz da rede de algas que se erguera repentinamente, atirada pelas feiticeiras aprisionadas na superfície das águas e que gostavam de mostrar os seus poderes.
Mas o Guardião reunira e colocara em posição o corpo de guardas da ilha, seres semelhantes aos vigilantes do lago, mas maiores e mais velozes e capazes de lançar, a curta distância, fios de teia invisíveis que paralisava quem neles caísse.
Quando o Guardião se insuflou e se ergueu como um alto muro, Marbel, lançou o seu olhar perfurante e atravessou velozmente a pequena abertura que se formara, voando sobre o exército de guardas e pensando para si que eram pequenos demais e nada poderiam contra ela. Mesmo assim, jogou pelo seguro e tornou-se invisível – uma magia difícil e perigosa que ela apenas tinha experimentado uma vez. Sentiu-se segura e dispôs-se a procurar os seres brilhantes, pensando “estes patetas todos perfilados nunca vão encontrar-me!”
O Guardião percebeu a manobra. Ouvira falar naquele poder das fadas e de como, em tempos remotos, tinha sido a arma secreta que vencera os magos do lago e confinara os seres brilhantes ao território da ilha, para impedir que o seu brilho desnorteasse quem o via e, invariavelmente, se deixava cegar por ele.
Ao redor do lago, as fadas haviam plantado uma muralha de espinheiros impossível de transpor pelos seres brilhantes que não podiam voar e que, ao longo dos tempos, se haviam habituado e acomodado à sua ilha. Com medo de novas represálias por parte das fadas, tinham organizado um exército de defesa composto por seres cuja mente fora aprisionada e enfeitiçada para desejar apenas defender os seres brilhantes.
Marbel conhecia o perigo de cegar perante o brilho dos seres que procurava, mas apoderara-se de uma magia de protecção contra ele que as fadas haviam criado e mantinham em segredo para que ninguém quisesse procurar tais seres e, assim, pôr em perigo o seu reino mágico. Voou descontraída em direcção à floresta de arvoredo denso que avistava ao longe. Não sabia do radar do Guardião e não contou com ele. Esse descuido valera-lhe a derrota. O Guardião deixou que se sentisse segura e esperou que voasse mais baixo. Quando a sentiu ao alcance do seu exército, deu o sinal e de repente Marbel viu-se aprisionada e completamente envolvida num emaranhado de fios pegajosos. Tolhida de pés e mães, de olhos vendados e boca paralisada, a jovem fada não conseguiu fazer uso de nenhuma das suas magias e deu-se por vencida.
Àquela hora, no reino das fadas, já tinham dado pela falta de Marbel e seguido o seu rasto até à muralha de espinheiros. Adivinhando o que se tinha passado, as fadas prepararam-se para o pior.
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Continua
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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Post.it: Borboleta

Eis-te asa dançando no vento. Eis-te bela na distância cautelosa que entreponho entre nós. És magia na visão de liberdade, de harmonia. Se um dia as minhas mãos te tocassem sinto que destruiria o voo dos meus sonhos e a ti as asas de borboleta que não mais dançaria. Abraço-te com o olhar, beijo-te com um suspiro. E porque a beleza é infinita quando vivida em liberdade, em enlevo, adoro-te na contemplação. És existência cristalina, translúcida, és rasto de nuvem no azul do céu, brisa que suaviza o calor, murmuro de mar. És o que não posso ter, o que não posso tocar, mas sei que te tenho, quando nesse  instante  sinto-te e vejo-te. Isso basta-me para ser feliz. Basta-me a certeza da tua existência.